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Vencedor, Alexandre Henderson diz: “a TV empodera os negros”

Apresentador da Globo comenta as dificuldades impostas pelo racismo e sua opção por derrotar o preconceito

20 nov 2017 - 12h03
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“Você nunca deve ter medo do que faz quando o que você faz é o certo”, desabafou a costureira Rosa Parks (1903-2005), ícone do movimento dos direitos civis dos negros nos Estados Unidos.

Ela se referia a uma atitude que mudou o rumo da luta contra o racismo na América: recusou-se a ceder o lugar no ônibus a um homem branco, o que era regra nos idos de 1955.

Aquele ato de Parks repercutiu em todo o território americano e fortaleceu o discurso antissegregacionista.

O apresentador em ensaio fotográfico e no cenário do ‘Como Será?’: visibilidade valiosa na emissora líder
O apresentador em ensaio fotográfico e no cenário do ‘Como Será?’: visibilidade valiosa na emissora líder
Foto: Ronaldo Correa/PDI/Divulgação e Divulgação/TV Globo

Mais de seis décadas depois, o País mais poderoso do planeta ainda registra conflitos raciais. E o Brasil, nação mais miscigenada do mundo, tem no racismo uma mazela social ainda intransponível.

Mas há um aspecto positivo: os negros conquistaram maior visibilidade nos meios de comunicação. Os 54% da população agora se veem em papéis de destaque nas novelas e nas bancadas de telejornais.

Um exemplo de relevante representatividade é Alexandre Henderson, repórter e apresentador do programa ‘Como Será’, exibido nas manhãs de sábado, na Globo.

Em setembro, ele ganhou um importante prêmio por seu trabalho na TV. Nas ruas, recebe o reconhecimento popular.

Henderson relata: “Uma senhora branca disse que eu era a prova de que existe um Brasil negro que pode dar certo”
Henderson relata: “Uma senhora branca disse que eu era a prova de que existe um Brasil negro que pode dar certo”
Foto: Ronaldo Correa/PDI/Divulgação

O jornalista conversou com o blog a respeito de temas ligados a este 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.

Enfrentou mais dificuldades para conquistar seu espaço na TV por ser negro?

Completei dez anos ininterruptos de trabalho na TV. A minha maior cobrança sempre foi pessoal. E isso vem desde pequeno. Estudei no Colégio Santo Inácio, um dos mais tradicionais do Rio, reduto de famílias da elite carioca. Era o único negro da série, numa escola com pouquíssimos. Ser a exceção, ainda garoto, quando você está em formação, aprendendo os códigos de vivência e formatando caráter, foi fundamental para que também aprendesse a me blindar cedo, a criar a ‘carcaça’ de tanque de guerra. Sem ser reativo. Mas sabendo lidar com as demandas que apareciam. Devo o aparato dessa estruturação de cabeça à minha família, que sempre falou francamente sobre a questão racial dentro de casa e foi fundamental para que eu também interiorizasse relação de força e autoestima, que o mundo naturalmente não te dá.

Sofreu episódios de discriminação?

Talvez, nunca nada explícito. Aliás, essa é uma característica marcante do racismo no Brasil; o tom velado, silencioso, na entrelinha. Sobrevivi? Com orgulho de mim mesmo e aprendi a ser mais forte, construí relações de amizades profundas, consegui humanizar pessoas que, hoje, se sensibilizam com a questão racial. Fui à escola e à família porque acredito que são a base de tudo. O negro no Brasil enfrenta as delícias e muitas dores pela cor da pele que ele carrega, mas a educação formal e a de casa dão suporte para que o assunto seja mais bem resolvido na nossa cabeça, para que nos posicionemos sem embaraço.

E os obstáculos na carreira?

Tem sido grande a luta, mas uma batalha bonita. Comprei essa briga lá atrás e disse a mim mesmo que faria meu melhor, com a garra de um atleta de ponta. Esse ano ganhei o prêmio ‘Comunique-se’ como melhor repórter de cultura. Então o que vale pra mim é a resposta do meu empenho. Sou respeitado dentro e fora do meu trabalho e fiz por onde. Nada veio de mão beijada. Meu foco sempre foi o que poderia fazer para chegar onde eu gostaria de chegar. Não dei peso à minha cor como um fator limitante, pelo contrário, sempre entendi a minha cor dentro do veículo como necessária, primeiro porque ela é um espelho desse País que é majoritariamente negro. Segundo, porque através de um trabalho feito com dignidade, sensibilidade e amor, podemos, sim, ser espelho para muitos jovens das gerações futuras. Quero voar mais e que outros jovens como eu voem , porque quem luta, seja branco, negro, indígena ou mestiço, tem todo o direito de alçar lindos voos.

Pela valiosa visibilidade que tem na TV, você se tornou uma referência para jovens negros. Sente a responsabilidade?

Sinto orgulho enorme do que represento para a juventude. Não vim de berço de ouro. Sei o que os meus antepassados passaram. Ouvi narrativas gritantes de tias-avós, minhas lindas Candaces (rainhas guerreiras), sobre o que era uma cidade como o Rio, décadas atrás, na qual o elevador de serviço era o acesso designado a elas, mesmo que estivessem frequentando prédios mais refinados da zona sul como convidadas. Devemos tudo a esses homens e mulheres de cabeças brancas que, apesar de terem trabalhado muito, na maioria das vezes partiram dessa vida pobres, mas de cabeça erguida. A família negra brasileira não tem histórico de herdar bens, então a luta de quem veio depois foi na marra. A minha vitória e a de outros negros que fazem parte da televisão brasileira representa aquele grito entalado de gerações. E é um alento para as que estão vindo. & Eacute; a motivação que faz com que nossos jovens acreditem, perseverem, sonhem. Já me emocionei diversas vezes nas ruas. Teve uma senhora branca que uma vez me parou e com lágrimas nos olhos disse que, quando me via na TV, era a prova de que existe um Brasil negro que pode dar certo. Chorei abraçado a ela e entendi profundamente a mensagem que queria me passar.

Quais são suas referências e inspirações entre negros que estão na TV?

Adoro Zileide Silva (repórter e apresentadora da Globo) pela competência e amiga querida que é, assim como Dulcinéia Novaes (repórter e apresentadora do canal, em Curitiba), que é um espelho pra mim. Glória Maria (repórter e apresentadora do ‘Globo Repórter’), tenho profundo respeito pela trajetória e pelas posições estratégicas como âncora que já encabeçou. Heraldo Pereira (comentarista do ‘Jornal da Globo’ e apresentador eventual do ‘Jornal Nacional’), talentoso, embora não o conheça pessoalmente, vibro demais quando o vejo na TV. São nomes que abriram portas e que brilhantemente cumprem o trabalho que eles se comprometem a fazer. Em relação a atores, meu olho brilha quando falo de Ruth de Souza, Zezé Motta, Léa Garcia, Neusa Borges, Chica Xavier e tantos outros nomes da cena teatral e dramatúrgica, que alicerçaram espaço para as gerações que vieram depois.

Qual o papel da TV na luta contra o preconceito racial e pela valorização do negro?

A TV tem responsabilidade social. E nesse sentido a inclusão é algo que deve ser perseguido, porque um País justo é um País que inclui as pessoas. O negro ajudou a construir a história dessa nação e tem extrema importância, inclusive, do ponto de vista econômico, porque ele é consumidor de bens, como também de informação. Ter negros talentosos na TV empodera nossa representatividade. Atinge o coração e a mente dos iguais que se veem representados. E abre espaço também para que a sociedade de um modo geral absorva e reconheça nossos potenciais. Meu trabalho tem tocado muitas pessoas e percebo o quanto estar ali tem sido um presente para quem deseja equidade nesse País. Que negros, brancos, indígenas e mestiços possam juntos fazer do nosso Brasil um lugar melhor e mais justo.

(Produção e styling: Hugo Ramos e Oseias Barbosa. Make up: Kryka Groba. Alexandre Henderson veste ternos Ozorno Fashion & Bridal.)

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