Público é culpado por Silvio achar que pode ofender a todos
Telespectadores e imprensa parecem ter medo de criticar o humor preconceituoso do dono do SBT
Toda unanimidade é burra, escreveu o maior cronista da ‘tradicional família brasileira’, Nelson Rodrigues. Silvio Santos se tornou o mais próximo do que há de unanimidade no Brasil.
Mesmo quem não o assiste na TV nutre simpatia pelo apresentador. Ele fez história na maioria das casas do País: o que seria dos apáticos domingos sem a animação de seus programas?
Incensado, tornou-se insensato. A ponto de soltar comentários ofensivos sem qualquer preocupação com a dignidade alheia. Não se trata de enquadrá-lo no politicamente correto, e sim de contestar a falta de discernimento.
Existe uma linha tênue entre a ironia e a injúria. O comunicador não demonstra preocupação em respeitá-la. Chamar Preta Gil de ‘gorda’, Pabllo Vittar de ‘bicha’ e criticar o cabelo crespo da atriz mirim Julia Olliver, de ‘Chiquititas’, do próprio SBT, é algo normal para Silvio Santos.
Ele acha graça das próprias piadas preconceituosas, e tem a chancela da plateia de fãs, que riem de qualquer coisa dita pelo ídolo sem jamais contestá-lo. A maior parte da imprensa reproduz as polêmicas pisando em ovos, sem questionar o monstro sagrado do entretenimento televisivo.
Muitos o defendem com o argumento de que se trata de um homem de quase 90 anos, criado em um tempo no qual era aceitável – e, às vezes, até estimulado – discriminar mulheres, negros, gays e tudo mais que parecesse ‘diferente’. Mas as pessoas, famosas ou anônimas, devem se adequar à evolução social ao invés de continuar a reproduzir os equívocos do passado. Ainda mais um homem com tamanho poder como Silvio Santos.
O que ele pensa e diz, ainda que de brincadeira, influencia milhares de pessoas sugestionáveis. Ninguém deve ser censurado ou obrigado a agir com polidez artificial. Espera-se apenas um mínimo de respeito no trato com quem já é um alvo fácil de preconceito.
Quem faz TV tem a obrigação de dar um exemplo positivo.
O mesmo Silvio hoje criticado foi um precursor da inclusão social ao dar espaço, durante décadas, para apresentações artísticas de transformistas e transexuais em seu programa.
Eis a sabedoria rodriguiana: a unanimidade sempre acaba em contradição.
Veja também