Terra

Entrevista completa com Marcelo Linck


Recentemente, uma girafa morreu no zoológico de Sapucaia do Sul. Grupos de defesa dos animais reclamam deste tipo de local, dizendo que o confinamento é cruel. Qual é a sua posição sobre o papel dos zoológicos na preservação das espécies?
Como biólogo, o que eu posso dizer é que os zoológicos hoje tem um papel fundamental na preservação das espécies. Muitas delas ainda existem hoje justamente por estarem no zoológico. Esse pessoal dos grupos ambientalistas critica muito, como no caso da girafa, né? Imaginavam que a gente ia trazer girafas da África pra tirar da natureza. Jamais se faria isso! Esses animais viriam de reservas onde eles estão reproduzindo e estariam como excedentes. Ou de zoológicos onde já foram reproduzidos, e que tem um plantel excedente.

O zoológico já participou ativamente na continuidade de alguma espécie?
Nós, cerca de 10 ou 15 anos atrás, participamos de um programa onde um macho de rinoceronte negro, uma espécie ameaçada de extinção na África, saiu aqui do zoológico e foi para uma reserva, uma fazenda de reprodução da espécie. Então é possível ver a importância desse animal, e a importância do zoológico, colaborando neste processo, tanto que o animal voltou pra lá.

Então o Brasil também envia animais para seus habitats originais?
Recentemente, o Brasil enviou de volta para a África um grupo de leões, porque eles já tinham uma área onde eles estavam praticamente extintos, e daqui do Brasil foram 13 ou 14 leões que retornaram pra lá. E muitas outras espécies, nativas aqui do Brasil, que se consegue reprodução, quando o animal já está quase extinto, e o zoológico tem exemplares, consegue fazer a reprodução, e no futuro inclusive com reintrodução. No caso do mico-leão-dourado, uma espécie que no Brasil estava quase que extinta, os zoológicos americanos conseguiram fazer a reprodução e hoje existe todo um trabalho em que os animais estão vindo de lá para serem reintroduzidos na natureza. Geralmente, nas acusações de crueldade, se alega que as instalações nem sempre são apropriadas. Qual é a estrutura do zoológico para a manutenção e reprodução dos animais? Nós temos recintos com condições para abrigar os animais. A girafa, por exemplo, nós temos um local com todas as condições para que ocorra a reprodução. Além disso, a gente tem uma parte para araras, alguns viveiros que servem para reprodução. Claro que o trabalho segue de acordo com o que a gente consegue comportar. Não vai se reproduzir sem parar, se não tem onde colocar o animal. Por exemplo, no caso dos felinos, hoje não se reproduz, praticamente, porque todos os zoológicos já estão com animais em quantidade suficiente. Então só vai se fazer um programa de reprodução quando tiver necessidade. Em casos onde alguém diz, “bom, vamos reproduzir porque há a necessidade de se recolocar algum animal, ou algum zoológico tem interesse de ter a espécie, ou precisa de um macho ou uma fêmea para fazer um pareamento”.

Existe algum programa de reprodução em andamento?
O zoológico tem alguns programas em andamento. Nós trabalhamos aqui com o bugio, que está reproduzindo, nós temos o cisne de pescoço preto, que é uma espécie bastante difícil de criar e reproduzir em cativeiro, e nós estamos conseguindo. Uma coisa que nós queremos melhorar aqui no zoológico é o recinto para felinos, porque o nosso é muito antigo. Ele é da época da inauguração, já está com mais de 40 anos. Então são recintos meio antiquados. Com a nova concepção de zoológicos, o animal teria espaços mais amplos, e de acordo com o que existe na natureza. E neste ponto, realmente, a parte de felinos fica devendo.

Como se dá a introdução de novos animais nos zoológicos?
Dentro do Brasil, normalmente se faz permuta com outros zoológicos. Ou permuta, ou empréstimos. Por exemplo, o zoo de SP tem uma fêmea de urso de óculos. O zoo do RS tem um macho sobrando. Então, se não tiver como fazer uma permuta, se as partes não chegarem a um acordo, normalmente se faz um contrato de empréstimo, onde esse macho vai pra lá, é colocado em reprodução, e se houver a reprodução, no futuro se faz a divisão de crias. Uma parte é deles. Ou um ano é nossa, e um ano é deles. Fora do Brasil é um pouquinho mais difícil essa tramitação de importação, em função do custo do transporte. O transporte é muito caro.

É feito por navio ou avião?
Se for um animal jovem, como por exemplo uma girafa jovem, que tu consegue colocar numa caixa, porque ela é menor, tu consegues colocar dentro de um avião. Senão tem que vir de navio, pelo tamanho. Por ser uma caixa muito grande, um container, aí, às vezes, não dá para colocar num avião. Então essa é uma dificuldade, realmente. O zoo aqui não teria condições de importar. Mas sempre alguém é contatado, como no caso de uma empresa na Holanda que trabalha com animais - compra, venda e permuta. Fazemos um contato, vemos se existe disponibilidade, quem teria o animal e a que custo isso sairia. Ou diretamente com zoológicos. A gente até contatou, por exemplo, o zoológico do Chile, porque soubemos que eles teriam uma girafa sobrando, mas aí não tinham mais, já tinham destinado o animal. Para nós seria ótimo, porque é mais perto. Seria mais fácil, né?

E as alegações de depressão dos animais?
Normalmente no zoológico tu procuras atender todas as necessidades dos animais. Mesmo eu, que estou aqui há um certo tempo, estou sempre aprendendo. Às vezes chega uma espécie que tu não tinhas, ou uma espécie nova, com a qual tu vais ter todo um trabalho de acompanhar o manejo dela, a alimentação e a reprodução. Ou uma espécie que não reproduzia, e aí tu vais adaptando, muda o recinto, apenas um detalhe, um enriquecimento ambiental que tu faz, e lá pelas tantas, dá certo e o animal reproduz. Para nós, é uma verdadeira satisfação. Porque a gente está aqui trabalhando em prol do meio ambiente e pela preservação das espécies.

Foto: Nasa/Divulgação