Rio - Luiz Felipe Scolari deixou bem claros os princípios e normas disciplinares que os jogadores terão de cumprir à risca para fazer parte da sua Seleção Brasileira. Na cartilha do comandante Felipão, os mandamentos são os mesmos, segundo ele, dos adotados por qualquer empresa ou família. No caso da Seleção, a ''família Scolari'', como o próprio treinador considera. Ela é formada no momento por um grupo unido, em que prevalecem o companheirismo, a amizade e a obediência aos horários, e onde certamente alguns jogadores campeões mundiais do passado não teriam vez.
Garrincha, então, como lembrou a coluna Oldemário Touguinhó, na terça-feira, no Jornal do Brasil, não seria sequer convocado (ainda bem que Felipão não era o treinador do Brasil em 1962 e o genial ponta-direita pôde nos dar o título de bicampeão do mundo com seus dribles e gols na campanha do Chile). Mané Garrincha não era um atleta, muito menos um profissional. Não acatava ordens, não se guiava por relógio e eram famosas as suas escapadas das concentrações para namorar as muitas mulheres que seduziu mundo afora.
O Rei Pelé não ficava atrás. Namorador incorrigível, desde a adolescência, já na Suécia, aos 17 anos, só não pulou o muro porque isto não existia na concentração do Hotel Hindas, em Estocolmo. Mas, a exemplo de Garrincha - que deixou um filho sueco -, fartou-se da companhia das louras nórdicas, e não só nos momentos de folga. Nos anos 70, os tricampeões Jairzinho e Paulo César não faziam por menos - eram cobiçados como popstars.
Quase 40 anos depois do primeiro título, havia um muro para transpor na Copa dos Estados Unidos. E jogadores sedentos de diversão para ficar tanto tempo fechados entre quatro paredes de hotel. Todo mundo sabe, muitas pessoas viram jogadores tetracampeões do mundo ''pulando a cerca''. Havia até uma escada num local estratégico para facilitar a fuga em busca de namoro. O técnico Carlos Alberto Parreira e o coordenador Zagallo, garantem pessoas próximas a eles, fizeram vistas grossas das escapadas de seus craques. Afinal, eram jogadores eram importantes e decisivos demais para serem punidos e, quem sabe, o tetracampeonato mundial jogado fora.
Fumo - Gérson, o Canhotinha de Ouro da Copa de 70, era um fumante inveterado. Onde ia, carregava um cigarro aceso. Nas viagens, concentração, até mesmo no vestiário. Nas regras do comandante Felipão, naturalmente também não há espaço para essa transgressão - e a Seleção ficaria privada de um dos jogadores com passe mais preciso do futebol brasileiro.
Outro mestre do lançamento, o Príncipe Didi, também não se adaptaria às regras adotadas na família Felipão. Como já contou Nílton Santos, Didi promoveu greve de fome porque a comissão técnica de 1958 não permitiu que ele recebesse a visita de Guiomar - sua mulher que, apaixonada, foi até a Suécia vê-lo. (Nílton Santos confidenciou que ''contrabandeava'' comida para Didi, com quem dividia o quarto na concentração).
Carteado - Romário, o excluído número 1 de Felipão, levou o carteado para a concentração da Granja Comary, em Teresópolis. Da turma do baralho faziam parte Antônio Carlos, Emerson e Mauro Silva, entre outros. Dizem que Felipão não gosta de jogatina, mas Emerson segue como membro da família.
O companheirismo, bom relacionamento entre os jogadores, é um dos quesitos exigidos pelo comandante Felipão. A dupla de ataque das Copas de 58 e 62 vivia às turras e discutia dentro de campo. Vavá e Pelé, segundo alguns, não eram bons amigos. Mas ajudaram o Brasil a ganhar duas Copas.
A privacidade dos jogadores nas concentrações é uma preocupação recorrente de Felipão. O treinador quer regular até os horários para que os jogadores façam uso dos telefones celulares. Na Copa de 98, na França, teria dificuldades para controlar os impulsos dos integrantes de sua família. Todos os jogadores tinham celulares, dos quais faziam uso a toda hora - exceção quando estavam dentro de campo, treinando ou jogando.
Bem, pelo menos nas Copas do passado Felipão não teria esse problema. Os celulares não existiam. Mas baralho, fuga de concentração, inimizade entre jogadores, atletas rebeldes, tudo isso faz parte da história do futebol tetracampeão do mundo. Portanto, Pelé, Garrincha, Didi, Vavá, Gérson, entre outros, não teriam aconchego na família Scolari.