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Estudo aponta relação de 96,2% entre novo coronavírus e morcego-ferradura

Pesquisadores americanos e chineses analisaram 781 tipos do vírus e apontam o gênero Rhinolophus como crucial para a evolução e sua mutação

5 jun 2020 - 12h32
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Uma equipe internacional de pesquisadores analisou a sequência genética de 781 coronavírus encontrados em morcegos na China. Segundo a revista Science, mais de um terço deles nunca foram descritos na literatura médica. Embora não consiga identificar com precisão a origem do Sars-CoV-2, o vírus que causa a covid-19, há forte suspeita de que os morcegos sejam os responsáveis pela transmissão do coronavírus para os seres humanos - tanto no caso do Sars-CoV-1, em 2002, quanto na pandemia de 2019/2020, com o Sars CoV-2.

A análise destaca o gênero Rhinolophus, também conhecido como morcego-ferradura, como crucial para a evolução dos coronavírus. Os cientistas descobriram que um coronavírus encontrado no Rhinolophus era 96,2% idêntico à sequência do Sars-CoV-2. "O parente mais próximo já encontrado", de acordo com a revista.

"Parece que, por pura má sorte filogeográfica, histórica e evolutiva, o Rhinolophus acaba sendo o principal reservatório de coronavírus relacionados à Sars (Síndrome Respiratória Aguda Grave)", diz Peter Daszak, um dos autores do estudo, em entrevista à Science.

Dentre os 14 pesquisadores que assinam o estudo, está Shi Zheng-Li, pesquisadora especialista em morcegos pelo Instituto de Virologia de Wuhan, que recebeu muitas críticas do governo americano, após o presidente Donald Trump sugerir que a pandemia tenha surgido no laboratório do Instituto. Entre 2010 e 2015, Shi, Daszak e seus parceiros capturaram centenas de morcegos em várias províncias chinesas. Os pesquisadores analisaram saliva e fezes para extrair o material genético desses animais. Isso permitiu que os cientistas construíssem uma árvore genealógica de coronavírus de morcego e examinassem qual gênero apresentava a maior diversidade de vírus.

A principal teoria para a origem do Sars-CoV-2 é que um vírus de morcego, há muito tempo, pulou em outra espécie, onde então se transformou em uma variante que mais tarde infectou seres humanos. O novo estudo, embora "muito útil", não esclarece esse cenário, diz Edward Holmes, biólogo evolucionário da Universidade de Sydney que estudou a genética dos coronavírus de morcego e é coautor do artigo.

Daszak concorda que mais espécies animais precisam ser amostradas. Ele aponta para evidências de coronavírus intimamente relacionados em pangolins - oito sequências desses animais estão incluídas na análise. "Acho que a história dos pangolins tem uma lição para nós: não fique preso em uma caixa pensando que isso é tudo sobre morcegos", diz.

Segundo o pesquisador, há muitas evidências de que alguns desses vírus estão se espalhando para os seres humanos o tempo todo no sul da China. Em um artigo anterior, Daszak e colaboradores encontraram anticorpos relacionados ao Sars em cerca de 3% das pessoas da amostra que vivem perto de cavernas de morcegos, sugerindo que haviam sido infectados por alguns desses vírus.

Ele argumenta que o mundo precisa mudar sua abordagem e deixar de reagir a pandemias para tentar identificar perigosos coronavírus antes que eles surjam.

Cancelamento da verba pelo NIH

O grupo de pesquisadores teve a verba cortada pelo Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês). Em seguida, a EcoHealth Alliance, organização sem fins lucrativos administrada por Daszk, recebeu milhões de dólares de doações e, assim, a pesquisa seguiu.

O corte foi feito no dia 24 de abril, quando o Instituto informou que estava encerrando a concessão de recursos para os estudos de Daszk e Shi, justificando que "a pesquisa não estava mais alinhada com as prioridades da agência". O grupo de cientistas tinha renovado o contrato com o NIH em 2019.

Trinta e duas sociedades científicas dos EUA assinaram uma carta de protesto em 20 de maio e 77 ganhadores do Nobel enviaram outra carta ao Departamento de Saúde e Serviços Humanos americano. Os Nobelistas disseram que o cancelamento parecia basear-se na política, e não na consideração do mérito científico.

Estadão
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