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Puberdade precoce em meninos pode ter relação com doenças; entenda

Problema afeta 20 vezes mais meninas e em 90% dos casos não há justificativa para a ocorrência

30 mar 2019 - 10h12
(atualizado às 12h39)
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A puberdade precoce, mais comum em meninas, pode ser uma preocupação maior quando ocorre em meninos. Em 50% dos casos de incidência no sexo masculino, existe a possibilidade de estar associada a alguma lesão ou tumor na região do hipotálamo.

Essa área do cérebro comanda a hipófise, glândula relacionada ao funcionamento de outras glândulas do corpo que liberam hormônios, inclusive os reprodutivos. São estes os responsáveis pelo desenvolvimento das características da puberdade nítidas na adolescência.

Especialistas ouvidos pelo E+ destacam que, nos meninos, a puberdade precoce geralmente é percebida tardiamente, por isso a atenção dos pais deve ser redobrada. A boa notícia é que, independente do diagnóstico, há tratamento eficaz e seguro.

O que é puberdade precoce?

A puberdade precoce é considerada uma doença e se dá pelo aparecimento de sinais da puberdade em idade prematura. Geralmente, ocorre antes dos oito anos em meninas e antes dos nove em meninos. Os indícios no sexo masculino são aumento dos testículos, do pênis, pelos faciais e mudança de voz.

"Nos meninos, os casos são subdiagnosticados, porque as primeiras manifestações são o aumento do volume testicular e mudança das características da genitália externa. Mas, por volta dos seis, sete anos, ele já toma banho sozinho ou, quando tem pênis aumentado, não há preocupação dos pais, até parece uma vantagem. Às vezes, é puberdade precoce e pode ter tumor", alerta Ana Claudia Latronico, chefe do Serviço de Endocrinologia e Metabologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas e professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

A especialista explica que uma lesão na hipófise pode ser provocada por uma alteração no sistema nervoso central que afeta o hipotálamo. "Os meninos são raramente acometidos pelo quadro de puberdade precoce, mas, quando acontece, a possibilidade de ter lesão grave no sistema nervoso central é maior", afirma.

Puberdade precoce em meninas

Enquanto os outros 50% dos meninos com puberdade precoce não apresentam justificativa para o problema, nas meninas a taxa é de 90%. Ou seja, não são encontradas alterações no sistema nervoso central que demonstre a causa da doença.

"E na menina [a puberdade precoce] é muito mais comum. Estudos mostram que ela é 20 vezes mais acometida", afirma Felipe Lora, pediatra e endocrinologista responsável pelo Núcleo de Puberdade Precoce do Sabará Hospital Infantil. No sexo feminino, os sinais da puberdade são muito mais notórios: crescimento das mamas e menstruação.

Tipos de puberdade precoce

Existem dois tipos de puberdade precoce, a central e a periférica. Ana Claudia explica que a primeira é causada pela ativação dos hormônios no hipotálamo e na hipófise. A segunda ocorre independente do sistema nervoso central e a produção de hormônios se faz pelas glândulas suprarrenais, espalhadas pelo organismo, ou pelos ovários ou testículos.

Lora faz um alerto aos pais. "Crianças que nasceram prematuras, pequenas, com baixo peso e estatura têm risco maior de começar a puberdade mais cedo. Deve-se acompanhar mais de perto", diz.

Caso os pais ou o pediatra que acompanha a criança notem algum sinal de puberdade precoce, o endocrinologista é o médico mais indicado para se procurar em seguida. O diagnóstico é essencialmente clínico, e exames serão necessários apenas para identificar as possíveis causas.

"Primeiro, tem uma consulta para ver se a puberdade está progredindo ou estagnou. Em alguns casos, ela começa e para sem ter problema. Se for progressiva, tem de ver se o caso é central (região do hipotálamo) ou periférico (ovários e testículos)", diz o pediatra. Se for central, um exame de ressonância magnética identificará se há lesão na hipófise.

Causa genética

Ana Claudia desenvolveu um estudo no qual descobriu um defeito genético responsável pela puberdade precoce naquele grupo em que não há causa definida. Com a pesquisa, ela foi uma das vencedoras do Prêmio Laureate da Sociedade de Endocrinologia Americana.

"Por meio de estudos envolvendo famílias com mais de um afetado pela puberdade precoce central, fomos capazes de detectar defeitos em genes", diz a especialista. "É um defeito transmitido pela mãe ou pelo pai, mas, quando transmitido pelo pai, a manifestação de puberdade precoce acontece. Quando transmite pela mãe, o gene fica silenciado", explica.

Consequências da puberdade precoce

As meninas acabam sofrendo um pouco mais com a puberdade precoce, uma vez que aparentam ter idade mais avançada do que a real. "Isso traz transtorno para as crianças, que se tornam mais deprimidas, sentem-se como se não fizessem parte de seu grupo etário. Criança de cinco anos que parece ter oito ou nove é tratada como criança mais velha ou pode sofrer uma abordagem sexual inadvertida", alerta Ana Claudia.

Um aspecto físico do início puberal prematuro é a altura. Segundo os médicos, a criança pode perder de dez a 20 centímetros de estatura no futuro. Isso ocorre porque ela cresce muito rápido no começo e a maturação óssea também se dá de forma prematura. Com isso, o fechamento antecipado dos espaços entre os ossos leva à parada de crescimento antes do tempo ideal e isso independe da altura dos pais.

Outra consequência da puberdade precoce é a possibilidade de doenças na fase adulta. Ana Claudia e Felipe Lora citam estudos que associam o caso a câncer de mama, de útero, doença cardiovascular e obesidade. Uma explicação seria a exposição crônica prolongada aos hormônios sexuais. Nas mulheres, o estradiol está relacionado ao aparecimento de tumor na mama e no endométrio.

Tratamento para puberdade precoce

Felipe Lora afirma que o tratamento é essencial justamente para evitar as ocorrências futuras. A terapia será indicada de acordo com o tipo de puberdade precoce diagnosticada. Se for central sem causa definida, faz-se uso de medicação que bloqueia o eixo hormonal e dá uma pausa na puberdade. Se houver tumor ou o caso for periférico, o tratamento é mais individual.

Ana Claudia explica que o bloqueio da puberdade é feito por meio da aplicação de um hormônio sintético que compete com o hormônio liberador das gonadotrofinas e o faz reduzir a secreção. "[O tratamento] é usado há mais de 20 anos, é seguro e eficaz", afirma. No Brasil, o medicamento é fornecido pelo governo como medicação de alto custo. Na rede privada, a pessoa pode consegui-lo na Secretaria de Saúde com base em exames e relatórios médicos que atestem a necessidade dele.

O tratamento é interrompido quando as crianças chegam à idade normal de começar a desenvolver a puberdade, que é dez anos para meninas e 11 anos para meninos. Outro parâmetro utilizado é a idade óssea, que avalia se o crescimento dos ossos está de acordo com a idade cronológica.

Alimentos aceleram a puberdade?

Faz alguns anos que é comum ouvir, por exemplo, que a soja acelera a hormonização, antecipando a puberdade. Um estudo publicado nos Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia associou o consumo excessivo de fitoestrógenos (presentes na soja) ao desenvolvimento mamário precoce em uma menina de quatro anos.

Ana Claudia afirma que alimentos contaminados com hormônios não são causas frequentes de puberdade precoce e que não há evidências concretas de que a soja possa causar puberdade. Ela acrescenta, porém, outro fator: o contato de crianças com produtos hormonais, como gel de testosterona, que são receitados aos pais e, por via transdérmica (pele), podem ser transmitidos a elas inadvertidamente. A relação também foi demonstrada em estudo.

Outra pesquisa também mostrou que componentes de produtos de higiene pessoal estariam associados à puberdade precoce, principalmente em meninas. Felipe Lora explica que esses elementos químicos são apenas candidatos à antecipação puberal, ainda não é uma relação de causa e consequência. "A orientação é evitar os excessos. Não é que não pode suco de soja, mas não o tempo todo. Com produtos de higiene, é bom fazer um rodízio para não ficar exposto continuamente [ao mesmo componente]", completa.

Estadão
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