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A mulher que vem derrotando o vício em celular

Tecnologia e excesso de informação serão temas da novela 'Travessia', de Gloria Perez, na TV Globo, após exibição de 'Pantanal'

23 abr 2022 - 05h10
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A relação da jornalista e locutora Ida Nuñez, de 66 anos, com o celular é estreita. "É um item básico na minha vida. Trabalho com os dois juntos, além de dois computadores. Eu passo resumo de notícias, clipping, vejo todas as redes, faço os pagamentos e um celular é muito lento pra mim. Enquanto coloco senha em um, no outro já vou levantando e-mail, vou deletando, colocando os dois computadores para funcionar, então, trabalho com os quatro juntos para poder ganhar tempo", conta. Ela percebe que consegue lidar com as tarefas cotidianas de forma mais ágil assim.

A história de Ida é semelhante à canção 'frenética' da dupla Daft Punk, intitulada Technologic: "Compre, use, quebre, arrume/Jogue no lixo, mude, envie e-mail, faça upgrad/ Carregue, aponte, dê zoom, aperte/ Agarre, trabalhe, rápido (...) Tecnológico. Tecnológico".

Os músicos fazem uma crítica ao atual estilo de vida das pessoas, em que tudo pede urgência. Muitos estão nessa situação, 'a mil por hora', com pendências a serem resolvidas com um toque do celular. Porém, Ida Nuñez percebeu que estava dependente do aparelho quando pensou que o havia perdido em uma loja de roupas.

A jornalista sempre levanta a bolsa e confere se está mais pesada por causa dos dois celulares que carrega. "Fui fazer isso e não tinha o peso do celular. Entrei em pânico! Tentava me acalmar e não conseguia. Não posso ficar sem celular, a vida toda está lá. Comecei a ficar com taquicardia, não conseguia respirar direito, um nervoso que eu não conseguia controlar. Parecido com abstinência. Comecei a tremer. Depois, consegui encontrar o celular nas sacolas para experimentar roupas no vestiário. Para mim, foi um alívio aquilo", lembra.

A próxima novela das nove da TV Globo que irá substituir Pantanal trará a nomofobia, ou seja, o vício em celular, como um dos temas. Travessia é escrita por Gloria Perez, novelista conhecida por trazer temas sociais de relevância da atualidade em suas obras.

"Quero trazer uma história que emocione e faça pensar, refletir sobre uma porção de coisas dentro desse universo moderno que estamos vivendo de revolução tecnológica, de excesso de informação", afirmou a escritora durante uma edição do programa Altas Horas, com Serginho Groisman. Recentemente, Gloria Perez publicou, no perfil oficial dela no Twitter, uma pesquisa que revela que o Brasil está em quarto lugar no ranking de países com maior índice de dependência de smartphones.

A nomofobia é o medo irracional que uma pessoa tem de ficar sem celular ou de ser incapaz de usá-lo por algum motivo. "Quando a pessoa não consegue fazer coisas que não estejam vinculadas ao uso imediato do aparelho, é um sinal de dependência. Também fazer outras atividades como estudar, namorar ou comer sem tirar os olhos do celular e ficar verificando mensagens e notificações a todo momento. Podemos afirmar que quando há um condicionamento da vida ao uso do aparelho é preciso de atenção", explica o psicólogo Davi Alves.

Ida Nuñez ressalta que não havia percebido que o uso do celular estava desencadeando um outro problema além da dependência: a ansiedade. "Por exemplo, eu gosto muito de filmes, séries, tenho várias assinaturas (streaming). Eu assisto aos seriados coreanos, que são mais lentos, naquele modo acelerado, sabe? Porque se eu vou maratonar, passar horas assistindo, já quero ir para o fim rápido. Um dia uma amiga me perguntou se eu não estava assistindo por prazer. E respondi que queria ver logo o final, se o cara matou, o que aconteceu, essas coisas. Depois fiquei pensando nisso. Tentei assistir o filme sem acelerar, ficou monótono e eu dormi", relata.

O aprimoramento da tecnologia e dos algoritmos de redes sociais podem ser os responsáveis por essa mudança comportamental dos seres humanos. "Quanto mais o indivíduo utiliza redes sociais e outros recursos tecnológicos e de interação e percebe nisso "ganhos", ele é reforçado a não somente reutilizar, mas também é incentivado a pesquisar similares sempre na busca de algo melhor. E esse comportamento posto em repetições pode, sim, desenvolver e aumentar a nomofobia", avalia Alves.

Tendo a consciência de que está refém da tecnologia, pelo menos no ambiente de trabalho, Ida Nuñez busca recursos para tentar driblar o problema no resto do dia. Além de psicoterapia, ela estabeleceu uma rotina de meditação ao acordar e antes de dormir.

"Acho que a ansiedade veio muito por causa do celular. Então, tirei todos os barulhinhos do celular porque, cada vez que você ouve um apito, para para ver o que é. E às 22h o aparelho fica totalmente desligado. Também, quando saio pra comer, não tiro o celular da bolsa. Não é que não queira. Você fica tentado a fazer, mas sem ele dá para aproveitar muito mais as refeições. Meu nível de ansiedade diminuiu e percebi a mudança", relata.

Estadão
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