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AMAZÔNIA

Caminhada leva para o mundo acima das nuvens

Depois de muito ajeitar as mochilas, finalmente conseguimos acondicionar os alimentos e equipamentos. Iniciamos, então, a caminhada.

Nossos guias e carregadores Rodolfo e Ricardo levavam nas costas espécies de mochilas feitas de madeira e cipó trançado chamadas goyares, que contrastavam com nossas mochilas impermeáveis, anatômicas e coloridas. As goyares funcionam como suporte para apoiar a carga, já que são completamente abertas. A bagagem deve ser amarrada a elas.

No primeiro dia, a trilha é praticamente plana. A maior dificuldade reside em adaptar-se aos cerca de 20 quilos de bagagem. A vegetação, formada por uma pastagem baixa, obriga a caminhar debaixo de um sol causticante. As poucas árvores estão na beira dos cursos de água que cortam a savana.

Cinco horas após a partida, chegamos ao Rio Kukenan, já no pé do Roraima, objetivo deste primeiro dia. O rio estava baixo e, afora algumas pedras escorregadias, atravessamos caminhando tranqüilamente. Montamos acampamento perto de uma casa de pau-a-pique onde vive uma família pemón.

Muralha de pedra - A partir desta primeira base, restava-nos uma pesada subida até chegar ao platô, o grande motivo da expedição. Há quem suba em dois dias, mas nós fomos de uma vez. Saímos às 7h da manhã e chegamos ao topo às 15h. À medida que subíamos e o paredão se aproximava, parecia impossível ultrapassar aquela barreira. Mas eis que nosso guia indicou uma estreita fresta formando uma rampa natural em meio às paredes, a mesma que Im Thurn, Rondon e tantos outros exploradores se utilizaram. Atingimos o início dessa ladeira entre esgotados e extasiados. No meio da monumental muralha parecíamos tão pequenos.

Mais duas horas de caminhada duríssima (já estávamos andando havia cinco horas) e finalmente rompemos o paredão. O cansaço desapareceu dando lugar a uma imensa sensação de paz. Assim passamos alguns minutos contemplando a planície lá embaixo e a barreira que acabávamos de conquistar.

No platô, ao contrário do que se imagina, nem tudo é plano. O terreno irregular e os labirínticos caminhos em meio às formações rochosas tornam-se armadilhas traiçoeiras. Montamos acampamento em uma pequena caverna numa encosta rochosa, chamada de "hotel" pelos índios. Nossa acomodação dispunha de chão de areia, um lago de água potável bem em frente e vista panorâmica.

Quando o jantar ficou pronto, uma surpresa: tico-ticos, vários deles, aproximaram-se, atraídos pelo cheiro da comida. É surpreendente que em um lugar ermo como este haja alguma vida animal. Depois, descobrimos que havia também pequenos roedores que rondavam as barracas à noite e uma espécie de sapo, de cor preta e do tamanho da ponta de um dedo, que se movimenta andando lentamente, desprovido da capacidade de saltar.

Tempo dos dinossauros - Os dois dias que se seguiram reservaram-nos mais e mais surpresas. O espetáculo começava ao amanhecer, sempre com o tempo limpo e um mar de nuvens abaixo de nós. Era como se estivéssemos em uma ilha de pedras no céu.

O dia era caminhar por trilhas que só os índios sabem decifrar. Quando menos se esperava, começava a ventar, vinha a neblina e chovia.

As formações de pedra, em meio à névoa, ficavam ainda mais misteriosas. Não foi por acaso que Arthur Conan Doyle inspirou-se nos relato de Im Thurn sobre a conquista do Roraima para o cenário de O Mundo Perdido, romance ambientado em uma montanha isolada no meio da Amazônia, repleta de dinossauros e seres pré-históricos.

Plantas carnívoras - Mesmo para um viajante veterano, é difícil encontrar no mundo um lugar parecido com o Roraima. Além das rochas esculpidas pelo vento e pelas chuvas, a flora ajuda a compor um ambiente raro. Grande parte das plantas é endêmica, ou seja, só ocorre naquele lugar. Por causa do isolamento natural, as espécies vegetais evoluíram de forma independente, como se estivessem em uma redoma. São bromélias, orquídeas e muitas plantas carnívoras, que desenvolveram a capacidade de aprisionar e digerir pequenos insetos, compensando assim a pobreza do solo, praticamente desprovido de nutrientes.

Uma curiosidade no Roraima é o Marco Triplo, pequena pirâmide de concreto que estabelece a fronteira Brasil, Venezuela e Guiana, demarcada em 1931 pelo general Cândido Rondon. Perto do local fica o Vale dos Cristais, repleto de cristais de quartzo.

A pedra Maverick é o cume do Roraima, a 2.875 metros. Do alto, é possível ter uma boa visão do platô. Chegar ao Lago Gladys, assim batizado por causa de um lago de mesmo nome citado em O Mundo Perdido, requer mais alguns dias no monte. A trilha é complicada e poucos são os que chegaram até ele.

Tromba-d'água - Na manhã do quinto dia (terceiro na montanha), iniciamos a descida, com grande atenção para evitar tombos. Acampamos no pé do monte, como na ida, na beira do Rio Kukenan. Na hora do jantar, caiu uma forte tempestade que não parou mais até o meio da madrugada. Já estávamos na barraca quando veio a tromba-d'água. Era como se um boeing estivesse se aproximando. De uma hora para outra, o rio se transformou, ficou violento.

Quando clareou, ainda estava muito caudaloso e percebemos que estávamos ilhados. Duramente, descobrimos um princípio do montanhismo: atravessar logo um rio se ele está baixo e acampar do outro lado. Agora teríamos de esperar.

Ansiosos para prosseguir pela trilha, perguntávamos insistentemente aos índios em quanto tempo seria possível fazer a travessia com segurança.

"Daqui uma hora", respondiam, pacientes. Por fim, emendamos algumas cordas e conseguimos amarrar uma ponta em cada margem do Kukenan. Atravessamos sob forte tensão.

Já em segurança, percebemos que das encostas dos platôs do Roraima e do Kukenan brotavam dezenas de gigantescas cachoeiras. Uma delas é a segunda maior do mundo, informou-nos o guia. Assim as montanhas se despediram de nós.

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Jornal da Tarde

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