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Alonso pode ser a salvação de mais um ano difícil para a F1

Lito Cavalcanti analisa as perspectivas da F1 para 2021: retorno de Alonso pela Alpine-Renault é a grande atração, mas Ocon pode incomodar

6 jan 2021 - 12h00
(atualizado em 8/1/2021 às 19h28)
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Fernando volta à Fórmula 1 depois de três anos ausente: missão difícil.
Fernando volta à Fórmula 1 depois de três anos ausente: missão difícil.
Foto: Renault / Divulgação

Ano novo, novas esperanças. É com essa expectativa que a Fórmula 1 se prepara para 2021, uma temporada que, a pouco mais de dois meses, já encara seus primeiros percalços. A data da prova inaugural do campeonato, no papel, é 21 de março, com o Grande Prêmio da Austrália – mas a infindável Covid-19 ameaça um adiamento de uma semana. A imposição de regras mais duras, que preveem 14 dias de quarentena para quem chegar ao país, pode transferir a abertura para o dia 25, data do GP do Bahrain.

Nada ainda confirmado, mas caso aconteça, o adiamento da prova da Austrália vai gerar economia em um ano em que os gastos das equipes – salvo poucas mas volumosas exceções – se limitarão a 145 milhões de dólares. Essa benesse viria da mudança dos testes de pré-temporada de Barcelona, na Espanha, para o Bahrein, onde carros e equipamentos já permaneceriam, à espera da corrida. Com isso, em vez de se deslocar para a Espanha e, em seguida, para a Austrália, a pré-temporada e a corrida inaugural no Bahrein possibilitariam uma redução significativa de gastos.

Mas se essas primeiras notícias indicam um calendário quase tão atribulado quanto foi o de 2020, elas não eliminam algumas expectativas positivas. Com várias mudanças, a Fórmula 1 pode, a exemplo do ocorrido em sua última edição, ter um campeonato mais atraente do que se pode esperar diante da perspectiva da continuidade do domínio da Mercedes e de Lewis Hamilton.

A dança das cadeiras entre pilotos e equipes poucas vezes foi tão animada. São nada menos de quatro mudanças entre os nomes já estabelecidos, como se sabe: Sebastian Vettel deixa a Ferrari rumo à Racing Point, agora denominada Aston Martin; Sergio Perez troca a Racing Point pela Red Bull; Daniel Ricciardo sai da Renault em direção da McLaren; e, último mas não menos importante, Fernando Alonso retorna à categoria depois de dois anos de ausência. Vai integrar a equipe pela qual foi campeão em 2005 e 2006 e de onde saiu em 2007, ano de sua malfadada mudança para a McLaren. Este retorno é a maior aposta da Fórmula 1 em 2021.

Em 2005, Alonso contou com as benesses da Michelin: agora todos vão de Pirelli.
Em 2005, Alonso contou com as benesses da Michelin: agora todos vão de Pirelli.
Foto: Renault / Divulgação

A diferença que Alonso vai encontrar nesta volta não será apenas a troca do nome Renault para Alpine. Em sua primeira passagem pela equipe francesa, o bicampeão espanhol tinha em mãos um carro de ponta e as benesses de uma fábrica de pneus trabalhando prioritariamente para satisfazê-lo. Com a Michelin a seu lado, ele era o único piloto capaz de fazer frente – e superar – a dupla Ferrari/Bridgestone que havia municiado Michael Schumacher na conquista de cinco títulos mundiais consecutivos. Agora, todos correm com pneus Pirelli, nas mesmas condições.

Hoje, a Renault/Alpine vem de um quinto lugar – entre 10 concorrentes – no campeonato mundial de construtores. À sua frente estão a Mercedes, heptacampeã, a Red Bull, a McLaren e a Racing Point/Aston Martin. Mas não se pode negar sua ascensão desde o ano de sua volta à Fórmula 1, 2016, quando foi a nona entre 11 concorrentes. Desde então, vem melhorando: sexta em 2017, quarta em 2018 e quinta em 2019. São os frutos de uma vastíssima reorganização que promete evolução neste novo ano.

A base é a união de Alonso com o grupo técnico liderado pelo inglês Pat Fry, engenheiro com passagens de destaque pela Benetton, McLaren e Ferrari. Mas todas as esperanças dependem do motor, ou da unidade de potência, que engloba o motor a combustão interna e os sistemas de recuperação de energia, que adicionam 160 cavalos durante 33 segundos a cada volta de uma corrida. 

No quesito eficiência, nenhuma outra unidade de potência (a saber: Renault, Honda e Ferrari) se equipara à da Mercedes. Por isso, Alonso, bem a seu estilo “sem papas na língua”, já indicou o campeão desta próxima temporada: Lewis Hamilton, seu ex-companheiro e desafeto na McLaren. É devido a esse favoritismo que ele encara 2021 como etapa de preparação para 2022, quando novas regras trarão para o jogo novas e intensas limitações aerodinâmicas para dar fim à quase impossibilidade de se ultrapassar durante as corridas.

Nos testes do final da temporada,  Alonso conseguiu ser mais rápido que Ricciardo e Ocon.
Nos testes do final da temporada, Alonso conseguiu ser mais rápido que Ricciardo e Ocon.
Foto: Renault / Divulgação

O espanhol, porém, terá de se impor a seu jovem e audacioso companheiro de equipe, o francês Esteban Ocon. um duelo que já se anuncia como o mais atraente da nova temporada. Os dois se conhecem desde quando Ocon corria com um kart FA, a marca usada por Alonso como fabricante de chassis desses mini-monopostos em que o futuro da garotada começa a ser burilado. Mas na pista nunca se cruzaram.

Ocon é um adversário duríssimo, que não admite ser segundo piloto para ninguém. Campeão da F3 Europa em 2014 (batendo Max Verstappen) e da GP3 em 2015, ele fez nove corridas pela limitadíssima Manor em 2016 e ingressou na Force India (hoje Aston Martin) em 2017 e terminou o ano em oitavo, superando nomes emergentes como o também espanhol Carlos Sainz (então na Toro Rosso, hoje Alpha Tauri), Nico Hulkenberg (na Renault) e Felipe Massa (na Williams). 

Décimo-segundo em 2018, Ocon foi afastado durante a transição da Force India, que passava a ser a Racing Point e precisava alojar o filho do dono, Lance Stroll, e passou 2019 como piloto de testes da Mercedes. Este ano longe das pistas se refletiu negativamente em sua performance em 2020, quando ingressou na Renault e teve como companheiro o fortíssimo Daniel Ricciardo. Mas foi ele, e não o superstar australiano, quem obteve o melhor resultado da equipe francesa, o segundo lugar no GP de Sakhir.

Desta vez, é Alonso quem vem de um período de afastamento – mesmo considerando suas muitas peripécias nestes dois anos de ausência. Nas 500 Milhas de Indianápolis, onde brilhou ao estrear em 2017, no ano seguinte ele não conseguiu se classificar entre os 33 pilotos que compõem o grid da tradicionalíssima corrida e foi um discreto 21º em 2020, depois de largar em 26º. Contam a seu favor as vitórias nas 24 Horas de Le Mans em 2018 e 2019 – mas não muito. Ele corria pela Toyota, a única equipe de fábrica e concorrente solitária na classe mais potente, a LMP1. Uma situação em que raramente enfrentou os duelos roda-a-roda que fazem do pelotão intermediário o mais disputado da F1.

Daniel Ricciardo trocou a Renault pela McLaren e também estará de casa nova.
Daniel Ricciardo trocou a Renault pela McLaren e também estará de casa nova.
Foto: Renault / Divulgação

Neste quadro figuram também incógnitas como a influência dos anos e o destino nem sempre glorioso dos que retornam à Fórmula 1. Alonso vai completar 40 anos no dia 29 de julho, mas se diz na melhor forma de sua vida esportiva. Nos testes pós-temporada, em Abu Dhabi, ele completou 105 voltas em um só dia e foi o autor do melhor tempo, 1min36s333, superando fracionalmente as marcas de Ocon e Ricciardo na prova de classificação, respectivamente 1min33s359 e 1min33s406 – o que pode ser atribuído à maior aderência proporcionada pelo depósito de borracha dos pneus durante a corrida, mas, ainda assim, atesta que ele ainda pode ser veloz em um qualify. 

A outra dúvida é sua capacidade de se readaptar. Nestes dois anos de ausência, os carros passaram por um período de amadurecimento significativo. Prova disso é o ganho de tempos desde 2017, seu último ano na Fórmula 1 até 2020. Tomando-se como base Barcelona, o circuito usado pelas equipes para a pré-temporada, portanto o mais conhecido por pilotos e engenheiros, a evolução foi enorme. Naquele ano, o tempo da pole position, obtida por Hamilton com a Mercedes W08, foi 1min19s149, com velocidade média de 211,727 km/hora. Na última edição, a Mercedes W11 permitiu a Hamilton fazer a pole position com o tempo de 1min15s584 (um ganho superior a 3 segundos e meio), e a média subiu para 221,713 km/h, quase 10 km/h a mais.

A história aponta para vários retornos de sucesso, como o de Niki Lauda, que se afastou em 1979 e voltou em 1982, sagrando-se campeão mundial em 1984. Há também o exemplo de Alain Prost, que deixou a Ferrari em 1991 e retornou em 1993, conquistando também o título mundial. O que não pode ser esquecido é que, nessa segunda vida, eles estavam ao volante dos melhores carros disponíveis, Lauda no McLaren MP4 com motor TAG Porsche e Prost no Williams FW15C com motor Renault, ambos dominadores incontestes de suas épocas.

Esteban Ocon não gosta de ser segundo piloto: como será o relacionamento?
Esteban Ocon não gosta de ser segundo piloto: como será o relacionamento?
Foto: Renault / Divulgação

Um outro caso, o de Michael Schumacher, aponta na direção contrária. Após se afastar da Ferrari como heptacampeão em 2006, ele retornou quatro anos mais tarde, na Mercedes, que havia sido campeã no ano anterior, quando ainda se chamava Brawn Racing. Em 58 corridas, o alemão se tornou um piloto do pelotão intermediário. Seu melhor resultado foi um terceiro lugar em Valência 2012 e suas colocações finais nos campeonatos foram nono, oitavo e 13º. 

Tudo somado e dividido, a situação que Alonso vai encontrar neste 2021 se assemelha mais à de Schumacher do que às de Lauda e Prost. Como seu objetivo é lutar pelo título apenas a partir de 2022, quando serão instituídas as novas regras, nem tudo está perdido. Mas, por via das dúvidas, é bom ele ficar de olho em Ocon. Vai que...

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