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Curitiba corre contra o tempo para multiplicar startups

Após resistência inicial, capital paranaense começa ecossistema e gera nomes como Pipefy, Ebanx e MadeiraMadeira

19 set 2018 - 05h11
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Aos 31 anos, o paranaense Aléssio Alionço conduz sua segunda startup, a Pipefy. A empresa, cujo sistema ajuda organizações a automatizar processos internos, já atende 15 mil clientes em 150 países. Entre eles, há nomes como Santander, Coca-Cola e Visa. Neste ano, a Pipefy recebeu aportes de US$ 16 milhões.

Apesar de ter um escritório no Vale do Silício, ele prefere manter a base em Curitiba, onde a empresa nasceu. "Gosto de colaborar com o desenvolvimento da cidade", diz ele, que é um dos principais nomes do ecossistema de startups da capital paranaense. Mas nem sempre foi assim.

Quando começou a empreender, em 2008, Aléssio tinha uma loja de serviços, a Acessozero. A empresa chegou a ter 1 milhão de usuários e foi vendida em 2012 para o Apontador, mas deixou "um gosto amargo" para o empreendedor. Uma década depois, ele diz que a empresa demorou a procurar investidores e que faltaram mentores, em uma cidade ainda isolada.

Hoje, a Pipefy de Aléssio divide terreno com dezenas de startups locais, como o site de comércio eletrônico MadeiraMadeira ou a ferramenta de serviços contábeis Contabilizei. São nomes de um ecossistema que só agora começa a deslanchar.

Cautela. A resposta para a demora, na visão dos próprios empreendedores, está ligada à própria cultura de Curitiba. Nascido na cidade, o poeta Paulo Leminski definiu seus conterrâneos como "cautelosos, meio ariscos e analíticos". São características que não ajudam a criação de um ambiente de colaboração, vital para o surgimento de uma cena de startups. Até mesmo quem já era veterano do mercado de tecnologia tinha dificuldade para apostar no setor.

"Por muito tempo, abri palestras dizendo que não investia em startups", lembra Marcel Malczewski, fundador da Bematech, empresa de automação comercial, comprada pela Totvs em 2015. Hoje, porém, ele tem 15 startups no portfólio do M3, fundo de investimentos que lidera. Metade delas é de Curitiba.

Por décadas, os engenheiros formados nas faculdades da região - como as federais UFPR e UTFPR e a particular PUC-PR - também preferiam empregos em multinacionais, como Volkswagen, HSBC e Renault. Nem exemplos como a Positivo Informática, que cresceu e abriu capital na bolsa de valores, animaram gerações a empreender.

Corrida. Na última década, porém, a inspiração de gigantes do Vale do Silício criou uma onda de empreendedorismo por todo o mundo, que nos últimos anos chegou a Curitiba. Hoje, já existem nove aceleradoras, sete incubadoras e 14 espaços de inovação aberta atuando na região. A proximidade com São Paulo também ajuda - afinal, é um voo de apenas 40 minutos. "Consigo suprir a distância marcando um dia inteiro de reuniões", diz Vitor Torres, fundador da Contabilizei, que nasceu em 2013 e hoje soma 10 mil clientes e 210 funcionários.

A qualidade de vida, com pontos fortes como o sistema de transporte, também favorece que a mão de obra deseje estar na região. "Já sonhei morar no Vale do Silício", diz Robson Privado, vice-presidente de vendas e marketing da MadeiraMadeira, que vende itens para casa em seu e-commerce. "Hoje, prefiro ficar em Curitiba, onde o custo de vida é bem mais baixo."

A startup surgiu quase ao acaso: era uma tentativa dos irmãos Daniel e Marcelo Scandian de ajudar os pais, donos de uma loja que vendia pisos de madeira, a se livrar do estoque que tinham importado dos Estados Unidos em tempos de crise. Hoje, tem cerca de 400 funcionários e fundos como Kaszek e Monashees entre seus apoiadores.

Atração. A cidade também atraiu nomes importantes como a aceleradora paulistana Ace ou a incubadora americana Founders Institute, que têm sedes locais dentro do Jupter, misto de espaço de eventos e fundo de investimentos. Além disso, começam a aparecer investidores especializados em startups - além da Jupter e da M3, há o Curitiba Angels, grupo de 63 investidores-anjo.

Ajuda também o fato de que as startups perceberam que precisam falar de si e da cidade. Um exemplo é o da Ebanx, que nasceu em 2012 e processa pagamentos para sites estrangeiros. Hoje, a empresa está em sete países e processou em 2017 US$ 1,2 bilhão para clientes como Spotify, Airbnb e AliExpress. Para divulgar o orgulho da sua terra, o departamento de design da empresa criou um adesivo com os dizeres "Eu amo Curitiba" - no lugar do coração, há uma araucária, símbolo do Estado.

Agora, o adesivo está colado no computador de vários sócios da companhia - mesmo sem nenhum logo da Ebanx. "Já estava cansado de chegar a São Paulo e ser recebido com nariz torto porque a empresa é de Curitiba", diz André Boaventura, sócio e diretor de marketing da startup. "Agora, queremos fazer o mundo olhar para a gente."

Estadão
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