SP: empreendedores julgam apreensão de patinetes arbitrária
Instituições e pessoas do ambiente de inovação criticaram a operação da Prefeitura de São Paulo, que recolheu 557 equipamentos da Grow
A apreensão de 557 patinetes da empresa Grow - fusão da mexicana Grin com a brasileira Yellow - pela Prefeitura de São Paulo, na última quarta-feira (29), desencadeou uma série de críticas do ecossistema de inovação contra a gestão municipal do prefeito Bruno Covas (PSDB). Do outro lado, o poder público alega que a companhia de mobilidade não realizou o credenciamento que validaria sua operação nas vias do município.
Uma das instituições do setor de inovação que criticou a ação da Prefeitura foi a Associação Brasileira de Startups (Abstartups). Em pronunciamento oficial, divulgado na última quinta (30), a organização considerou a apreensão dos patinetes como ilegal e se colocou à disposição para conversas com a gestão municipal. “As startups chegaram para revolucionar padrões”, diz em nota. “Se o poder público não aceitar esse fato, vai sempre conflitar com os melhores interesses dos cidadãos.”
Ao Terra, a vice-presidente da Abstartups, Tânia Gomes, afirmou que a operação de apreensão da gestão municipal foi arbitrária e truculenta. “Não é jogando patinetes em caminhões que você trata o ambiente de inovação da cidade”, diz. “Não é assim que você trata empreendedores que empregam mais de 700 pessoas e que estão investindo no município.” Segundo ela, o recado final da ação é o descaso e a falta de reconhecimento da Prefeitura para com as empresas de inovação.
Outra organização que repudiou a atitude da Prefeitura foi a organização ZeroOnze, que atua como uma comissão da comunidade de inovação no município de São Paulo. Em nota, a instituição citou a importância da capital paulistana para o ambiente de startups, sendo a cidade com o maior número de empresas nascentes - são aproximadamente 2.500 - e que é líder em captação de investimentos do exterior. “Ações truculentas não deveriam ser caminho para frear a inovação.”, diz.
O mentor de finanças e contabilidade para startups, Erich Tavares, em postagem no LinkedIn, comenta que a atitude da Prefeitura mostra a dificuldade de empreender no Brasil. “Gerar oportunidades de trabalho, renda e inovar são xingamentos na ótica do setor público”, diz na publicação. “A cada dia que passa, a gestão municipal mostra que não defende o empreendedorismo, a inovação e os cidadãos que querem ter melhores serviços ao melhor custo possível.”
O empreendedor Marco Gomes, que fundou as startups boo-box e Mova Mais, também utilizou o LinkedIn como plataforma para reprovar a atitude da Prefeitura de São Paulo. “Patinetes e bicicletas podem ser bem utilizados e até regulamentados sem essa perseguição afobada da Prefeitura de Doria-Covas”, diz na publicação. No mesmo texto, Gomes também dirige palavras à comunidade de inovação. “Durante as eleições de 2016, muitas pessoas do empreendedorismo apoiaram a chapa do PSDB e ignoraram a gestão Haddad que fez uma boa gestão de mobilidade urbana.”
Troca de farpas
Apesar de estarem colaborando uma com a outra desde janeiro deste ano, quando houve a instituição de um grupo de trabalho para a criação de uma regulamentação de patinetes, a Prefeitura e a Grow divergem em relação ao decreto publicado pelo prefeito Bruno Covas. Após a apreensão dos 557 patinetes elétricos na região da Avenida Faria Lima, Rua Funchal e Parque do Povo, na última quarta-feira (29), os dois lados protagonizaram uma troca de farpas por meio de notas oficiais nos últimos dias.
No dia do recolhimento dos equipamentos, a Prefeitura disse, em nota, que a apreensão ocorreu por conta da violação das regras do decreto publicado pelo prefeito Bruno Covas no dia 14 de maio. “As empresas de locação de patinetes não realizaram o credenciamento previsto na legislação e, portanto, operam sem autorização legal da administração”, afirmou. Segundo o poder público, faltou às companhias de mobilidade que elas lhes enviasse os documentos necessários para o cadastro e conseguinte liberação para circular na cidade.
A Grow, no mesmo dia, por meio de nota, retrucou as justificativas da gestão municipal. “A empresa entende que a ação da Prefeitura foi ilegal e atenta contra o direito de escolha dos cidadãos de São Paulo”, disse. A principal reclamação foi quanto ao estado dos equipamentos que, segundo a companhia, foram danificados após a apreensão. “Nós informamos que pelo menos 400 de nossos patinetes foram recolhidos e danificados pela Prefeitura de São Paulo.”
Em outro nota, esta divulgada na última quinta-feira (30), um dia após a operação de apreensão, a empresa de mobilidade voltou a criticar a atitude do poder público. “Seguiremos questionando as irregularidades das medidas da Prefeitura na Justiça até que o direito de escolha e de ir e vir dos cidadãos de São Paulo seja respeitado.”, diz. Segundo a empresa, o recolhimento dos 557 patinetes acarretou, nas últimas 24 horas entre a a quarta-feira (29) e a quinta-feira (30), em uma redução de 25% nas viagens dos aplicativo da Yellow e Grin.
A Prefeitura e a Secretaria de Mobilidade e Transportes (SMT-SP), procuradas pelo Terra para comentar o caso, responderam que os canais para conversas continuam disponíveis. “Esclarecemos que, desde o início do ano, quando foi constituído o grupo de trabalho, para elaboração da regulamentação, mantemos o diálogo aberto com todas as empresas.”, dizem em nota enviada pela assessoria de imprensa. “A SMT-SP informa também que, em 16 de maio, publicou a portaria nº 069/2019, que instituiu as normas para o credenciamento de operadoras do serviço de compartilhamento de patinetes.”
Quanto ao credenciamento, motivo pelo qual os patinetes foram apreendidos pela gestão municipal, a Grow rebate. “Dentro do grupo de trabalho, constituída pela própria Prefeitura, nós fornecemos toda a documentação requerida para o cadastramento da Yellow e Grin”, diz a companhia de mobilidade na nota da última quinta-feira (30). “Nossa atividade, de locação de veículos, é regulada pelo Código Civil Brasileiro, portanto, não cabe qualquer tipo de cadastramento para operar na cidade.”
Apreensão continua
Na última sexta-feira (31), caminhões da Prefeitura foram vistos recolhendo patinetes novamente. Na visão da SMT-SP e da Prefeitura, as empresas continuam operando sem cadastro e, portanto, de forma ilegal para o poder público. Mesmo contestado na Justiça pela Grow, o decreto do prefeito Bruno Covas permanece em vigor. Na semana passada, o juiz Fausto José Martins Seabra negou o pedido de liminar da empresa de mobilidade para suspender as leis provisórias para a circulação de patinetes na cidade de São Paulo.