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Opinião: A real situação da economia alemã

30 jul 2020 - 10h50
(atualizado às 11h14)
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O coronavírus causou uma crise sem precedentes na Alemanha do pós-guerra. Apesar de alguns analistas tentarem demonstrar otimismo, o pior parece ainda estar por vir, opina Henrik Böhme.É um número gritante: queda de 10,1%. Nunca na história da Alemanha do pós-guerra a economia do país havia despencando tanto quanto no segundo trimestre de 2020. É um dia histórico, já que a cifra será usada como referência nos próximos anos quando as coisas piorarem novamente. Assim como ocorreu com a queda de 7,9% no segundo trimestre de 2009 - quando a economia global estava à beira da grande crise financeira.

Loja fechada na cidade de Bonn, no oeste da Alemanha
Loja fechada na cidade de Bonn, no oeste da Alemanha
Foto: DW / Deutsche Welle

Nada disso é surpreendente quando as fábricas não estão produzindo, os navios porta-contêineres não são carregados, os serviços deixam de ser prestados, as feiras de negócios não acontecem mais, e os restaurantes precisam permanecer fechados. A questão era saber se a queda seria de dois dígitos ou não - e pelo menos essa pergunta foi respondida. É claro que agora todos os adivinhos tentam imediatamente olhar para frente e apontar que após o alívio do lockdown de dois meses, o motor econômico está ligado novamente e que o fundo do poço já foi superado.

"Certamente" a economia voltará a crescer no terceiro trimestre, até significativamente; algumas previsões até sinalizam uma "rápida reviravolta" que vai colocar o país novamente no caminho do crescimento. Outros observam que há "visivelmente menos pessimismo" entre as empresas. Tudo isso não requer nenhum conhecimento profundo do assunto: afinal, o governo alemão lançou o maior pacote de estímulo econômico já imaginado, que rapidamente produziu impacto. É como sair de um porão escuro: você verá o primeiro raio de luz relativamente rápido.

Agora as más notícias: as boas notícias são somente isso. Por mais benéficos que sejam as isenções e os bilhões do pacote de auxílio estatal no momento, isso tudo só vem frequentemente encobrindo os problemas que muitas empresas tinham antes mesmo da pandemia. Esse vírus desagradável não provoca apenas doença e morte entre as pessoas. Ele também é implacável em expor os problemas das empresas. Portanto, se você precisar de auxílio para sobreviver em tempos de coronavírus, talvez o dinheiro de Berlim lhe ajude. Mas no dia em que esse apoio desaparecer (e isso vai acontecer), será extremamente difícil para muitos.

Essa pergunta precisa ser respondida: por quanto tempo o Estado pode manter essa proteção, proteger as empresas da falência e intervir no mercado? Faz parte do dia a dia de uma economia de mercado que empresas desapareçam porque não conseguiram suportar a tempestade de uma crise. O resultado final de uma economia planejada, na qual o Estado regula a economia, já foi observado na antiga Alemanha Oriental três décadas atrás.

Uma em cinco empresas está vendo sua existência ameaçada pelo coronavírus, de acordo com uma pesquisa do Instituto Ifo, de Munique. A seguradora de crédito Euler Hermes prevê uma "onda sem precedentes de falências", que também se aproxima da Alemanha. E ela pode atingir qualquer setor. Aviação e turismo estão particularmente em risco. E setores que sofrem há muito tempo, como o varejo, por exemplo. O lento declínio das tradicionais lojas de departamento alemãs - cujos remanescentes operam sob a bandeira Galeria Karstadt Kaufhof - está sendo dramaticamente acelerado pelo coronavírus.

A situação na indústria automotiva é igualmente sombria e representa uma ameaça real ao mercado de trabalho. Os negócios já estavam mal há algum tempo (palavras-chave que explicam isso: Dieselgate e a aposentadoria do motor de combustão), mas o coronavírus também vem atuando como catalisador. O sindicato IG Metall aponta que há cerca de 300 mil empregos em risco. E não se trata apenas dos grandes fabricantes de automóveis, mas também de muitos fornecedores de médio porte ou fabricantes de máquinas. Neste setor, quase 80% das mais de 6.600 empresas vêm soando o alarme para um declínio "perceptível ou sério" na demanda. Resumindo: essa indústria emprega mais de um milhão de pessoas, mais do que as montadoras.

As más notícias já não são suficientes? A economia alemã, extremamente orientada para a exportação, provavelmente sofrerá tanto quanto seus importantes compradores, como os EUA, o Brasil e a Índia, que ainda não superaram a pandemia. Outro problema: o número de empresas altamente endividadas e com lucros baixos está aumentando drasticamente. Não apenas na Alemanha, mas também em outros países da Europa e nos EUA. A consequência: os lucros não serão suficientes para pagar os juros. É um círculo vicioso. Embora a dívida não seja uma coisa ruim por si só: a Volkswagen está 192 bilhões de dólares no vermelho (número um no mundo nesta lista), mas pode atender seus credores a qualquer momento. Mas esse é exatamente o problema para muitos outros, que, por causa da pandemia, não podem fazer isso.

Então, o que deve ser feito agora para que o outono e o inverno no hemisfério norte não sejam ainda mais tenebrosos, considerando a chegada de uma segunda onda de coronavírus? O governo alemão precisa analisar onde mais pode ajudar e como o pacote de estímulo econômico pode vir a ser reajustado. Acima de tudo, o auxílio estatal para os trabalhadores que tiveram sua carga reduzida deve ser prorrogado, e a lei de falências, adaptada.

É possível que em breve haverá uma vacina - e tudo ficará bem. Mas, para muitas empresas que têm um modelo de negócios defasado, pode ser tarde demais.

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