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Trump pode ser afastado antes da posse de Biden? Entenda

Veja perguntas e respostas sobre o futuro político do presidente dos Estados Unidos

11 jan 2021 - 13h31
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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump pode ser o primeiro da história a sofrer dois processos de impeachment. Os democratas da Câmara estão unidos em torno da ideia de aprovar o processo a toque de caixa para fazer uma declaração importante em oposição a Trump.

Trump pode ser afastado antes da posse de Biden? Entenda
Trump pode ser afastado antes da posse de Biden? Entenda
Foto: EPA / Ansa

A invasão do Capitólio dos EUA por extremistas pró-Donald Trump na quarta-feira, 6, gerou apelos de alguns congressistas para removê-lo do cargo antes que Joe Biden tome posse em 20 de janeiro. O republicano, que se recusou a se comprometer com uma transferência pacífica de poder, dirigiu-se a milhares de manifestantes e repetiu alegações infundadas de que a eleição foi roubada, incitando a violência e a invasão.

Existem duas maneiras de destituir um presidente americano do cargo: uma delas é a 25ª Emenda da Constituição dos EUA, a outra, o impeachment seguido por uma condenação no Senado. Em qualquer cenário, o vice-presidente Mike Pence assumiria até a posse de Biden.

A aprovação de um impeachment não é o mesmo que tirar Trump do cargo antes que o próximo presidente seja empossado. E o impeachment por si só não o impediria de tentar concorrer ao cargo novamente em 2024 - o que parece ser a intenção democrata. A condenação e a destituição do cargo caberiam ao Senado, que ainda é controlado pelos republicanos, e que ainda terá 50 senadores republicanos na próxima legislatura.

A maioria dos republicanos é contra a saída de Trump antes do fim do mandato, o que praticamente inviabiliza um processo de impeachment bem-sucedido e rápido. O uso da 25ª emenda também fica mais difícil a cada dia que passa, porque Trump teria o direito de recorrer de seu uso. Três senadores republicanos já declararam abertamente achar que Trump deveria renunciar antes do fim do mandato - uma hipótese pouco provável.

Confira a seguir como poderia ocorrer cada passo.

Trump pode sofrer um impeachment?

Sim, mas não seria um processo tão fácil quanto os democratas parecem querer acreditar. Apesar de terem conseguido o controle da Câmara e do Senado, os democratas não têm a maioria absoluta necessária para aprovar qualquer projeto ou o impeachment. O Senado nos próximos dois anos terá 48 democratas e 2 independentes que são alinhados ao partido, e 50 republicanos. A única vantagem do novo governo é que a vice-presidente eleita Kamala Harris tem o voto de desempate por acumular o cargo de presidente da Casa.

A constituição dos EUA diz que o Senado precisa realizar um julgamento e votar para condenar um presidente e tirá-lo do cargo. E isso exige que dois terços dos senadores concordem em condená-lo. Mesmo que o impeachment seja aprovado a toque de caixa na Câmara, seria preciso que 64 senadores votassem pelo impeachment - os dois independentes e 14 republicanos. Até agora, nenhum senador republicano se mostrou favorável ao julgamento.

Como seria um segundo processo de impeachment?

Primeiro, os congressistas da Câmara redigem os artigos de impeachment. Já existem pelo menos dois artigos de impeachment circulando, incluindo um redigido pela democrata Ilhan Omar, de Minnesota. Outro, elaborado pelo deputado Jamie Raskin, de Maryland, pede o impeachment de Trump por incitar uma insurreição e tem mais de 130 co-autores, a maioria de democratas da Câmara.

A presidente da Câmara dos Deputados, a democrata Nancy Pelosi, afirmou ter 240 votos necessários para aprovar o processo, e disse que ele deve começar a tramitar na terça-feira, 12. É necessária apenas uma maioria na Câmara para o impeachment de um presidente, e os democratas detêm essa maioria. Pelo menos um republicano, talvez alguns mais, pode estar inclinado a votar com os democratas - o deputado Adam Kinzinger, de Illinois.

Nancy Pelosi enviou uma carta para o vice-presidente Pence dando um ultimato para que ele e o gabinete de Trump usassem a 25ªa emenda, que prevê a remoção do presidente. Ela emitiu uma declaração na sexta dizendo que se Trump não deixasse o cargo por outro método, ela faria a Câmara avançar com o impeachment.

O processo poderia ser acelerado faltando 9 dias para Trump deixar o cargo?

Em 2019, o processo de impeachment aprovado pela Câmara, na ocasião também de maioria democrata, levou meses e passou não por um, mas por dois comitês da casa. Os democratas investigaram as ações de Trump na Ucrânia, e como ele usou o poder para tentar obter provas contra Hunter Biden, filho do presidente eleito, Joe Biden. Eles redigiram artigos de impeachment e votaram nos comitês e, em seguida, no plenário da Câmara.

Agora, os democratas não têm esse tempo - mas também não precisam disso. O presidente do comitê que normalmente lida com o impeachment disse na quinta-feira que apoiaria o envio dos artigos direto para o plenário da Câmara.

O Congresso não estaria quebrando nenhuma regra dessa forma, disse o jurista Josh Chafetz, da Faculdade de Direito da Universidade Georgetown. A constituição não especifica nenhum procedimento que a Câmara deve seguir para iniciar um impeachment. Na verdade, ele observou que quando a Câmara promoveu o impeachment do presidente Andrew Johnson, em 1868, eles o fizeram antes mesmo de redigir artigos formais de impeachment.

Então Trump pode ser removido do cargo pelo impeachment?

Não é tão simples. A constituição diz que o Senado precisa realizar um julgamento, votar para condenar um presidente e tirá-lo do cargo. E isso exige que dois terços dos senadores concordem em condená-lo, o que requer que um número considerável de republicanos participasse.

É aqui que as coisas ficam politicamente complicadas, como da última vez. O principal senador democrata disse que apóia o impeachment. Mas não depende dele. Os republicanos do Senado, que controlam a maioria por mais algumas semanas, estão furiosos com Trump pelo que aconteceu.

Alguns falaram em removê-lo do cargo usando a 25ªa emenda, ou exigindo que renuncie. Mas poucos discutem as duas opções abertamente - apenas três, até agora. O senador Lindsey Graham, aliado de Trump que rompeu com o presidente, disse que não apoiaria sua saída do cargo. Mas ele deixou a porta aberta: "Se algo mais acontecer, todas as opções estarão sobre a mesa", disse.

O senador Mitt Romney, de Utah, desafeto de Trump, foi o único senador republicano a votar para condenar Trump no último impeachment e rejeitou a opção agora, dizendo na quinta-feira que achava que não havia tempo suficiente: "Acho que temos que segurar nossa respiração pelos próximos dias".

Então, o que isso significa para Trump?

Significa que o impeachment pode terminar exatamente como da última vez, com uma marca em sua ficha pela Câmara dos Deputados, mas com ele permanecendo no cargo. O Senado pode simplesmente não realizar um julgamento. Embora a constituição pressuponha que os senadores têm o dever de fazê-lo, ninguém pode forçá-los a isso, disse Chafetz.

Chafetz disse ainda que, se realmente quisessem, os senadores poderiam realizar um julgamento rápido. Não precisa levar semanas. Um julgamento interromperia qualquer outra ação que o Senado precisasse fazer por alguns dias (embora a Casa esteja em recesso até a posse de Biden).

É também no Senado que ocorre uma votação crítica para o futuro de Trump: a de impedi-lo de assumir o cargo novamente. Se eles não realizarem um julgamento e votarem pela sua condenação, também não haveria um julgamento para bani-lo de concorrer a cargos eletivos novamente.

Trump pode ser acusado de impeachment, condenado e barrado do cargo depois que não for mais presidente?

Chafetz disse que isso é possível, mas levanta questões. Os juristas estão divididos sobre se isso é factível. Quando Biden tomar posse, os democratas terão uma maioria estreita no Senado, graças apenas ao voto da vice-presidente Kamala Harris. "Eles poderiam decidir realizar um julgamento, mas eles iriam querer fazer isso? Tal julgamento interromperia todas as outras votações e a agenda dos democratas", disse Chafetz, da Faculdade de Direito da Universidade Georgetown.

Mesmo depois de obter a maioria, os democratas precisariam de 16 republicanos para condenar e impedir Trump de concorrer a um cargo novamente. "Vamos ser racionais sobre isso", disse o senador democrata Joe Manchin III, na sexta-feira. "Por que fazer este exercício de novo se vai ser inútil?"

A 25ª Emenda poderia ser usada? Para que ela serve?

A 25ª Emenda, ratificada em 1967 e adotada após o assassinato do presidente John F. Kennedy em 1963, trata da sucessão presidencial. A seção 4 trata de situações em que um presidente é incapaz de fazer o trabalho, mas não se demite voluntariamente.

Os redatores da 25ª Emenda pretendiam que ela fosse aplicada quando um presidente ficasse incapacitado por uma doença física ou mental, dizem os especialistas. Alguns estudiosos argumentaram que ela poderia ser aplicado de forma mais ampla a um presidente inadequado para o cargo.

Para que a 25ª Emenda seja invocada, Pence e a maioria do Gabinete precisariam declarar que Trump é incapaz de desempenhar as funções da presidência e removê-lo. Pence assumiria nesse cenário. Trump poderia depois declarar que ele é capaz de retomar o trabalho. Se Pence e a maioria do gabinete não contestarem a determinação do republicano, Trump recupera o poder.

Se eles contestarem a declaração de Trump, a questão seria decidida pelo Congresso, mas Pence continuaria a atuar como presidente até então. Uma maioria de dois terços de ambas as Casas seria necessária para manter Trump afastado.

Mas a Câmara, controlada pelos democratas, poderia simplesmente adiar a votação da disputa substantiva até o fim do mandato de Trump, segundo Paul Campos, professor de direito constitucional da Universidade do Colorado.

Campos disse que a 25ª Emenda seria uma maneira apropriada de destituir Trump do cargo e tem a vantagem de ser mais rápida do que o impeachment. "Pence pode se tornar presidente instantaneamente, enquanto o impeachment e a condenação podem levar pelo menos alguns dias", disse Campos.

Estadão
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