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Sob Talebã, afegãs relatam sumiços e 'aprisionamento' nas próprias casas

Há relatos de ao menos duas mulheres desaparecidas após protesto exigindo direito a estudar e trabalhar.

24 jan 2022 - 18h51
(atualizado às 20h09)
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Tamana Zaryabi Paryani postou um vídeo nas redes sociais pedindo ajuda
Tamana Zaryabi Paryani postou um vídeo nas redes sociais pedindo ajuda
Foto: BBC News Brasil

Após 20 anos de conflitos violentos e mortes de dezenas de milhares de civis, o grupo fundamentalista islâmico Talebã tomou o poder no Afeganistão em 2021.

Mesmo assim, há um grupo de mulheres afegãs que se recusam a ser intimidadas.

Tamana Zaryabi Paryani é uma delas. É preciso coragem bruta para enfrentar homens armados que querem tirar quase tudo que já foi conquistado na vida.

No fim de semana passado, Tamana se juntou a dezenas de outras mulheres para exigir o direito a estudar e trabalhar. Manifestantes foram afastadas com spray de pimenta por combatentes do Talebã, e várias disseram terem sido vítimas de choques elétricos.

Muitas voltaram para a casa, mas com o temor de que estivessem sendo seguidas.

Na quarta-feira (19) à noite, homens armados entraram no bloco de apartamentos de Tamana Paryani no bairro Parwan 2, em Cabul, capital do país. Ela estava sozinha em casa com suas irmãs. Os homens começaram a chutar a porta.

"Por favor, ajudem. O Talebã veio à minha casa, minhas irmãs estão em casa", implorou Tamana em um vídeo postado nas redes sociais.

"Nós não queremos vocês aqui agora", ela gritou. "Voltem amanhã, podemos falar amanhã."

"Vocês não podem ver garotas a esta hora da noite. Socorro, o Talebã veio à minha casa", disse ela antes do vídeo terminar.

Tamana Paryani está desaparecida há dois dias. Fui ao apartamento dela para tentar localizá-la, e não havia ninguém dentro da casa. Era possível ver uma grande pegada de bota perto da porta da frente.

Vizinhos disseram que Paryani foi levada junto com duas de suas irmãs, e ninguém esteve no apartamento desde então. As pessoas ali diziam apenas que "um grupo armado" havia levado as jovens.

Mais retaliações

Desde que o grupo fundamentalista assumiu o poder no Afeganistão em 15 de agosto, mulheres reclamam que agora são prisioneiras em suas próprias casas.

Acontece que mesmo em seus lares, elas não estão seguras — embora, na cultura afegã, seja uma violação entrar em uma casa onde estão apenas mulheres.

Mas, uma vez que dispensou policiais mulheres, o Talebã não tem agentes do sexo feminino para interrogar outras mulheres.

Na noite em que Tamana Paryani sumiu, outras manifestantes também sofreram retaliações. Outra mulher, Parawana Ibrahimkhel, também está desaparecida.

Mulheres em Cabul, em foto de 27 de dezembro
Mulheres em Cabul, em foto de 27 de dezembro
Foto: EPA / BBC News Brasil

Em entrevista à BBC na quinta-feira (20), Suhai Shaheen, que espera se tornar embaixador do Talebã nas Nações Unidas, disse: "Se [o Talebã] as tivesse detido, eles diriam que as detiveram, e se essa é a acusação, eles vão para a Justiça se defender."

O representante do Talebã sugeriu que as mulheres possam estar filmando imagens falsas com o objetivo de conseguir asilo no exterior.

Uma das amigas de Paryani contou uma história diferente.

De um local seguro, em entrevista à BBC, ela disse: "Eu disse a ela que, o mais rápido possível, saísse de casa. Pedi que ela levasse isso mais a sério, avisei que estava em perigo."

"Quando cheguei em casa, uma amiga, também manifestante — de quem eu não quero mencionar o nome — estava chorando porque Tamana havia sido presa pelo Talebã e havia divulgado um vídeo nas redes sociais".

Não se sabe se as autoridades estão procurando as mulheres.

A maior parte do mundo se recusa a reconhecer o Talebã como o governante legítimos do Afeganistão. Mais da metade da população está passando fome por causa das sanções impostas pelo Ocidente.

Sob o domínio do Talebã, o Afeganistão se tornou o único país do mundo que limita publicamente a educação com base no gênero, um ponto muito sensível na busca do grupo fundamentalista por legitimidade e pelo fim das sanções. Os rotineiros protestos de mulheres sobre o tema são uma fonte de constrangimento para o grupo.

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