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Quais as evidências do suposto ataque químico na Síria e por que ele elevou a tensão no mundo

O suposto ataque com armas químicas em Douma, na Síria, criou um novo embate diplomático entre Estados Unidos e Rússia, escalando mais ainda as tensões entre as forças

11 abr 2018 - 14h43
(atualizado às 15h16)
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Organizações locais dizem que mulheres e crianças foram afetados pelo suposto ataque químico
Organizações locais dizem que mulheres e crianças foram afetados pelo suposto ataque químico
Foto: Reuters / BBC News Brasil

"A Rússia promete abater todos os mísseis direcionados à Síria. Prepare-se, Rússia, porque eles serão lançados! Vocês não deveriam se associar a um animal que usa gás para matar e sente prazer com isso."

Com esse tuíte, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou que poderá lançar ofensiva em resposta aos supostos ataques químicos que aconteceram em Douma, perto de Damasco, na Síria, no sábado. O governo de Bashar al-Assad - ele sendo o "animal" a que Trump se referiu - nega que tenha levado a cabo ataques químicos.

Os Estados Unidos, o Reino Unido e a França entraram em um acordo para trabalhar juntos e é possível que estejam se preparando para um ataque militar em resposta.

Os russos, por sua vez, tinham ameaçado responder a quaisquer investidas dos Estados Unidos.

Mas quais são as provas sobre o suposto ataque químico na Síria? E como isso elevou a tensão entre forças no mundo?

Ativistas e médicos na Síria afirmam que mais de 40 pessoas morreram no sábado, dia 7, durante o ataque registrado em Douma. A cidade, na região de Ghouta Oriental, é a última sob controle dos opositores ao presidente Bashar al-Assad. Eles garantem que as forças governamentais sírias lançaram bombas cheias de agentes químicos, mas as autoridades dizem que a acusação é falsa.

Mapa
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Foto: BBC News Brasil

1. O que aconteceu no sábado em Douma?

Ativistas do Centro de Documentação sobre Violações na Síria, organização que acompanha episódios de desrespeito ao direito internacional no país, registraram dois incidentes distintos com bombas - que possivelmente tinham substâncias tóxicas - lançadas pela Força Aérea da Síria.

O primeiro aconteceu aproximadamente às 16h (hora local) na rua Omar Ibn al Khattab, no noroeste de Douma.

O centro que documenta as violações no país citou um socorrista da Defesa Civil Síria que disse ter sentindo um odor de gás cloro no ar depois do ataque, embora não tenha conseguido determinar sua origem.

"Mais tarde descobrimos os corpos das pessoas que tinham se asfixiado com gases tóxicos. Estavam em espaços fechados, protegendo-se das bombas, o que pode ter causado sua rápida morte porque ninguém ouviu seus gritos", afirmou.

Segundo os ativistas, Douma foi submetida a um intenso bombardeio no sábado
Segundo os ativistas, Douma foi submetida a um intenso bombardeio no sábado
Foto: AFP / BBC News Brasil

O segundo ataque aconteceu perto das 19h30 na praça dos Mártires, segundo o centro de documentação

Mais de 500 pessoas, a maior parte mulheres e crianças, foram levados a centros de atenção à saúde com sintomas que indicavam que teriam sido expostas a agentes químicos, segundo a Defesa Civil da Síria e a Sociedade Médica Sírio-Americana, uma organização não governamental que apoia os hospitais.

Os pacientes tinham sinais de sofrer de "problemas respiratórios, cianose central (pele ou lábios azuis), excessiva espuma bucal, queimaduras na córnea e odor a gás cloro", segundo relataram ambas as organizações em comunicado conjunto no domingo.

Socorristas que visitaram casas na zona afetada também encontraram corpos de pessoas com sintomas similares, acrescentou o texto.

Douma é a última área controlada pela oposição em Ghouta oriental, distrito perto de Damasco, capital da Síria
Douma é a última área controlada pela oposição em Ghouta oriental, distrito perto de Damasco, capital da Síria
Foto: AFP / BBC News Brasil

A União de Organizações de Cuidado Médico e Resgate, que presta apoio aos hospitais nas áreas da Síria sob controle rebelde também informou que havia recebido relatos dos incidentes.

Depois do primeiro dos ataques, segundo as organizações, as pessoas atendidas apresentavam problemas respiratórios e irritação nos olhos. E, depois do segundo, os pacientes hospitalizados tinham forte odor de gás cloro e apresentavam sintomas como cianose, espuma bucal e irritação na córnea.

Um estudante de medicina que trabalha em um hospital disse à BBC que atendeu um paciente que morreu. "Suas pupilas estavam dilatadas e havia espuma em sua boca. Seu coração batia muito lentamente. Então tossiu e tinha sangue na boca" afirmou.

Vídeos publicados por ativistas da oposição pertencentes ao grupo Revolução Douma mostravam corpos de supostas vítimas encontradas na área afetada, algumas das quais com espuma na boca e no nariz.

2. Que provas existem de que foi um ataque químico?

Para além dos depoimentos ouvidos no local, a Organização para a Proibição de Armas Químicas anunciou na segunda-feira que enviou uma missão para investigar o que aconteceu, "recolhendo informação de todas as fontes disponíveis para determinar (nos acontecimentos de sábado) se foram utilizadas armas químicas".

Pacientes foram lavados com água nos hospitais para eliminar os restos dos supostos agentes químicos
Pacientes foram lavados com água nos hospitais para eliminar os restos dos supostos agentes químicos
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Os especialistas asseguram que simplesmente olhando um vídeo ou uma foto é impossível saber se uma pessoa foi exposta a agentes químicos. E que a única forma de confirmar a contaminação é analisando amostras em um laboratório.

Mas organizações internacionais de ajuda humanitária não têm podido entrar em Douma desde o começo de março por causa do governo sírio.

A Defesa Civil da Síria e a Sociedade Médica Sírio-Americana dizem crer que quem morreu se asfixiou como resultado de sua exposição a químicos tóxicos, provavelmente composto organofosforado, um composto feito da mistura de pesticidas e agentes nervosos.

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Foto: BBC News Brasil

A União de Organizações de Cuidado Médico e Resgate, por sua vez, concluiu que os sintomas apresentados pelas vítimas eram consistentes com a exposição a agentes nervososos, provavelmente mesclados com cloro.

O médico francês Raphael Pitti, da União de Organizações de Cuidado Médico e Resgate, disse crer que o "gás cloro foi usado para ocultar o uso do (agente tóxico) sarin".

O governo dos Estados Unidos, que apoia os opositores a al-Assad, apontou que os sintomas das vítimas parecem ser "consistentes com um agente asfixiante e com algum agente nervoso".

3. O que diz o governo da Síria?

O governo da Síria negou repetidamente que tenha usado armas químicas e acusou os rebeldes de inventarem os informes - uma "tentativa falha" de deter o governo em suas tentativas de retomar Douma.

As forças leais ao presidente Assad avançaram no fim de semana em direção a Douma, onde supostamente houve ataque com armas químicas
As forças leais ao presidente Assad avançaram no fim de semana em direção a Douma, onde supostamente houve ataque com armas químicas
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

"Cada vez que o Exército da Síria avança em sua luta contra o terrorismo, surge uma denúncia do uso de armas químicas", disse uma fonte do Ministério de Relações Exteriores da Síria à agência local de notícias Sana.

O governo russo, aliado de al-Assad, disse que os informes de Douma eram "falsos".

Vassily Nebenzia, representante permanente de Moscou na ONU, afirmou na segunda-feira que especialistas das Forças Armadas da Rússia visitaram Douma e "confirmaram que não encontraram substâncias químicas na terra, nem cadáveres, nem pessoas envenenadas nos hospitais".

"Os médicos em Douma negam que tenha chegado gente nos hospitais dizendo ter sofrido um ataque químico", acrescentou.

Nebenzia disse que os especialistas da Organização para a Proibição de Armas Químicas deveriam viajar imediatamente à Síria e "ver por eles mesmos o que aconteceu".

4. Como tudo isso elevou a tensão no mundo?

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que criticou duramente o suposto ataque químico, anunciou na segunda que prepararia forte resposta, enquanto seu representante na ONU, Nikki Haley, advogou no Conselho de Segurança por um projeto de resolução que determine a investigação do ocorrido.

Sua decisão sugere que a resposta americana pode envolver uma ação militar maior. Na quarta-feira, o Secretário de Defesa americano James Mattis disse que os Estados Unidos estavam avaliando o ataque químico e que o Exército americano estava pronto para dar "opções militares se forem apropriadas segundo uma decisão do presidente".

O presidente da França Emmanuel Macron disse que qualquer ataque não "miraria aliados do regime (sírio), mas miraria as capacidades químicas do regime".

Um destruídor de mísseis americano, o USS Donald Cook, está no mar Mediterrâneo. Há relatos de que a Rússia retirou navios de batalha da cidade portuária Tartus.

Na terça, o Conselho de Segurança da ONU não conseguiu aprovar medidas para estabelecer uma investigação no ataque a Douma. Como membros permanentes do conselho, Rússia e Estados Unidos vetaram propostas de investigações independentes.

E, nesta quarta, por meio do Twitter, Trump mandou a Rússia "se preparar" porque mísseis seriam lançados. "Nossa relação com a Rússia está pior agora do que nunca antes, e isso inclui a Guerra Fria", afirmou.

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