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Por que bombardeiros russos estão aterrissando na Venezuela

Envio de aeronaves com capacidade para transportar armas nucleares faz parte da estratégia de fortalecimento da aliança econômica-militar entre os dois países.

12 dez 2018 - 12h18
(atualizado às 13h00)
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O ministro da defesa venezuelano, Vladimir Padrino (segundo à esquerda) dá boas-vindas às aeronaves russas
O ministro da defesa venezuelano, Vladimir Padrino (segundo à esquerda) dá boas-vindas às aeronaves russas
Foto: AFP / BBC News Brasil

A força aérea russa aterrissou nesta semana na Venezuela.

Quatro aeronaves - incluindo dois bombardeiros Tupolev 160 (Tu-160), com capacidade para transportar armas nucleares - pousaram na segunda-feira no Aeroporto Internacional de Maiquetía Simón Bolívar, nos arredores de Caracas - em uma demonstração de apoio da Rússia ao governo do presidente Nicolás Maduro.

O ministro da Defesa venezuelano, Vladimir Padrino, participou de um evento de boas-vindas às aeronaves e afirmou que elas fazem parte de exercícios de cooperação militar entre os dois países.

"Estamos nos preparando para defender a Venezuela até o último momento caso seja necessário."

"Vamos fazer isso com nossos amigos porque temos amigos no mundo que defendem relações respeitosas e de equilíbrio", completou.

No domingo, Maduro afirmou que havia uma tentativa "coordenada diretamente pela Casa Branca de perturbar a vida democrática na Venezuela e tentar dar um golpe de Estado contra o governo constitucional, democrático e livre do país" em andamento.

Padrino explicou que os aviões russos são "logísticos e bombardeiros" e acrescentou que ninguém deve se preocupar com a presença das aeronaves no país.

"Somos construtores da paz, não da guerra", declarou.

Os bombardeiros Tupolev 160 têm capacidade para transportar armas nucleares
Os bombardeiros Tupolev 160 têm capacidade para transportar armas nucleares
Foto: AFP / BBC News Brasil

O embaixador da Rússia na Venezuela, Vladimir Zaemskiy, disse, por sua vez, que uma das áreas de cooperação entre os dois países é militar-técnica - e, segundo ele, "se desenvolveu de forma muito frutífera nos últimos anos".

Aliança Maduro-Putin

Um exercício militar conjunto foi anunciado poucos dias depois do encontro de Maduro com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, em Moscou. A reunião resultou na assinatura de contratos da ordem de US$ 6 bilhões em investimentos russos nas áreas de mineração e petróleo na Venezuela.

Os dois países são aliados próximos de longa data. E o governo de Maduro, pressionado pelas sanções impostas pelos Estados Unidos e pela União Europeia contra o que consideram violações de direitos humanos na Venezuela, quer reforçar esses laços - incluída, aí, a frente militar.

O embaixador da Rússia lembrou que a cooperação na área de defesa começou em 2005, quando Hugo Chávez era presidente.

Mas o plano de ambos os governos agora é aprofundar essa relação.

Encontro de Maduro e Putin resultou na assinatura de contratos da ordem de US$ 6 bilhões em investimentos russos nas áreas de mineração e petróleo
Encontro de Maduro e Putin resultou na assinatura de contratos da ordem de US$ 6 bilhões em investimentos russos nas áreas de mineração e petróleo
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O ministro Padrino contou que Caracas aguarda a chegada de uma delegação russa com a qual devem discutir formas de fortalecer o arsenal das Forças Armadas venezuelanas - embora a difícil situação dos cofres públicos do país sul-americano, que vive a maior recessão de sua história, seja um obstáculo para a aquisição de armamentos mais sofisticados.

Em meio à grave crise econômica, política e social que a Venezuela atravessa, especialistas ouvidos pela BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, acreditam que a presença militar russa pode ter o objetivo de "desencorajar" terceiros a realizar "algum tipo de intervenção militar" no país.

Mas, além de beneficiar a Venezuela, essa aliança também é considerada vital para o governo Putin, de acordo com os analistas.

A anexação russa da Crimeia em 2014 foi duramente condenada por países ocidentais, gerando uma onda de sanções econômicas contra o país que continuam sendo renovadas.

A partir daquele momento, as relações entre a Rússia e os EUA e a União Europeia se deterioraram drasticamente. E é nesse contexto que a Venezuela ganha uma importância especial.

"(Moscou) está procurando países que ainda querem se relacionar com eles, e isso inclui a Venezuela", destaca Steven Pifer, ex-embaixador dos EUA na Ucrânia e pesquisador do centro de análises Brookings Institution.

"O que o Kremlin quer é passar a imagem de uma Rússia que não está isolada, quando na verdade está."

Ajudar econômica e militarmente a Venezuela - um dos poucos países que apoiaram a ação russa na Crimeia - serve para sustentar que "a Rússia tem conexões ao redor do mundo".

O editor do serviço russo da BBC, Famil Ismailov, concorda e destaca outra vantagem para Putin ao apoiar Caracas: a imagem que pode vender dentro do país.

"É muito importante mostrar ao público interno que, apesar das sanções, a Rússia cumpre seu papel de superpotência e tem países amigos. Vale a pena pagar por isso", explica Ismailov, fazendo referência a Putin.

Uma 'provocação' aos EUA

O envio das aeronaves para a Venezuela também serviria como um recado aos EUA, de acordo com especialistas.

O governo russo criticou em diversas ocasiões a "interferência" dos EUA na Ucrânia e o envio de tropas americanas para o Mar Negro e o Báltico, como parte das operações da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

E mandar os bombardeiros para a Venezuela pode ser uma resposta, uma maneira de "colocar o dedo na ferida" dos EUA.

"Parte da razão (para o envio dos bombardeiros) é treinar pilotos russos em voos de longa distância, outra parte é destinada simplesmente a irritar os Estados Unidos", afirma o ex-embaixador na Ucrânia.

As autoridades americanas fizeram, por sua vez, críticas duras ao envio dos aviões.

"A Rússia envia bombardeiros para a Venezuela e nós, um navio-hospital", afirmou o coronel Robert Manning, porta-voz do Departamento de Defesa dos EUA.

Em entrevista coletiva no Pentágono, Manning se referiu ao USNS Comfort, que partiu em meados de outubro rumo à América Central e à América do Sul com a missão de oferecer ajuda humanitária aos refugiados venezuelanos.

"O mais importante é que estamos ao lado do povo da Venezuela em um momento de necessidade", acrescentou.

O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, afirmou que se trata de "dois governos corruptos esbanjando recursos públicos".

https://twitter.com/SecPompeo/status/1072324063551463424

O governo russo classificou a declaração como "completamente inapropriada" e "pouco diplomática".

Mas a Rússia não é a única a enviar jatos militares para outros países. Os EUA também mandaram aviões para seus aliados, incluindo a Ucrânia, cujas relações com Moscou permanecem tensas após a anexação da Crimeia.

Tu-160

Confira abaixo as principais características dos bombardeiros Tupolev 160:

Os bombardeiros Tupolev 160 são conhecidos como 'cisnes brancos' na Rússia
Os bombardeiros Tupolev 160 são conhecidos como 'cisnes brancos' na Rússia
Foto: AFP/Getty Images / BBC News Brasil

Conhecidos como Cisnes Brancos na Rússia, são aviões do tipo "swing-wing (de geometria variável)", com velocidade máxima duas vezes maior que a do som. A frota foi lançada em 1981, e modernizada em 2000. O alcance de voo é de cerca de 12 mil quilômetros e os aviões têm capacidade para transportar armamentos nucleares.

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