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"Inadmissível o que aconteceu", diz jovem agredida na França

Estudante agredida por assediador na rua em Paris diz que legislação criada pelo governo de Emmanuel Macron tende a ser ineficiente

3 ago 2018 - 09h14
(atualizado às 09h27)
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Aos 22 anos, a estudante francesa

Agressor bateu no rosto de Marie Laguerre diante de várias pessoas que estavam em café próximo
Agressor bateu no rosto de Marie Laguerre diante de várias pessoas que estavam em café próximo
Foto: Marie Laguerre / Facebook / Estadão Conteúdo

se tornou de forma involuntária um fenômeno nas redes sociais ao divulgar um vídeo que registrou a agressão física cometida por um homem que a assediara em uma rua movimentada. As imagens de circuito de vigilância mostram o momento em que a jovem leva um forte tapa no rosto que quase a derruba quando passava por um restaurante no trajeto de sua casa. O agressor, que a havia assediado com palavras e sons grosseiros, e ouviu como resposta um "Cale a boca", é procurado pela polícia.

Com a repercussão da agressão, Marie decidiu organizar um site, Nous Toutes Harcèlement (noustoutesharcelement.fr), no qual pretende recolher testemunhos de assédio de rua, no trabalho e na esfera privada, com o objetivo de reforçar a tomada de consciência contra a violência verbal e física sofrida pelas mulheres. Em entrevista ao "Estado", a jovem fala sobre a repercussão do vídeo e opina sobre a nova legislação criada pelo governo de Emmanuel Macron contra o assédio de rua.

Você foi alvo de uma agressão por reagir ao assédio de rua. O que a motivou na decisão de publicar o vídeo? Como foi a repercussão?

Na verdade quando postei o vídeo não esperava que ganhasse essa amplitude. Foi uma surpresa. Um jornalista me contatou, depois um segundo, um terceiro… Mas o combate contra a violência e o assédio de rua é um combate que eu conheço, que eu travo todos os dias junto às pessoas ao meu redor. Sobre a repercussão, eu não vejo a TV. As mensagens privadas muitas vezes foram muito agressivas. E evitei os comentários em redes sociais para me proteger. Vi apenas alguns, e muitos são horríveis. Mas, em termos de proporção, as mensagens de apoio foram muito mais numerosas.

Com a repercussão, você decidiu criar um site de internet para recolher testemunhos de outras mulheres vítimas de assédio e de agressões. Por quê?

Após o vídeo, houve um enorme repercussão sobre minha agressão. Tive a oportunidade de tomar a palavra em muitos veículos de mídia, e isso me deu outra oportunidade, a de reunir uma equipe de feministas que compartilha os mesmos valores que eu. Como não queria que essa atenção e a reação das pessoas acabasse de um dia para o outro, tentamos fazer alguma coisa para tornar seus efeitos perenes, gerar mudança de comportamento. Então decidimos criar o site para recolher testemunhos. Recebi muitas mensagens de mulheres. Todas nós temos histórias parecidas a contar. O site vai dar voz às mulheres, que podem falar de forma anônima. Também teremos uma página no Facebook para ampliar a repercussão. É preciso continuar a dizer basta a essa violência. O que aconteceu comigo é inadmissível. Se nos mobilizar, talvez possamos mudar algo.

Que tipo de reações você constatou?

No site em poucas horas recebemos mais de 400 mensagens, que ainda nem consegui ler. Já as mensagens privadas que recebi foram enviadas por mulheres que foram agredidas e ainda sentem as sequelas. São casos de assédios e violência cotidianos. Recebi um testemunho de uma mulher que fez queixa à polícia contra seu marido violento, e nada aconteceu. Como isso pode acontecer? Algumas mensagens me chocaram. Uma delas me disse que foi alvo de assédio de um de seus amigos, e quando prestou queixa foi recriminada por seu grupo de amigos, que se afastaram dela. Ou seja, sua palavra não foi levada em conta, mesmo que fosse a vítima. É absurdo. Tenho uma amiga brasileira que me contou três dias atrás o estupro que sofreu. Sei que no Brasil o problema da violência sexual e do assédio de rua também existe, e que é preciso enfrentá-lo.

A Assembleia Nacional aprovou uma lei que cria multas para o assédio de rua. Qual sua opinião a respeito?

A lei que foi votada tem coisas positivas, mas não é suficiente, e talvez seja até um fracasso. Que o ultraje sexista deixe de ser um delito e passe a ser alvo de uma multa me parece errado. Para que fosse efetiva seria necessário que houvesse forças de ordem em todas as esquinas, o que não é realista. E mesmo que os policiais estivessem em todos os lugares, seria necessário que fossem sensibilizados ao assédio de rua, o que não é o caso. A meu ver, é necessário fazer evoluir as mentalidades por meio da educação. Precisamos formar os cidadãos, as forças de ordem, o corpo judiciário, o corpo médico, e todos os profissionais em torno de um caso de assédio.

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