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Mundo

Massacre evidencia gravidade do conflito agrário no Paraguai

18 jun 2012 - 18h24
(atualizado às 18h47)
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A morte de seis policiais e de onze camponeses durante um desalojamento de trabalhadores sem-terra de uma fazenda na sexta-feira em Curuguaty, 250 km a nordeste de Assunção, revela uma antiga disputa pela propriedade da terra no Paraguai, país marcado pela desigualdade social. "O Paraguai está sentado em um barril de pólvora. Teve que acontecer esta tragédia para que as autoridades voltassem a olhar com seriedade as exigências camponesas", disse à AFP Corsino Coronel, líder dos sem-terra.

Corpo de fazendeiro morto no confronto em Curuguaty, uma reserva florestal no norte do Paraguai
Corpo de fazendeiro morto no confronto em Curuguaty, uma reserva florestal no norte do Paraguai
Foto: AP

Sobrevivente da repressão da ditadura do general Alfredo Stroessner (1954/89), assim como seu irmão Constantino - ambos listados na época como líderes subversivos -, Coronel considerou que o massacre pode ter sido causado por infiltrados nos grupos de agricultores. "Os camponeses são pacíficos por natureza. Sua ingenuidade pela falta de educação e a miséria em que vivem os torna presa da manipulação tanto por parte dos poderosos como pelos extremistas", explicou à AFP.

As autoridades não descartam que o massacre possa ter sido causado por guerrilheiros do chamado Exército do Povo Paraguaio (EPP) infiltrados entre os camponeses, e que podem ter fugido na confusão depois de terem assassinado seis policiais. A reação de alguns membros das forças de segurança que estavam na retaguarda causou a morte de pelo menos 11 camponeses.

"Antes das eleições, os políticos usam os pobres camponeses e conseguem seu apoio. Quando não há eleições, são usados pelos radicais com falsas promessas. A miséria em que vivem os torna muito manipuláveis", disse Coronel.

A invasão da propriedade foi apoiada pela chamada Liga de Carperos (que vivem em barracas, carpas em espanhol), organização de camponeses sem-terra que tem vínculos com assessores do presidente Fernando Lugo.

Rafael Filizzola, ex-ministro do Interior (2008/2011), que hoje faz parte da oposição ao governo, identificou dois dos homens mais próximos ao presidente Fernando Lugo como os padrinhos dos "carperos". Citou o senador Sixto Pereira e o governador do Departamento de San Pedro, José Ledesma. Ambos fazem parte da base de apoio de Lugo.

"Esse grupo faz parte da Liga de Carperos e, como todos sabem, seus líderes visitam habitualmente o Palácio do Governo", disse Filizzola à AFP. "Com o objetivo de capitalizar votos, o que estão fazendo é enganar muitas famílias camponesas empobrecidas, gente que os segue com a ilusão de ter um pedaço de terra", frisou.

Os "carperos" são os mesmos que protagonizaram ocupações entre novembro e março passados em plantações de soja do Alto Paraná, grandes extensões de propriedade dos chamados "brasiguaios", ricos agricultores brasileiros instalados na região mais fértil do Paraguai há 40 anos.

No Paraguai, muitas pessoas conseguiram terras do Estado de forma irregular, afirma Marciano Barreto, ex-diretor do Instituto Nacional de Desenvolvimento Rural e da Terra (Indert). Barreto afirma que instituições do Estado, como o Indert, junto com outras instituições, particulares ligados a governos anteriores, ex-militares e policiais influentes, distribuíram entre si as terras do Estado.

Milhares de hectares foram vendidos na rica região da tríplice fronteira com Argentina e Brasil aos "brasiguaios" após a queda do general Stroessner. A Procuradoria Geral da República apresentou ações judiciais contra cerca de cem pessoas e empresas que têm em seu poder terras que são propriedade do Indert. Analisa outros 300 casos que podem ser apresentados à justiça, revelou à AFP o procurador Enrique García.

García disse que desde a época de Stroessner cerca de 10 milhões de hectares passaram ilegalmente para o domínio de particulares. Segundo dados da Cepal (2011), a pobreza no Paraguai atinge 53% de sua população de quase 7.000.000 habitantes, dos quais 30% estão abaixo da linha da pobreza. A Direção de Estatísticas e Censos (governamental) situa esta pobreza extrema em pouco mais de 19%.

AFP Todos os direitos de reprodução e representação reservados. 
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