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Madagascar: entenda por que a queda do presidente não é vista como golpe militar

Após a destituição do presidente de Madagascar, Andry Rajoelina, na terça-feira (14), a Alta Corte Constitucional do país convidou o coronel Michael Randrianirina a exercer as funções de chefe de Estado. A iniciativa marca o retorno dos militares ao poder — o que não é novidade no país. O exército ocupa um papel primordial na vida pública e na resolução de conflitos desde a independência da ilha, em 1960, explicou à RFI Josie Dominique, professora da Universidade de Antsiranana, e pesquisadora associada ao Instituto dos Mundos Africanos em Paris.

15 out 2025 - 10h15
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Após a destituição do presidente de Madagascar, Andry Rajoelina, na terça-feira (14), a Alta Corte Constitucional do país convidou o coronel Michael Randrianirina a exercer as funções de chefe de Estado. A iniciativa marca o retorno dos militares ao poder — o que não é novidade no país. O exército ocupa um papel primordial na vida pública e na resolução de conflitos desde a independência da ilha, em 1960, explicou à RFI Josie Dominique, professora da Universidade de Antsiranana, e pesquisadora associada ao Instituto dos Mundos Africanos em Paris. 

O cenário se repete em Madagascar: os militares assumiram o poder e decretaram o fim da presidência do contestado Andry Rajoelina, que chegou ao cargo em 2009 por meio de um golpe de Estado em circunstâncias semelhantes. A unidade militar que se juntou ao forte movimento de contestação na ilha fez o anúncio logo após a votação da Assembleia Nacional que destituiu o chefe de Estado.

"O exército de Madagascar tem, de certa forma, uma tradição bem estabelecida de intervenção na vida política do país, atuando frequentemente como um agente-chave — até mesmo como árbitro — durante grandes crises", disse à RFI a professora e pesquisadora Josie Dominique. 

Madagascar se tornou independente da França em 26 de junho de 1960, após um processo de negociações iniciado na década de 1950. A participação política das forças armadas tem início em 1972, levando-as ao centro das disputas pelo poder na ilha. 

"As crises sucessivas em 1972, 1991, 2002 e 2009 demonstraram essa constante interação entre forças civis e militares na luta pelo poder. Aliás, é comum que um militar seja nomeado ministro — e não necessariamente ministro das Forças Armadas ou da Defesa. Já houve membros do exército nos ministérios do Meio Ambiente e até como chefes de região", salienta. 

População comemora destituição

Cenas de celebração foram registradas no país após o anúncio das Forças Armadas. Bandeiras malgaxes e músicas festivas tomaram conta da simbólica Praça 13 de Maio, na capital Antananarivo. A decisão foi confirmada pela Alta Corte Constitucional, que classificou o cargo de presidente como "livre", convidando o coronel Randrianirina a assumir a função. 

O apoio popular aos militares não é algo surpreendente, avalia Josie Dominique. "A cada vez, o exército soube se apresentar como o salvador, como o último bastião diante do caos", diz. "No sábado, os soldados intervieram para pôr fim às violências", reitera, lembrando que o próprio coronel Randrianirina havia estabelecido um ultimato ao governo à repressão da mobilização de jovens da geração Z. 

Os protestos, liderados pelo movimento estudantil, começaram em 25 de setembro devido aos cortes de água e energia elétrica em Madagascar. Aos poucos, passaram a incluir denúncias contra a corrupção, os políticos e a falta de oportunidades no país. Ao menos 22 pessoas morreram nos confrontos com a polícia.

Tentativa de golpe de Estado?

Contestado nas ruas e refugiado em local desconhecido, Rajoelina, que havia dissolvido a Assembleia malgaxe na terça-feira, denunciou a votação que o destituiu como uma "reunião desprovida de qualquer base legal". Para ele, essa foi uma "tentativa de golpe de Estado" por parte dos militares.

No entanto, a professora da Universidade de Antsiranana contesta a acusação: "O Exército vem do povo. As esposas dos militares vivem na sociedade, os próprios militares também. Eles fazem parte da sociedade. Sentem a falta de água e de eletricidade como todo mundo. Por isso, as reivindicações estão próximas dos militares", avalia. 

Por outro lado, a especialista aponta que a insatisfação dos militares com a perda de protagonismo no governo de Rajoelina pode ter contribuído com a decisão de intervir, principalmente após a criação de uma ministério dedicado à polícia. "Isso fez com que o Exército pudesse, em algum momento, se sentir frustrado com o espaço que os policiais ocuparam na arena política e na área de segurança do país", observa.

No entanto, são poucas as chances de que as Forças Armadas ocupem a cúpula do poder de forma permanente. O coronel Randrianirina anunciou na terça-feira que pretende nomear em breve um novo primeiro-ministro, que será responsável por formar um governo civil. Além disso, ele prevê a realização de eleições em um prazo de 18 a 24 meses.

Onde está Rajoelina?

Exfiltrado por um avião militar francês no domingo (12), Rajoelina foi nomeado presidente de transição pelos militares após um levante popular em 2009. Após se afastar em 2014, foi eleito presidente em 2018 e reeleito em 2023 para um mandato de cinco anos, em uma eleição boicotada pela oposição. "O presidente continua plenamente no exercício de suas funções", assegurou, sem revelar seu paradeiro.

Inicialmente, Rajoelina teria sido levado de helicóptero até a ilha Sainte-Marie, na costa leste de Madagascar. Em seguida, ele teria embarcado em um avião militar com destino à ilha da Reunião, no oceano Índico, segundo informações do canal France 24. Há suspeitas de que ele teria se escondido em Dubai com a família.

Enquanto o mistério sobre o paradeiro de Rajoelina continua, os participantes do movimento Gen Z celebram o que consideram uma "vitória" para a juventude de Madagascar. "Estou realmente muito feliz. Agora somos livres!", comemora a contadora Jouannah Rasoarimanana, de 24 anos.

Como tem acontecido com frequência desde 25 de setembro, milhares de manifestantes voltaram às ruas de Antananarivo na terça-feira. Jovens mobilizados pelo coletivo Gen Z foram acompanhados por funcionários públicos convocados por diversos sindicatos, além de manifestantes de todas as faixas etárias.

"Há muito tempo não havia uma contestação tão ampla, e as redes sociais a tornaram muito visível", diz Josie Dominique. "A mobilização é historicamente ampla porque vimos manifestações em em várias províncias e regiões de Madagascar. E isso já faz duas semanas. É realmente algo novo, que transforma essa demanda, essa contestação, em um movimento nacional — e não apenas na capital Antananarivo", conclui. 

RFI A RFI é uma rádio francesa e agência de notícias que transmite para o mundo todo em francês e em outros 15 idiomas.
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