Após 2 semanas de protestos, primeiro-ministro do Líbano renuncia ao cargo
Protestos começaram contra projeto de taxar chamadas feitas por meio do aplicativo WhatsApp, mas depois se ampliaram e passaram a focar corrupção política e crise econômica.
O texto foi atualizado às 12h03 desta terça-feira (29).
Alvo de manifestações de rua há duas semanas, o primeiro-ministro do Líbano, Saad Hariri, anunciou sua renúncia nesta terça-feira (29).
Ele afirmou que o país chegou a um impasse e precisava de um choque para ultrapassar a crise. A renúncia dele e de seu governo será apresentada ao presidente do país.
Os protestos que mobilizaram centenas de milhares de manifestantes começaram contra os planos — agora abandonados — de taxar chamadas feitas por meio do aplicativo WhatsApp. Mas a pauta de reivindicações logo se ampliou e passou a focar corrupção política endêmica, crise econômica e problemas em serviços públicos.
As manifestações em massa paralisaram parte do país, com o fechamento de bancos por dez dias, além de empresas, escolas e universidades.
O Líbano tem um dos mais altos níveis de endividamento do mundo.
O país tem cerca de 6 milhões de habitantes, quase metade do número de libaneses e descendentes que vivem no Brasil (cerca de 12 milhões).
Reação violenta aos protestos
O grupo xiita militante Hezbollah, que dominou o governo de coalizão do primeiro-ministro Hariri, havia decidido recentemente endurecer sua posição contra os protestos.
Homens vestidos de preto leais ao Hezbollah e outro grupo xiita, Amal, destruíram um acampamento de manifestantes no centro de Beirute, cantando slogans, incendiando barracas e espancando manifestantes contrários ao governo.
Um bloqueio montado por manifestantes também foi atacado pelos dois grupos.
A polícia e as tropas de choque tentaram separar os grupos rivais, disparando gás lacrimogêneo.
O Hezbollah havia se posicionado contra a renúncia de Hariri, sob o argumento de que a saída dele poderia resultar em um vazio no governo libanês.
O líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, sugeriu que os protestos são financiados por potências estrangeiras e na última sexta-feira (25) disse que "alguém está tentando puxar (o Líbano)... para uma guerra civil".
O governo de coalizão, incluindo o Hezbollah, havia concordado anteriormente com um plano de reformas para tentar acalmar os manifestantes e esvaziar os atos, mas os protestos continuaram.
Para Martin Patience, correspondente da BBC para o Oriente Médio, baseado em Beirute, a queda de Hariri deve acender um alerta no Ocidente, que considera o Líbano uma ilha de relativa estabilidade em um turbulento Oriente Médio.
Um acordo de poder compartilhado, que encerrou a guerra civil do país há 30 anos, manteve a paz, mas não conseguiu deter a derrocada econômica.
Como o Líbano ficou tão endividado?
Com um endividamento de 152% em relação ao PIB (soma de todas as riquezas produzidas) do país, o Líbano é o terceiro país mais endividado do mundo, atrás de Japão e Grécia.
O principal fator é o custo elevado da reconstrução do país depois da guerra civil. Setores como transporte público e energia precisavam de investimentos urgentes.
Em meio a racionamentos no país, habitantes passaram a adotar geradores para contornar os constantes blecautes.
O setor de petróleo e gás é promissor no ponto de vista econômico, mas ainda está longe de trazer os resultados esperados.
A guerra civil na Síria também agravou a situação econômica do Líbano. Quase 1,5 milhão de refugiados chegaram ao país, o que representa um aumento de mais de 30% da população local.
O Líbano também depende bastante dos recursos enviados ao país por cidadãos que emigraram durante a guerra civil. Os trabalhadores libaneses expatriados, principalmente no Golfo, contribuíam com quase um quinto do PIB nacional.