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Moro vai propor acelerar cumprimento de penas

Pacote de ministro prevê possibilidade de acordo em que acusado receberia perdão de até metade da punição proposta pelo MP em crimes graves

30 jan 2019 - 05h10
(atualizado às 08h42)
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O pacote de medidas que o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, vai apresentar ao Congresso incluirá a ampliação da possibilidade de acordo em que o acusado pode ter perdão de até metade da pena proposta pelo Ministério Público. A ideia do ex-juiz da Lava Jato é ampliar no País o chamado plea bargain, modalidade em que o acusado opta por um acordo em vez de responder a um processo. O objetivo da medida é desafogar a Justiça criminal.

Atualmente, a legislação brasileira permite a dispensa do processo penal por meio da utilização do acordo para crimes de menor potencial ofensivo - com penas de até dois anos em caso de condenação. A ideia de Moro é expandir esta possibilidade para outros crimes, incluindo corrupção.

A definição da punição no acordo se dá com base na pena solicitada pelo Ministério Público na denúncia criminal. Um juiz, porém, terá de homologar o acordo. Na prática, a medida pode acelerar o cumprimento imediato da pena dispensando recursos intermináveis que, no entendimento do ministro, resultam em impunidade.

O ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro
O ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro
Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

Nos Estados Unidos, 95% dos casos são resolvidos antes de serem levados a julgamento com a utilização do plea bargain. O sistema, porém, gera questionamento sobre condenação de inocentes.

O Estado apurou que o benefício ao interessado no acordo penal poderá ser o de começar o cumprimento da pena em regime mais brando ou trocar a prisão por pena restritiva de direitos. Os benefícios irão depender, segundo o texto que está sendo produzido pela equipe de Moro, da gravidade do crime, circunstâncias e do quanto o acusado colaborar para resolver o caso de forma rápida.

Quando os acusados forem reincidentes, a proposta deve prever a necessidade de uma parte da pena ser cumprida em regime fechado. Além da pena, o texto deverá incluir também a previsão do destino de eventuais produtos obtidos por meio do crime e, no caso de vítima, um valor mínimo para reparação.

Homologação

A exemplo de colaborações premiadas, caberá a um juiz homologar o acordo, avaliando as condições, entre elas se foi espontânea e se obedeceu aos requisitos legais. A equipe de Moro quer deixar claro no texto a impossibilidade de acordo em caso de a pena proposta pelo Ministério Público ser considerada desproporcional à infração ou se o juiz considerar que há provas insuficientes para uma condenação criminal.

A Associação dos Juízes Federais (Ajufe), da qual Moro fez parte até abandonar a magistratura, se diz favorável à proposta de plea bargain, mas defende o estabelecimento de medidas de controles em relação ao modo como a negociação do acordo será feita. O objetivo, segundo o presidente da Ajufe, Fernando Marcelo Mendes, é evitar pontos polêmicos do modelo americano, entre eles, a concentração de poder no Ministério Público, responsável por negociar a transação penal.

Segundo Mendes, a associação irá produzir nota técnica sobre o tema a ser enviada a Moro. "Não somos contrários, ele (o plea bargain) é compatível com nosso modelo, mas para evitar críticas que vêm do modelo americano vamos sugerir que a negociação do acordo seja feito em audiência conduzida pelo juiz do caso."

Nesse formato defendido pela Ajufe, as partes interessadas comunicariam ao juiz do caso à disposição de negociar e, então, seria designada uma audiência para realização do acordo.

O Ministério Público Federal também já se manifestou favoravelmente à ampliação do plea bargain. A Secretaria de Relações Institucionais da Procuradoria-Geral da República e a Câmara Criminal do MPF entregaram nota técnica há duas semanas ao ministro na qual defendem o modelo e sugerem alguns pontos, como a criação, pelo Executivo, de centrais para acompanhar o cumprimento dos acordos.

Embora tenha o endosso de juízes e procuradores, a ideia de Moro de ampliar o sistema é considerada polêmica na comunidade jurídica. Advogados veem com cautela a possibilidade de adotar o sistema americano no País.

"É um instrumento usado em uma cultura jurídica muito distinta, cuja adaptação ao nosso sistema constitucional e processual é complexa, agravada pelo fato de que há uma forte ideologia punitivista na realidade judiciária brasileira. Há risco de, na prática, gerar injustiças, para um lado e para outro", afirma o criminalista Rogério Taffarello, do escritório Mattos Filho. "Embora eu não ache que a ideia deva ser descartada, o que não se pode é promover uma mudança tão radical sem um debate profundo."

Para o advogado Maurício Leite, do escritório Leite Sinigallia e Forzenigo, um dos problemas do modelo americano é discricionariedade conferida ao MP para arbitrar a pena. "A mera importação do instituto pode gerar enormes problemas no sistema penal brasileiro, principalmente se for afastada a necessidade de participação do juiz no arbitramento da redução da pena."

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