A cultura do ta’arof

Vendedor e comprador negociam aderindo às regras do Ta'arof

Uma das tradições mais distintas e pouco conhecidas da cultura iraniana – e causa de grande confusão e constrangimento entre estrangeiros – atende pelo nome de ta'arof (lê-se “tarúf”). Baseada nas tradições da época das cortes persas e da vassalagem, o hábito consiste em se insistir na realização de atitudes generosas inúmeras vezes por uma das partes, enquanto a outra parte recusa repetidamente a oferta.

O processo todo é uma negociação disfarçada por atitudes bem-educadas, que têm por objetivo permitir uma interação cordial entre as pessoas e determinar seu status social. O ta'arof é comum no momento de realizar compras em pequenas lojas. Ao se dirigir ao caixa para pagar pelos itens, muitas vezes o vendedor recusa o pagamento argumentando que a presença do cliente em seu estabelecimento é motivo de orgulho e honra. Caso o estrangeiro desavisado tome as palavras do vendedor de forma literal e saia sem pagar, verá uma cara de completo espanto no lojista.

As normas de boa etiqueta social determinam que o ritual de oferta e recusa se repita por pelo menos três vezes. O esperado nos casos acima seria que o cliente oferecesse o pagamento pela sua compra, até que o vendedor finalmente aceitasse o dinheiro ou iniciasse uma negociação pelo preço da mercadoria.

Outro uso bastante comum do ta'arof é o convite para almoços, visitas ou jantares. A ideia por trás da oferta é que a pessoa pareça educada e generosa sem precisar se comprometer com algo que não deseja ou não tem condições de oferecer.

O ta'arof permeia a vida dos iranianos e acaba levando a longos processos de oferta e recusa até para coisas simples como a oferta de um doce ou uma carona. O hábito muitas vezes chamado de falso ta'arof é uma das características dominantes dos meandros sociais iranianos.

Apesar de ainda muito utilizado, é cada vez mais comum no país escutar jovens do país dizerem uns aos outros que não estão dizendo algo simplesmente devido ao ta'arof. A expressão “pare com o ta'arof” é cada vez mais comumente escutada pelas ruas do país.

Muitos iranianos têm ciência da peculiaridade e da diferença que o ta'arof representa para estrangeiros e simplesmente não utilizam o costume ou se sentem menos surpreendidos com atitudes mais diretas. Para evitar confusões, alguns iranianos já avisam que não vão realizar o ta'arof aos conhecidos ou colegas estrangeiros.

Segundo Mujtab Afshari, o sociólogo pela Universidade de Teerã, o ta'arof pode ser uma das causas da impressão negativa que os governos ocidentais têm do governo iraniano. “Os governos do ocidente acusam o regime de ser pouco confiável e não cumprir suas promessas, mas tenho uma certa sensação que parte dos compromissos e acertos diplomáticos assumidos a portas fechadas pelo regime iraniano não passam de uma mal sucedida realização de ta'arof. Um pouco mais de sensibilidade de ambos os lados talvez melhorasse o relacionamento entre o Irã e o resto do mundo”, explica o intelectual.