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Governo escala expert para ajudar a elaborar normas para o setor de armas e evitar novos reveses

O coronel da reserva Valdir Campoi Junior, instrutor de armamento e tiro, foi nomeado como assessor na Secretaria-Geral da Presidência para revisar atos que se referem a colecionadores, atiradores e caçadores

29 jul 2020 - 20h23
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BRASÍLIA - Após acumular 12 questionamentos na Justiça em torno de normas que editou envolvendo armas e munições, o governo decidiu contratar um expert no assunto para evitar novos reveses. O coronel da reserva Valdir Campoi Junior, instrutor de armamento e tiro credenciado pela Polícia Federal com quase 30 anos de experiência, foi nomeado em 27 de maio como assessor na Secretaria-Geral da Presidência. Considerado por militares e atiradores uma autoridade no assunto por sua atuação dentro e fora no quartel, ele vai auxiliar o ministro Jorge Oliveira nessa área.

No Palácio do Planalto, caberá a Campoi a tarefa de avançar nas pautas de flexibilização de armas e munições. Segundo a Secretaria-Geral, as principais funções dele são "revisar os atos normativos, especialmente aqueles referentes à posse e porte de armas de fogo pelos cidadãos, e revisar as normas referentes aos CACs" (sigla do grupo que reúne colecionadores de armas, atiradores desportivos e caçadores).

"Recentemente convidei um CAC específico para trabalhar conosco na Secretaria-Geral, justamente para entender do tema de maneira mais efetiva e dar continuidade a essa pauta", disse o ministro Jorge Oliveira, em entrevista ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), divulgada no dia 11 de julho no canal do YouTube do filho do presidente. Na ocasião, o ministro não divulgou o nome do coronel.

O ministro detalhou que a missão do novo assessor é dialogar a partir da Presidência com o Ministério da Defesa, o Comando Exército, o Ministério da Justiça e a Polícia Federal para avançar na regulamentação. E pontuou que o "Comando do Exército também tem se sensibilizado com as pautas do presidente."

Antes de ir para a Secretaria-Geral, em 27 de maio, o coronel estava lotado desde 2019 no Gabinete de Segurança Institucional (GSI) onde atuava como coordenador de segurança do Palácio do Planalto, que tem como um das atribuições controlar a entrada e saída dos visitantes. Uma função diferente da que irá ocupar agora.

Formado na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) em 1988, Campoi atuou como instrutor de tiro no Exército entre 1999 e 2013. Entre 2017 e início de 2019, atuou no Conselho Consultivo do Sistema de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército (SisFPC). Aficionado pela prática de tiro, no entanto, ele registra participação em clube de tiros desde 1992 em cidades como Itu (SP), Guarapuava (PR), Resende (RJ), Boa Vista (RR), Manaus (AM), Brasília (DF). Como aluno, frequentou mais de 20 cursos na área no Brasil e na Espanha. Tem dois livros publicados e atuou como juiz tiros nos Jogos Pan-Americanos do Rio, em 2007.

Entre 2002 e 2011, Campoi atuou como coordenador de cursos da Gun Sight Escola de Formação e Aperfeiçoamento de Vigilante, empresa de Luiz Antonio Martins de Freitas Horta, conhecido como Luiz Tatai. Atualmente, Tatai é diretor internacional de vendas da fabricantes de armas norte-americana Springfield Armory, que anunciou a instalação de uma fábrica no Rio Grande do Sul. Antes, Tatai já havia representado outras fabricantes de armas como a Taurus e a Glock.

Até agora o governo Bolsonaro já editou oito decretos e 11 portarias sobre o tema. Uma das normas possibilitou que atiradores possam ter até 60 armas, sendo 30 de uso permitido e outras 30 de uso restrito. Essa flexibilização permitiu que o grupo atingisse um total de 449.778 mil armas compradas e registradas em janeiro de 2020.

Desse total, 91.530 (21%) são fuzis e 96.229 (22%) são espingardas de grosso calibre. Os atiradores detém ainda um arsenal de 164.444 (37%) pistolas, 1.750 (0,4%) metralhadoras, 84 canhões e 30 morteiros. Os dados foram obtidos por meio do Sistema Nacional de Munições, pelo Instituto Sou da Paz. Até 2018, os atiradores eram classificados por níveis, que iam de 1 a 3. De acordo com o nível de classificação, era possível ter de 4 a 16 armas, no máximo.

O número tende a aumentar. No dia 4 de junho, oito dias após a nomeação de Campoi, o próprio presidente prometeu "novidades" e ampliar a facilitação de acesso a armamento a um grupo de Cacs que o aguardava na entrada do Palácio da Alvorada. Na reunião ministerial do dia 22 de abril, cuja íntegra foi divulgada por decisão do Supremo Tribunal Federal, Bolsonaro disse querer que "o povo se arme" para impedir uma "ditadura".

Na ocasião, o presidente cobrou o então ministro da Justiça, Sérgio Moro, e o da Defesa, Fernando Azevedo, para que assinassem a portaria aumentando a quantidade máxima de munições permitida para compra. A portaria com a permissão foi publicada no dia seguinte. Uma semana antes, o Exército, por ordem de Bolsonaro, revogou três portarias que criavam regras para facilitar o rastreamento de armas e munição.

Presidente da Confederação Brasileira de Tiro Prático, Demetrius Oliveira elogia a chegada ao governo do coronel Campoi, com que se reunia no conselho do SisFPC, onde deliberavam sobre a fiscalização de armas e munições. Nega, porém, que grupos armamentistas terão o privilégio de acesso. "Quem critica isso é quem não conhece a carreira de militar", disse, afirmando que a categoria se comunica por ofício à Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados.

4 PERGUNTAS: Valdir Campoi Junior, assessor na Secretaria-Geral da Presidência

1. A nomeação do senhor na Secretaria-Geral significa uma influência maior dos CACs no governo? Qual será sua função na pasta?

Não. A minha função é prestar assessoria técnica à revisão e confecção de atos normativos que se referem a posse e porte de armas de fogo pelo cidadão brasileiro e àqueles que se referem aos CACs.

2. O senhor ainda atua como instrutor de tiro e participa de competições?

Eu estou cadastrado como IAT (Instrutor de Armamento e Tiro) na Polícia Federal desde 2007. O IAT não ministra cursos de tiro, apenas aplica os testes em quem pretende adquirir uma arma de fogo (posse) ou que necessita ter o porte para uma arma que já possuam. Atualmente, participo das competições da Federação de Tiro Prático do DF, que se encontram suspensas devido à pandemia.

3. Qual a sua relação com o senhor Luiz Horta, o Tatai, atualmente representante da Springfield Armory, ex-Taurus e Glock?

Eu tive oportunidade de ser aluno do Sr Luiz Horta, Tatai, em instruções referentes ao tiro de precisão, junto com outros militares da Seção de Tiro do Corpo de Cadetes da AMAN, no final da década de 1990, quando estudávamos a aplicação do Sniper (Caçador) para as tropas do Exército. Hoje mantemos contato esporádico

4. Como o senhor avalia críticas de que sua nomeação institucionalize o lobby das armas dentro do governo?

Essa crítica é descabida. Eu não tenho contatos e nem exerci, até hoje, qualquer trabalho junto à indústria de armas. O meu objetivo é, tão somente, assessorar tecnicamente o governo federal para que, dentro das leis, decretos e normas, o cidadão volte a exercer o seu direito de possuir armas e de porta-las, quando for necessário.

(Colaborou Patrik Camporez)

Estadão
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