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Espião chinês deserta e revela segredos de inteligência

23 nov 2019 - 13h24
(atualizado às 13h48)
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Wang Liqiang diz ter trabalhado em operações para interferir no movimento pró-democracia em Hong Kong e em outros países antes de fugir para a Austrália e revelar detalhes sobre práticas de espionagem de seu país.Um suposto espião chinês que teria desertado de seu país e buscado refúgio na Austrália relevou uma série de segredos sobre as atividades de inteligência de Pequim, além de fornecer informações sobre operações para interferir em países estrangeiros e ações contra o movimento pró-democracia em Hong Kong.

Reportagens publicadas neste sábado (23/11) pelos jornais do grupo de mídia australiano Nine, incluindo o The Sydney Morning Herald, afirmam que o desertor Wang "William" Liqiang relatou à Organização Australiana de Inteligência e Segurança (Asio, na sigla em inglês) detalhes de ações das quais participou como agente de espionagem seu país.

Ele diz ter fornecido às autoridades australianas uma grande quantidade de dados sobre atividades de espionagem e de interferência realizadas não apenas em Hong Kong, mas também em Taiwan e na própria Austrália, em algumas das quais estaria diretamente envolvido.

O rapaz de 27 anos parece não se enquadrar no perfil caraterístico de uma pessoa que se envolve em atividades de inteligência, sendo um jovem proveniente da classe média em Fujan que estudou pinturas a óleo na universidade. Ele diz ter sido recrutado de modo quase acidental, logo se envolvendo em operações confidenciais que inicialmente via como um dever patriótico, até que o medo e a repulsa o levassem a trair seu país.

"Honestamente, era algo bastante atraente para um chinês. Era bem pago e sentia que fazia algo em prol de meu país", disse Wang á imprensa australiana. "À época, a palavra 'espião' não passava por nossas cabeças. Pensávamos apenas que essas coisas fossem tarefas que precisávamos cumprir para nosso país."

Ele começou a trabalhar em 2014 em uma empresa de investimentos em Hong Kong que serviria de fachada para a inteligência militar chinesa. Entre suas tarefas estava organizar infiltrações em universidades e veículos de imprensa com o objetivo de minar o movimento pró-democracia, inclusive com ataques físicos ou cibernéticos contra dissidentes.

Wang disse ajudou a planejar o sequestro em 2015 de Lee Bo, proprietário de uma livraria em Hong Kong acusado de distribuir material de incentivo à dissidência. Outros 4 funcionários de livrarias foram detidos e enviados para a China continental. O caso se tornou um dos pontos de referência para os manifestantes pró-democracia que realizam mobilizações de massa no território semiautônomo de Pequim há mais de cinco meses.

O ex-espião conta que chegou ao seu limite ao receber este ano ordens de se transferir para Taiwan - utilizando um passaporte sul-coreano - para trabalhar em operações de interferência nas eleições de 2020, com o objetivo de derrubar a presidente Tsai Ing-wen, desafeto do governo central por possuir visões anti-chinesas.

Ele disse que se sentia em um "precipício pessoal" enquanto olhava para o passaporte falso, onde se via como uma "pessoa sem uma identidade real". Ao sentir repúdio em relação aos métodos impiedosos da inteligência chinesa, ele decidiu dar as costas á seu país e desertar para a Austrália, onde sua esposa estudava e vivia com seu filho pequeno.

"Se um dia eu retornar, serei um homem morto"

Wang diz que chegou ao país em abril e viveu durante meses em endereços diferentes, mudando frequentemente de rotina e com preocupações constantes de segurança. Ele conta que depôs à Asio sob juramento, confirmando sua participação em atividades de espionagem.

Ele, porém, diz que pagará um alto preço por sua decisão, além de temer por sua própria vida. Seus familiares, assim como os de sua esposa, são membros fiéis do Partido Comunista chinês - do qual seu pai era um oficial regional - e poderão ser alvo de retaliações. "Sei muito bem que jamais se deve confiar no partido", afirmou. "Se um dia eu retornar, serei um homem morto."

Segundo a imprensa australiana, Wang permanece com status indeterminado no país, enquanto aguarda a definição de seu pedido de asilo político. "Espero que meu filho e minha família possam [...] fazer alguma coisa em prol dos direitos humanos. Sinto que na Austrália isso pode ser alcançado", observou. "Não tenho ideia do que isso tudo trará para o resto da minha vida."

O chefe do tesouro da Austrália, Josh Frydenberg, afirmou que as informações detalhadas sobre as atividades de espionagem chinesas em seu país, com infiltrações e tentativas de desestabilizar sistemas democráticos australianos, são "altamente perturbadoras".

O governo australiano vem tentando neutralizar a influência chinesa proibindo doações políticas estrangeiras e coibindo atividades de interferência em assuntos internos. "Sempre temos de defender os interesses nacionais, seja em termos de política estrangeira, investimentos estrangeiros ou em questões relacionadas", disse Frydenberg.

Wang diz ter esperanças de que suas revelações possam servir de impulso à luta por democracia e direitos humanos em Hong Kong e Taiwan.

RC/afp/ap

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