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Educação emocional entra na rotina escolar dentro e fora do País

29 jul 2013 - 09h47
(atualizado às 09h47)
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A personalidade da criança é construída não só no ambiente familiar, mas também com as experiências em outros contextos. Até por isso, a escola tem papel fundamental no estímulo ao desenvolvimento e à formação integral dos alunos. Com base neste conceito, iniciativas dentro e fora do País propõem que o aprendizado vá além de ciências humanas e exatas e passe a contemplar sentimentos e emoções.

Em um estudo realizado em escolas na província de San Juan, na Argentina, pesquisadoras da Universidad Adventista del Plata de Entre Ríos desenvolveram um programa para promover emoções positivas em crianças, capacitando professores para incluí-lo como parte do currículo. A experiência resultou no livro Cómo Inspirar Emociones Positivas en los Niños: Una Guía para la Escuela y la Familia, de María Cristina Richaud de Minzi e Laura Oros, que descreve passo a passo como realizar esta tarefa em sala de aula e inclui 30 atividades de amostragem e recursos didáticos para a implementação da educação emocional nas séries iniciais (1º ao 3º ano). Segundo elas, com estimulação adequada, pode-se enriquecer a experiência emocional positiva de alunos e professores e, com isso, melhorar o processo de aprendizagem.

Conforme Laura, é comprovado cientificamente que essas emoções aumentam a flexibilidade cognitiva, a atenção e a concentração, facilitando a resolução inovadora e criativa de problemas e aumentando a capacidade de organizar ideias. "Quem experimenta com frequência emoções positivas tem mais facilidade para planejar e estabelecer metas a longo prazo. Esses estados positivos preparam para um aprendizado mais rápido e um melhor desempenho intelectual. A isto se somam outros importantes benefícios psicossociais, que permitem que as crianças e os professores convivam em um clima muito mais saudável, com menos agressão e bullying", explica.

Conforme Laura Oros, é comprovado cientificamente que essas emoções aumentam a flexibilidade cognitiva, a atenção e a concentração, facilitando a resolução inovadora e criativa de problemas e aumentando a capacidade de organizar ideias
Conforme Laura Oros, é comprovado cientificamente que essas emoções aumentam a flexibilidade cognitiva, a atenção e a concentração, facilitando a resolução inovadora e criativa de problemas e aumentando a capacidade de organizar ideias
Foto: Divulgação

A sistematização desta proposta não é uma tarefa simples, mas há esforços significativos na Argentina para atingir este objetivo. "A província de San Juan é, talvez, a que está mais perto de alcançá-lo. Em diferentes partes do país, há boas propostas de intervenção que permitiriam alcançar um impacto surpreendente se fossem formalmente incluídas nos currículos", afirma Laura. Para ela, o ideal seria adaptar essas iniciativas - geralmente implantadas como oficinas esporádicas - aos currículos, integradas ao planejamento escolar e desenvolvidas como parte dos conteúdos obrigatórios anuais. "Isto implicaria, obviamente, no planejamento de uma instância de capacitação docente para trabalhar estas ferramentas com os professores e proporcionar orientações sobre sua implementação", afirma.

A equipe da pesquisadora, coordenada pela co-autora do livro, María Cristina, vem implementando, há cerca de 10 anos, estratégias de fortalecimento emocional em escolas argentinas, com excelentes resultados. "Os professores notam que, com o nosso programa, as crianças mostram maior respeito pelos outros, cooperação, avaliação pessoal, facilidade em perceber suas realizações e habilidades, autoconfiança, autocontrole e capacidade de rir e desfrutar de experiências cotidianas", aponta Laura.

Para isto, é recomendável começar a trabalhar a educação emocional já nas séries iniciais. "Quanto mais cedo, mais chances de criar uma forte base emocional sobre a qual se podem construir outros recursos psicológicos, físicos e sociais importantes para o desenvolvimento saudável", comenta a pesquisadora. O êxito desta abordagem, no entanto, depende da sua aplicação contínua e sua articulação sistemática com o currículo escolar - do contrário, não se chega ao mesmo resultado.

O profissional mais indicado para trabalhar a educação emocional com as crianças é o próprio professor, já que ele conhece a dinâmica social da turma, suas preferências e padrões de interação em sala de aula (incluindo mecanismos de integração e exclusão de colegas). A autora do livro ressalta que não há uma única maneira de inspirar emoções positivas em crianças. "A verdadeira educação é aquela que visa ao desenvolvimento integral da pessoa. Neste sentido, a incorporação de conhecimentos e práticas para fortalecer as emoções positivas e da gestão e regulação das emoções negativas devem ocupar um lugar de importância no planejamento escolar", completa.

Iniciativa semelhante no Brasil

No Brasil, uma iniciativa foi implementada em 2004 pelo Centro de Valorização da Vida, entidade que atua desde 1962, oferecendo apoio emocional gratuito. O programa Amigos do Zippy foi desenvolvido por um grupo multidisciplinar de especialistas, coordenado por Befrienders International, uma entidade com sede em Londres, na Inglaterra. O programa-piloto começou com 276 crianças de oito instituições da Grande São Paulo. Uma avaliação profissional foi conduzida e demonstrou resultados animadores, semelhantes aos que estavam sendo obtidos em outros países.

Depois disso, foi fundada a Associação pela Saúde Emocional de Crianças (ASEC), entidade sem fins lucrativos que se dedica ao desenvolvimento e expansão de programas de educação emocional no Brasil. Em 2012, participaram 459 escolas públicas e privadas, de 41 cidades do País. Desde o início até o final do ano passado, mais de 159 mil crianças foram beneficiadas. Presidente da entidade e coordenadora do Amigos do Zippy no Brasil, Tania Paris explica que escolas particulares e entidades filantrópicas se inscrevem diretamente com a ASEC, e escolas públicas participam por meio de acordos que são celebrados com suas respectivas secretarias de Educação.

O projeto oferece capacitação para os educadores que irão desenvolver o programa com as crianças e eles recebem todo o material necessário, desde apostilas metodológicas, com aulas estruturadas, ilustrações para darem vida às histórias e moldes para os materiais para brincadeiras até pôsteres grandes e coloridos para a sala de aula, crachás para as crianças, guias para os pais etc. "Existe uma metodologia própria, que privilegia o aprendizado de lidar com dificuldades de forma crescente, desde as mais simples até as mais complexas, como a perda de um ente querido, passando por situações de rejeição, bullying e conflitos", explica Tania.

Ainda de acordo com ela, o programa pretende ampliar a compreensão e o discernimento das crianças para fazerem suas próprias escolhas, que não as prejudiquem nem a outras pessoas. "Com mais recursos internos, a criança se desenvolve mais e isso, naturalmente, repercute em seu comportamento. Existe uma estreita relação entre desenvolvimento emocional e aumento de recursos pessoais para um bom desempenho acadêmico", assegura.

Mesmo professor

O colégio Liceu Santa Cruz, de São Paulo, é uma das escolas que aplica o Amigos do Zippy na primeira série do ensino fundamental. Desde 2004, cerca de 350 alunos já participaram do projeto. O vice-diretor, Erival Rodrigues de Oliveira, diz que a escola procura manter sempre o mesmo professor para dar continuidade ao trabalho com os alunos. "A afetividade familiar tem deixado a desejar, o que é preocupante. As crianças estão mais carentes neste sentido. De certa forma, eles suprem essa questão com bens materiais e têm dificuldade na questão emocional e em aprender a dividir espaço. Esse tipo de trabalho tem facilitado bastante. Acaba-se despertando esse lado afetivo também, existe troca de afetividade entre eles", afirma.

Para ele, dois resultados são claros após a aplicação do projeto. "Os alunos conseguem lidar melhor com a questão da perda, tanto de parentes quanto de animais de estimação. O Zippy trabalha com isso, ele tem uma mascote que acaba morrendo no meio da história. No nosso caso, levamos os alunos a um cemitério para conhecerem e trabalharem essa questão em grupo. Esse trabalho dá muito resultado. Outro fato é a questão da colaboração, na percepção que existe o diferente, da importância de ajudar e escutar o outro - o que ajuda na questão da inclusão", destaca. Oliveira conta que a escola tem muitos alunos com síndrome de Down e que, após a participação no programa, os alunos passaram a lidar melhor com as diferenças, ajudar uns aos outros e se tratarem de forma mais respeitosa.

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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