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Literatura clássica é usada para despertar visão humanística em executivos

Cursos de educação executiva incluem Shakespeare e Tolstói para estimular criatividade; empresas levam programa de Ética e Literatura para gestores; confira sugestão de 6 obras

2 set 2021 - 10h14
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"Morreu Ivan Ilitch", anuncia um juiz para os outros colegas de foro no livro clássico. Todos, então, passam a pensar na promoção que cada um terá por causa do ocorrido. Da mesma forma, na obra, as preocupações da família do falecido com a pensão a receber não respeitam nem o velório. Assim foi o fim não de uma pessoa repugnante, mas de um homem que buscou viver sempre de maneira "leve, decente e agradável".

A leitura de A Morte de Ivan Ilitch (1886), novela de Liev Tolstói, fez Carolina Bocuhy refletir sobre o tempo dedicado ao trabalho em comparação a outras esferas da vida. "Será que essa produtividade realmente agrega ou faz perder alguns valores?", questionou-se a gerente executiva de tecnologia da informação.

O equilíbrio entre vida pessoal e profissional é um dos temas que emergem das discussões do programa Ética e Literatura da ISE Business School, onde Carolina cursa o Program for Management Development (PMD). Para desenvolver a visão humanística, ou seja, pensar nas pessoas ao tomar decisões, a escola desafia os alunos executivos a lerem literatura clássica.

A ideia de ensinar ética a partir dos enredos é do professor Dante Gallian. Ele a elaborou no curso de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, por isso, precisou adaptá-la ao mundo dos negócios, selecionando obras que abordassem temas como liderança, resiliência e trabalho em equipe. Em 2012, Gallian testou o método entre os colaboradores da ISE e o incluiu no currículo da escola.

Empresas também contratam o programa de forma customizada para as suas necessidades. É o caso da Bradesco Seguros, que já propôs que cerca de 120 de seus gestores lessem obras como O Velho e o Mar (1952), de Ernest Hemingway.

Além de aumentar o repertório cultural dos líderes, a superintendente de recursos humanos Andrea Carrasco destaca que o projeto proporciona reflexões para a vida pessoal e profissional "além da razão". "Passa pelo sentir", explica ela, "e, dessa forma, o aprendizado é mais facilmente incorporado, além de muito prazeroso".

A superintendente de comunicação Regina Macedo leu Rei Lear (1606), de William Shakespeare, durante uma edição do programa de Ética e Literatura. Segundo ela, observar traços dos personagens em si mesma e nos colegas de trabalho pode ajudar a entender situações de forma mais sensível e a tomar melhores decisões. "A literatura é uma fonte inesgotável de conhecimento e inspiração", afirma a gestora da Bradesco Seguros.

Criatividade na crise

Além de ser uma solução criativa para sensibilizar líderes, a literatura também pode inspirar a criatividade em executivos. No curso da ESPM Criatividade & Ambiente Complexo, por exemplo, os alunos são convidados a desenvolver releituras de livros clássicos e a simular como seria um encontro entre autores de épocas diferentes.

As obras ainda ajudam a construir cenários de crise para testar possibilidades de atuação. "Como seria uma liderança sua à la Hamlet?", propõe o coordenador da pós-graduação, Thiago Gringon. A partir da provocação, os executivos podem avaliar como o personagem reagiu e imaginar como eles mesmos reagiriam.

A ideia do curso é não ser previsível, explica Gringon. Portanto, pode ocorrer um assombro quando o aluno descobre que irá reler obras que leu quando adolescente, às vezes sem interesse. "Mas você vai interpretar as obras da mesma maneira que está interpretando o mundo", tranquiliza ele.

Foi para o vestibular que Carolina, aluna da ISE, leu pela primeira vez os cânones da literatura. "Eu me emocionava naquela época com outra interpretação. De repente você tem oportunidade de resgatar isso com outra maturidade, é uma reconexão", diz a executiva, que nunca tinha visto livros como esses na ementa de um curso de educação executiva, em que geralmente há uma "negação de clássicos".

Acostumados a leituras técnicas e de desenvolvimento pessoal, gestores estranham a proposta de ler ficção. "A palavrinha nova do mercado, a gente vai lá, corre atrás e estuda inteira. Mas a gente não se expõe a essa profundidade de análise de clássicos", lamenta ela.

"A literatura clássica possibilita uma percepção do desenvolvimento pessoal muito mais abrangente do que um livro de autoajuda", opina Gallian, idealizador do programa. Para estimular, o professor propõe aos alunos narrativas mais curtas e com linguagem acessível, além de criar um ambiente para as pessoas expressarem com franqueza o que pensaram.

Da estranheza do gênero do livro, os executivos passam pela curiosidade e se rendem à surpresa. "Estamos chegando a um momento em que essas fórmulas já estão um pouco esgotadas, e as pessoas estão querendo vislumbrar horizontes mais amplos, fazer experiências mais profundas", avalia o professor. Ivan Ilitch concordaria.

Clássicos da literatura para executivos

  • A Morte de Ivan Ilitch, Liev Tolstói

    Aborda ideias como propósito de vida e equilíbrio entre esferas pessoal e profissional

  • Hamlet, William Shakespeare

    Fala sobre tomada de decisões e como equilibrar o impulso e a razão

  • Rei Lear, William Shakespeare

    Reflete sobre sucessão e as virtudes a se buscar em um sucessor que agregue em vez de bajular

  • Macbeth, William Shakespeare

    Trata dos limites da ambição em um mundo competitivo

  • O Conto da Ilha Desconhecida, José Saramago

    Convida a pensar em sonhos, propósitos e metas em meio ao inesperado

  • Odisseia, Homero

    "É como fazer um curso aprofundado de como se tornar um líder", define o professor Dante Gallian

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Estadão
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