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Aluna de comunidade quilombola usa uniforme em casa para se motivar a estudar

No Maranhão, estudante de 16 anos dribla a precariedade da internet pelo sonho de se formar e ajudar o seu povo; risco de evasão durante a pandemia é maior no ensino médio

26 jul 2020 - 13h02
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Aldenice Coelho Melo, de 16 anos, veste o uniforme todos os dias, mesmo sem ir à escola, para se motivar a estudar. Moradora de uma comunidade quilombola em Bequimão, no Maranhão, ela está matriculada no ensino médio de uma escola federal, fechada por causa da pandemia do novo coronavírus. A rede de wi-fi chegou à comunidade há pouco tempo e a internet não é das melhores.

"Às vezes tenho de me deslocar até a casa de amigos, para fazer pesquisas e baixar vídeos. Acordo de madrugada para baixar aulas e vídeos, porque nesse horário a internet fica melhor", explica a jovem, que já pensou até em desistir dos estudos. "Senti pressão para abandonar. Mas os planos que tenho para meu futuro e da minha comunidade são muito maiores que os desafios." Aldenice sonha em se formar em alguma área que a ajude a contribuir com a sua comunidade.

Ouça o relato de Aldenice ao Estadão:

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Em outra ponta da educação básica estão os jovens no ensino médio, última etapa da educação básica, em que já eram altas as taxas de evasão mesmo antes da pandemia. Na quarentena, as dificuldades de acesso às plataformas digitais e a crise econômica empurram ainda mais esses adolescentes para fora da rotina escolar. Para manter os estudos, jovens de periferia têm de encontrar força em meio ao desalento.

Na casa onde mora Isabela Santos do Vale, de 19 anos, em uma comunidade da Vila Prudente, na zona leste de São Paulo, a internet até chega, mas só a madrasta e o pai têm celular. O da jovem estragou e falta dinheiro para consertar. Isabela já concluiu o ensino médio, mas foi o pai quem a estimulou a não parar. "É muito difícil porque em casa só tem três cômodos e moram cinco pessoas. Não tem espaço para parar, sentar e estudar."

No início do ano, ela se inscreveu para um cursinho gratuito. Quer fazer o Enem, marcado para janeiro de 2021, e seu sonho é estudar Design. Com a pandemia e isolamento social, no entanto, as aulas do cursinho foram suspensas. Ela, a madrasta e os dois irmãos, de 4 e 13 anos, estão em casa.

"O jovem da favela, além de perder a troca, a interatividade na escola, está em casa vivendo sob isolamento digital. A corrida vai ficar ainda mais desproporcional", diz Edu Lyra, CEO e fundador da ONG Gerando Falcões. A ONG lançou o projeto Bolsa Digital, que pretende distribuir, por meio de doações, acesso gratuito à internet móvel e aplicativo com conteúdo para o Enem.

Para Italo Dutra, chefe de Educação do Unicef no Brasil, o País precisa avançar em uma resposta aos adolescentes e jovens que os mantenha estudando. "A gente corre o risco de perder uma geração inteira de adolescentes e jovens. Temos de priorizar o acesso desses meninos e meninas à internet e a construção de currículos para o retorno que tenham comunicação com as necessidades deles. Essa deve ser uma preocupação nacional."

Na última sexta-feira, o Unicef, em parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), lançou a Busca Ativa Escolar em Crises e Emergência, um guia para apoiar estados e municípios na garantia do direito à educação de crianças e adolescentes em situações de calamidade pública e emergências, como a pandemia da covid-19.

Estadão
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