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Debate: Os servidores de São Paulo precisam de mudanças na Previdência?

O 'Estado' convidou dois deputados estaduais para apresentarem seus argumentos sobre a reforma, que deve ser votada novamente no dia 3 de março

27 fev 2020 - 12h10
(atualizado às 15h25)
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A discussão sobre a reforma da previdência estadual será retomada na próxima semana na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Os deputados estaduais já aprovaram a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em primeiro turno, e são necessários ao menos 57 votos, do total de 94 parlamentares, para aprová-la definitivamente.

A PEC altera regras para a aposentadoria dos servidores estaduais, e traz mudanças como o aumento da idade mínima (65 para homens, e 62 para mulheres), fim do acúmulo de benefícios temporários e regras de transição que incluem o chamado "pedágio" - quem está prestes a se aposentar hoje, antes da idade mínima, deve dobrar o tempo de contribuição remanescente. Veja aqui o que muda com a reforma.

O Estado convidou dois deputados estaduais para apresentarem seus argumentos sobre a reforma, que deve ser votada novamente no dia 3 de março.

Os servidores estaduais de São Paulo precisam de uma reforma previdenciária?

SIM - HENI OZI CUKIER*

Há dois argumentos principais que explicam por que precisamos da reforma. Em primeiro lugar, é uma questão de reequilíbrio na distribuição dos recursos do Estado, do uso do dinheiro público. Temos, de um lado, 550 mil funcionários públicos aposentados do Estado de São Paulo, que custam R$ 34 bilhões por ano.

De outro, os recursos destinados à Educação são de R$ 33 bilhões. Na Saúde, o orçamento é de R$ 24 bilhões. Na Segurança, R$ 11 bilhões. Somos o País que mais mata no mundo, e o Estado de São Paulo, apesar dos esforços e resultados positivos alcançados recentemente, deu origem à maior organização criminosa do Brasil - e talvez do mundo - o PCC (Primeiro Comando da Capital).

Ou seja, em comparação com o que 550 mil pessoas recebem com suas aposentadorias, há 44 milhões de pessoas em São Paulo que não recebem - ou recebem muito menos do que poderiam receber - com os três serviços mais básicos que o Estado tem de entregar: segurança, saúde e educação. É uma distorção sem tamanho.

Em segundo lugar, é uma questão de equilíbrio fiscal. Os próprios aposentados deixarão de receber se esse rombo continuar crescendo, e continuará crescendo se não houver uma reforma. O desequilíbrio também cresce pois, cada vez mais, a previdência custa mais. E sobra cada vez menos para as áreas fundamentais.

Regras como a conta do "pedágio", na qual os servidores precisam contribuir mais para se aposentar, não foram desenhadas para punir ninguém - e sim para fechar a conta. Se o brasileiro vai viver mais e o todos os trabalhadores do País terão de se aposentar mais tarde - definido pela reforma da Previdência federal - regras de transição, como o pedágio, são necessárias. Se não, nunca chegaremos no montante suficiente para pagar a aposentadoria de todos. Não é um número inventado.

Um dos principais argumentos que escuto da oposição é de que o governo concedeu desonerações fiscais, e poderia usar esse dinheiro na previdência. Porém, foi esta mesma oposição que votou a favor de um incentivo fiscal para uma indústria já tão beneficiada pela economia brasileira, a automobilística. O Novo se posicionou e votou contrário a este incentivo já o PT e alguns deputados da oposição foram favoráveis, aí sim estamos beneficiando um segmento em detrimento de toda a sociedade. E querem novamente fazer isso.

Há situações graves, como o desequilíbrio da previdência em São Paulo, nas quais temos o dever de colocar na balança o interesse coletivo. Se continuarmos priorizando o interesse de apenas 550 mil pessoas, quebraremos os 44 milhões de paulistas.

* Cientista político e professor, é deputado estadual pelo Novo e relator da PEC da Previdência na Alesp

NÃO - PROFESSORA BEBEL (Maria Izabel Azevedo Noronha)*

Tanto sob o olhar do Estado, quanto sob o olhar dos servidores, a reforma da previdência estadual não é necessária. Se estivesse faltando dinheiro, o governador não daria tanta isenção fiscal quanto dá.

O governo diz que, ao criar, quer economizar R$ 32 bilhões em dez anos - o que significa cerca de R$ 3,2 bilhões por ano. Ora, a renúncia fiscal já está acima de R$ 3 bilhões. O Estado de São Paulo já teve uma reforma previdenciária em 2007, como o próprio governador reconheceu em campanha. O servidores já estão pagando a alíquota de 11% desde então, portanto o governo deveria ter um "colchão" de recursos suficiente para a sustentabilidade da previdência.

Dentro da reforma, está contida também uma reforma administrativa. Isso porque a reforma abre a possibilidade de transformar o salário dos servidores em subsídio, o que impede o acréscimo de gratificações e adicionais. Com isso, trata-se o funcionário público como se ele tivesse cargo eletivo. O subsídio é para o governador, seus secretários, os deputados estaduais. Para o servidor, que tem carreira, não.

Não é um debate honesto com o funcionalismo, nem com a sociedade, falar dos números que se pretende economizar sem expressar o que o governo de fato quer fazer: adiantar a reforma administrativa, que sequer entrou a discussão no Congresso Nacional, ao instituir um subsídio que acaba com a carreira.

Há também uma grande bagunça nas regras de transição. O governo deveria, no mínimo, garantir as regras antigas para quem já está contratado. Com esta reforma, mudam-se as regras no meio do jogo. Quem está prestes a se aposentar terá de dobrar o tempo de contribuição que ainda lhe falta.

Já aqueles que contraíram doenças no exercício do cargo, os readaptados, dificilmente vão conseguir se aposentar. São casos de professores que desenvolvem síndrome do pânico na sala de aula, servidores que estão em contato com produtos químicos, operam máquinas de raio-X, ou lidam com diversas situações insalubres. Pelas regras atuais, vão adoecer e morrerão antes mesmo de aposentar.

O bom senso demandaria que o governador melhorasse essas distorções todas, antes da votação em segundo turno. É por isso que vejo a possibilidade de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a reforma, que fará com que pessoas fiquem doentes em serviço e não consigam se aposentar. Uma reforma que fere direitos humanos não pode ser considerada constitucional.

* Deputada estadual pelo PT, foi presidente do Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo (Apeoesp)

Estadão
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