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Coronavírus

Um novo horizonte

A crise atual tem levantado questões profundas sobre nossos modelos de desenvolvimento

6 jun 2020 - 04h11
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O que Brasil, França e Itália têm em comum? O fato de cada um ter criado, ainda no século 19, uma instituição financeira pública, chamada "caixa" - Caisse des Dépôts (CDC), na França; Cassa de Depositi e Prestiti, na Itália; e Caixa Econômica Federal (CEF), no Brasil -, para oferecer segurança àqueles que querem poupar e orientar fluxos financeiros para projetos de longo prazo. Essas três instituições atuam hoje na implementação de pacotes de apoio às economias fortemente afetadas pela crise do coronavírus.

Outros países do G-20 têm recorrido aos bancos públicos para implementar estratégias de contenção dos danos causados pela crise e fomentar a recuperação econômica. No caso da França, o Banco Público de Investimento, filial da Caisse des Dépôts, disponibilizou um pacote de financiamento para pequenas e médias empresas que faz parte do plano de apoio à economia de 300 bilhões de euros. Outros planos de apoio à economia utilizam bancos de desenvolvimento, na Alemanha, no Brasil e na Colômbia.

O papel dos bancos públicos vai além da resposta emergencial. Em setembro de 2019, por ocasião da Cúpula do Clima organizada pelas Nações Unidas, os bancos públicos membros do International Development Finance Club (IDFC) firmaram um compromisso expressivo de US$ 1 trilhão a favor da implementação dos objetivos do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas até 2025. Nenhum outro grupo de instituições públicas demonstra semelhante capacidade de mobilização de recursos.

Os bancos públicos têm a capacidade de alavancar recursos do setor privado e, assim, criar condições adequadas para a formulação de montagens financeiras do tipo blended finance (uso combinado de recursos públicos e privados). Assim, essas instituições são capazes de acelerar o efeito crowding in e reorientar recursos privados para projetos de desenvolvimento sustentável compatíveis com objetivos climáticos.

O IDFC foi fundado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) juntamente com o banco alemão Kreditanstalt fur Wiederaufbau (KfW) e o Banco de Desenvolvimento da América Latina, e é presidido hoje pelo CEO da Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), Rémy Rioux. Tem 26 sócios, em sua maioria oriundos de países emergentes, em particular de países do Brics. O IDFC é exemplo tanto de cooperação internacional eficiente como de governança mundial de políticas públicas, neste caso a política pública de financiamento do desenvolvimento sustentável. Reúne instituições cuja legitimidade se respalda em experiências em nível nacional, regional e internacional.

Mas a relevância dos bancos públicos não depende apenas dos gigantes como CDC, CEF e KfW. No Brasil, bancos estaduais abriram novos caminhos para o financiamento do desenvolvimento sustentável, como o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul e o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais. Um dos elementos da resposta que a AFD pretende desenvolver diante da crise da covid-19 passa pelo fortalecimento das parcerias com bancos estaduais e agências de fomento, pois estas dispõem da capilaridade necessária para atender as cidades e os atores econômicos atingidos.

No final deste ano ocorrerá em Paris a primeira cúpula dos bancos públicos do mundo inteiro, sinalizando a crescente relevância dessas instituições tanto no âmbito das políticas nacionais como no âmbito da cooperação internacional.

A crise atual tem levantado questões profundas sobre nossos modelos de desenvolvimento. Entretanto, a dimensão dos planos de investimento propostos faz com que, ao mesmo tempo, esta seja uma oportunidade histórica para um redirecionamento mais sustentável e inclusivo. Uma mudança de rumo que, por fim, observaria as orientações da Agenda 2030 e do Acordo de Paris. O compromisso dos bancos de desenvolvimento com essa agenda é uma bússola que norteia o caminho para sair da crise.

*DIRETOR REGIONAL DA AFD NO BRASIL

Estadão
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