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Coronavírus

Recomendação do FMI para que países não retirem estímulos joga pressão sobre governo

Segundo Kristalina Georgieva, agora é hora de se preparar para um impulso sincronizado de investimento em infraestrutura verde e digital para revigorar o crescimento, limitar cicatrizes e atender às metas climáticas

24 nov 2020 - 20h40
(atualizado às 22h33)
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BRASÍLIA - A recomendação do Fundo Monetário Internacional (FMI) para os países evitarem a retirada prematura dos estímulos fiscais concedidos para combater os efeitos da pandemia do novo coronavírus aumentou a pressão sobre o governo brasileiro com a proximidade do fim do auxílio emergencial e do estado de calamidade, previsto para o fim do ano.

Na reunião de cúpula virtual do G-20, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, Kristalina Georgieva, no final de semana, defendeu que autoridades globais evitem retirar iniciativas de alívio fiscal de forma prematura. Segundo ela, agora é hora de se preparar para um impulso sincronizado de investimento em infraestrutura verde e digital para revigorar o crescimento, limitar cicatrizes e atender às metas climáticas.

Em recente entrevista ao jornal Financial Times, a economista-chefe do FMI, Gita Gopinath, afirmou que é consenso que o estímulo fiscal foi retirado muito rapidamente logo após a crise financeira internacional, em 2008, um erro que se deve evitar agora na pandemia da covid-19. A economista do fundo destacou que há boas formas de investimento público que podem criar empregos, aumentar a atividade econômica e, ao mesmo tempo, ser fiscalmente prudentes para ajudar a reduzir a dívida. Uma medida que na avaliação é essencial quando há um alto nível de incertezas.

A recomendação do FMI causou preocupação na equipe econômica brasileira que tem defendido a consolidação fiscal e apontado para os representantes do organismo multilateral que a situação do Brasil é diferente. "O FMI não se atentou para situação específica do Brasil, onde o conjunto de instrumentos utilizados para combater os efeitos econômicos da pandemia foi mais elevado e resultou em gastos maiores do que em outros países", disse ao Estadão o secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida.

Segundo ele, dadas as suas características específicas, o Brasil está num momento onde é mais importante para a população mais pobre defender a consolidação fiscal do que a expansão do gasto público. "O Brasil encontra-se hoje numa situação em que, se gastarmos muito, a inflação sobe, os juros aumentam, o desemprego aumenta, o investimento e o PIB caem", ressalta. Para ele, defender a consolidação fiscal não é questão de ideologia, mas política que protegem, em especial, a população mais pobre.

Com a elevação dos números de casos da doença e o risco de uma segunda onda no Brasil, aumentou a pressão para a extensão do auxílio em 2021, mesmo que em valor e quantidade menor. Como revelou o Estadão, o assunto está em discussão no governo, embora o ministro da Economia, Paulo Guedes, venha afirmando que não trabalha no momento com essa possibilidade. O governo não descarta a prorrogação no caso de uma segunda onda.

O professor de economia da Universidade Federal de Minas Gerais, João Prates Romero, avalia como acertada a recomendação do FMI também para o Brasil. "Não é defender que não tenha atenção com o déficit (rombo nas contas públicas), mas existem formas de voltar ao debate do desenho da regra do teto de gastos (regra que proíbe que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação) para fazer investimentos", diz ele.

Romero defende que seja criado um subteto para os investimentos ficarem fora fora da regra, aprovada em 2017. Ele alerta que quando o auxílio acabar, a situação ficará crítica porque o quadro para 2021 é ainda muito difícil com empresas muito debilitadas e metade da população com idade para trabalhar desocupada. Ele defende a prorrogação das medidas, incluindo o auxílio, e maior flexibilidade das regras fiscais.

Para o presidente da Associação Keynesiana Brasileira, Fabio Terra, a posição do FMI é acertada porque não se sabe se haverá uma segunda ou mesmo terceira onda de longa duração. "É sabiamente recessivo. A pior coisa que pode acontecer na economia são choques, como um que decorreria de uma consolidação fiscal brusca - ainda mais após uma crise tal qual a que se vive hoje", avalia.

Segundo ele, a situação fiscal demanda atenção pela necessidade de pensar o equilibro no médio prazo, enquanto que no curto prazo deve ser exercitar a "força do fiscal" na economia e a necessidade de ele puxar a recuperação. "Claro que isso vale para o Brasil tanto quanto para o mundo todo. O Brasil não tem diferença do mundo neste sentido: por que teria?", questionou. A associação está promovendo esta semana encontro internacional em que, entre outros temas, debate os efeitos da pandemia na economia e as medidas adotadas.

Estadão
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