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Coronavírus

Planos de saúde individuais: ANS autoriza reajuste de até 15,5%, o maior da série histórica

Justificativa é de que houve aumento das despesas das operadoras, como procedimentos eletivos (não urgentes); é o maior aumento para convênios médicos desse tipo

26 mai 2022 - 15h23
(atualizado às 21h09)
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BRASÍLIA - Com o aval do Ministério da Economia, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) autorizou nesta quinta-feira, 26, um reajuste de até 15,5% no valor dos planos individuais e familiares. O argumento é de que houve aumento das despesas das operadoras, com procedimentos eletivos (não urgentes) em 2021. O reajuste, o maior da série histórica iniciada em 2000, foi aprovado em reunião da diretoria colegiada na tarde desta quinta por 4 votos a 1.

"O trabalho da agência, a gente foca, acima de tudo, na sustentabilidade do setor, pensando obviamente no melhor para o consumidor, na estabilidade das relações. A viabilidade da manutenção do setor para dar continuidade, entregando às famílias as coberturas assistenciais contratadas", disse o diretor-presidente Paulo Rebello na reunião.

Um total de 8 milhões de beneficiários devem ser afetados. O reajuste vale para para o período de 1º de maio de 2022 a 30 de abril de 2023. Para planos individuais e familiares, o aumento depende de autorização prévia da ANS.

No ano passado, a agência aplicou reajuste negativo de -8,19% para o período de maio de 2021 a abril de 2022. As operadoras não puderam cobrar índices maiores que o definido, mas, sim, aplicar índices menores. A justificativa, na época, foi a queda das despesas assistenciais no ano de 2020 provocada pela covid-19.

O cálculo do reajuste da ANS para 2022 e 2023 teve a concordância do Ministério da Economia. Em ofício enviado à ANS, uma equipe da pasta afirmou que o aumento proposto pela agência deve ser "avaliado à luz dos recentes acontecimentos advindos da pandemia de covid-19, que impactou drasticamente o setor de saúde suplementar".

"Se por um lado a demanda por tais serviços caiu consideravelmente em 2020, reduzindo os custos das operadoras naquele ano, por outro a demanda reprimida em 2020 foi bastante sentida em 2021, com um considerável crescimento no uso dos serviços dos prestadores de saúde pelos beneficiários, gerando uma elevação nos custos das operadoras, que por sua vez vinham de uma redução nos seus preços desde maio de 2021, além de congelamento nos preços por oito meses em 2020", apontou a equipe.

A agência só define o valor do rejuste dos planos individuais ou familiares. E não há limite de reajuste aos planos coletivos empresariais nem aos coletivos por adesão. O valor do aumento para esses casos é negociado entre as empresas e as operadoras de saúde.

A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) diz que o setor foi o único do País em que o reajuste em 2021 foi negativo. A entidade defende que considerando o período 2021/2022, "os planos de saúde tiveram um aumento médio anual de cerca de 2,98%, o que é um dos menores da história dos planos de saúde individuais e familiares."

E exemplifica: "o beneficiário que pagava R$ 100 para o plano de saúde em dezembro de 2020 pagaria agora, após 2 anos, o valor de R$ 106,04, já que a mensalidade foi reduzida em -8,19% em 2021, e o reajuste anunciado é de 15,5% em 2022. Em comparação, os mesmos R$ 100 em janeiro de 2020 equivalem hoje a R$ 115,03 reais após aplicado o IPCA de 4,52% de 2020 mais 10,06% de 2021."

A Abramge reforça ainda que, com a publicação do índice pelo órgão regulador, o reajuste dos planos individuais e familiares será aplicado no mês de aniversário de contrato.

De acordo com a associação, pela primeira vez, em 2021, as despesas assistenciais ultrapassaram a marca de R$ 200 bilhões pagos pelas operadoras para os hospitais, clínicas e laboratórios. Como reflexo do forte aumento das despesas, as operadoras de planos de saúde fecharam o ano, no conjunto, com prejuízo operacional de aproximadamente R$ 1 bilhão.

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), representante de 15 grupos de operadoras de planos e seguros privados de assistência à saúde e planos, defendeu o reajuste. A diretora-executiva da entidade, Vera Valente, afirmou que o aumento reflete o crescimento dos custos.

"O aumento de itens diversos, como o preço de medicamentos e insumos médicos, a forte retomada dos procedimentos eletivos, o impacto de tratamentos de covid longa e a incorporação de novas coberturas obrigatórias aos planos de saúde, como medicamentos e procedimentos, impactam diretamente no reajuste. Além disso, o Brasil enfrenta a maior inflação geral em 19 anos, o que afeta diversos setores de atividade econômica, incluindo o mercado de planos de saúde", disse.

Segundo o Estadão apurou, o governo Jai Bolsonaro tentou postergar o anúncio do índice de reajuste dos planos de saúde para depois das eleições para evitar desgaste político. Procuradas por um emissário da administração federal, as empresas do setor não aceitaram a proposta.

Elas argumentaram que, se no ano passado, o reajuste negativo (em 8,19%) foi divulgado pela ANS na data certa, não haveria razão para postergar o anúncio de 2022 só porque o reajuste derivado da fórmula de cálculo adotada pela ANS desde 2018 foi de 15,5%. Apesar da tentativa de adiamento, ANS e Economia optaram por anunciar o reajuste ainda em maio, mês em que o índice é tradicionalmente divulgado.

Reajuste é descabido, diz advogado

O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) faz análise contrária. "Os anos pandêmicos foram de intenso crescimento econômico para as operadoras de planos de saúde." A entidade aponta que os consumidores pagaram uma cobrança retroativa de reajustes - os valores suspensos em 2020 durante o primeiro ano de pandemia.

Dados do instituto verificaram que, apesar do reajuste negativo, a população usuária desses serviços lidou com aumentos da ordem de até 50% durante o ano de 2021. Ou seja, o desconto foi neutralizado pela recomposição.

Coordenadora do Programa de Saúde do Idec, Ana Carolina Navarrete se diz espantada com percentual tão elevado considerando os lucros das empresas de saúde, com a entrada de consumidores durante a pandemia. "A questão é que essa metodologia foi pensada para situações de normalidade sanitária. O comportamento dos custos na pandemia foi extremamente atípico, o que demandaria uma reavaliação do reajuste deste ano."

O advogado e diretor do Instituto Brasileiro do Direito do Seguro (IBDS) Tiago Moraes afirma que o reajuste é "descabido". Segundo ele, o aumento "lesa o bolso do consumidor". "Não poderia jamais ser chancelado pela agência que tem como uma de suas principais atribuições zelar pelo bom desenvolvimento do mercado de seguros e planos de saúde", disse.

"As operadoras propalam que a taxa de sinistralidade dos planos de saúde ultrapassou 85% no ano de 2021, mas convenientemente se esquecem que no ano de 2020, por conta da pandemia, o número de consultas e procedimentos eletivos (não urgentes) caiu abruptamente, não tendo sido realizados durante boa parte do ano."

Checar possibilidades de migração é alternativa para clientes

Caso a ANS defina um percentual elevado e o cliente não consiga mais arcar com essa despesa, entidades de defesa do consumidor recomendam que o cliente tente trocar de plano dentro da mesma operadora. Dessa forma, é possível levar com ele as carências que já foram cumpridas.

A operadora é obrigada a fornecer uma lista de planos para os quais é possível fazer a migração. Outra possibilidade é tentar trocar de plano e de operadora fazendo portabilidade. Para isso, o beneficiário deve acessar o guia da ANS no site da agência.

Ao informar os dados do plano de saúde, o serviço fornece uma lista de outros para os quais é possível mudar. Só é permitido fazer portabilidade se o cliente estiver há pelo menos dois anos no plano de origem e em dia com o pagamento das mensalidades. O plano para o qual a pessoa pretende migrar precisa ser do mesmo valor ou mais barato. / COLABOROU CRISTIANE SEGATTO

Estadão
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