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Coronavírus

Como dirigentes do Brasil afrontam ciência e conhecimento?

Recuperação da economia depende tanto da vacinação como da restauração da confiança no governo

15 jun 2021 - 04h10
(atualizado às 07h48)
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Em um momento trágico da História do Bso dos programas de vacinação em rasil, no dia 13 de junho superamos os 17 milhões de infectados e os 486 mil mortos pela covid-19. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), em relação aos totais mundiais esses números representam, respectivamente, 9,8% dos infectados, 12,8% dos casos ocorridos nas últimas 24 horas, 12,9% das mortes e 21% das mortes nas últimas 24 horas. O que amplia o impacto desses porcentuais é saber que a população do Brasil representa apenas 2,6% da população mundial. E o que causa incômodo é saber que, ao longo do século 20, o Brasil sempre foi referência mundial, com seus Programas Nacionais de Imunizações. Isto, pelo sucesmassa, diante da complexidade da logística em um país tão extenso e com grandes diversidades regionais.

Presidente Jair Bolsonaro segura caixa de cloroquina em cerimônia do Palácio do Planalto
16/09/2020 REUTERS/Adriano Machado
Presidente Jair Bolsonaro segura caixa de cloroquina em cerimônia do Palácio do Planalto 16/09/2020 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

Os trabalhos meritórios do Ministério da Saúde, dos médicos sanitaristas, profissionais de Saúde, bem como de militares das três Forças Armadas, foram ampliados e ganharam sua configuração consolidada a partir de 1975, na campanha da erradicação da varíola. Neste sentido, a institucionalização das ações coordenadas no âmbito federativo, bem como a criação dos dias nacionais de vacinação, foram fatores de forte mobilização da opinião pública em favor das campanhas de imunização. Um exemplo marcante dessas formas de mobilização foi a erradicação da poliomielite no Brasil, sem falar de outras campanhas, como as da febre amarela e cólera, que tiveram repercussão mundial.

Não se pode esquecer, por outro lado, o pioneirismo do Brasil nos trabalhos de investigação, desenvolvimento do conhecimento, combate e erradicação das endemias que assolavam o País, ainda com predominância da população rural. Foram contribuições importantes da pesquisa para a conformação da medicina tropical, que lida com complexos ciclos de vida de parasitas em múltiplos hospedeiros. Os pesquisadores, médicos e sanitaristas brasileiros tiveram um importante papel mundial no estudo e nas soluções para enfrentar endemias com processos biológicos complexos e interação com amplos agrupamentos humanos. Exemplos desse esforço foram os combates à doença de Chagas, esquistossomose, leishmaniose e hanseníase.

Feito esse retrospecto, a pergunta que não quer calar é: o que aconteceu com o Brasil? Quais as razões para um retrocesso tão absurdo, justamente em um momento tão dramático para o País? Como chegamos a ponto de termos dirigentes que afrontam, desacreditam e ridicularizam a ciência e o conhecimento? A pergunta é ainda mais intrigante quando se vê a postura de militares que negam seu passado positivista, de apreço à ciência e de partícipes ativos em memoráveis campanhas de vacinação. Por fim, esta farsa ridícula de contrapor economia à pandemia. A atividade econômica já estava cambaleante no início da pandemia. Diante do inevitável impacto do isolamento social, a motivação desta atitude seria o raciocínio primário de simplesmente deixar pessoas morrerem para reativar a economia? Se, com os cuidados tomados por parte da população, chegamos a mais de 17 milhões de infectados, o sistema hospitalar em colapso, a vacinação atrasada, além de quase meio milhão de mortos, seria possível reativar a economia desacreditando as vacinas, expondo a população a riscos, dando voz à ignorância de negacionistas e estimulando a propagação?

Infelizmente, os impactos da pandemia foram tão destrutivos - e, em grande parte, por irresponsabilidade na postura irresponsável do governo federal - que a recuperação econômica dependerá, de forma crucial, tanto da rapidez na imunização com a vacinação quanto da restauração de um ambiente de confiança nas atitudes do governo. A economia só se recupera com a volta da credibilidade do País, a consistência das políticas públicas e a confiança para investir. Empresários, trabalhadores e governadores entenderam e querem isso. Falta combinar com o adversário...

*ECONOMISTA, CONSULTOR DE ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS, É COORDENADOR DO NÚCLEO DE ESTUDOS URBANOS DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE SÃO PAULO

Estadão
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