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Campeonato Paulista vira símbolo da retomada das atividades durante pandemia

Paralisado por quatro meses, torneio mostrou ao Estado de São Paulo nova forma de vivenciar o esporte

9 ago 2020 - 05h11
(atualizado às 05h11)
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Quando alguém no futuro for estudar a história do Paulistão de 2020, vai concluir que a competição, em vez de só ficar restrita ao futebol, envolveu discussões sobre isolamento social, causou irritação com o governo estadual, provocou conflitos sobre treinos clandestinos e forçou times a criarem bolhas de isolamento. A pandemia do coronavírus fez o Estadual 2020 deixar de ser um torneio secundário para algumas equipes e se tornar uma longa disputa de quase sete meses e uma espécie de símbolo da retomada das atividades em São Paulo. A final ocorreu no dia em que o Brasil "chorou" a morte de 100 mil pessoas pela covid.

O Paulistão termina com uma amostra de como o futebol funcionará nos próximos meses. Ou até por mais tempo, pelo menos enquanto durar a preocupação com o vírus e sem ter uma vacina eficaz. Os jogos com portões fechados, a rotina de testes, a higienização de estádios e uso de máscaras foram apresentados ao público paulista durante as últimas semanas.

A pandemia paralisou o Estadual por quatro meses e deixou uma pergunta no ar: quando ele voltará? Antes mesmo de se cogitar a resposta, vieram as dúvidas. A primeira delas é sobre se de fato todas os times respeitavam ou não a determinação do governo estadual para interromper as atividades, ficar em casa. Houve entre os clubes informações de que alguns deles estavam furando a quarentena para manter a forma com treinamentos escondidos. O Estadão revelou a polêmica em junho, após receber mensagem inicialmente enviada ao grupo de WhatsApp dos jogadores da Ferroviária ainda no fim de abril. O recado explicava os procedimentos de trabalho no Estádio Fonte Luminosa e apresentava a explícita orientação para os atletas não filmarem nem divulgarem as atividades. O clube negou ter feito treinos secretos. O Red Bull Bragantino, por sua vez, admitiu que trabalhou após receber autorização da Prefeitura. O Oeste levou o grupo para treinar sem uniforme em campos públicos de Barueri. Foi flagrado e fotografado.

"Teve um monte de boato sobre os times que estão treinando e até usando chácara de dirigente para se esconder. O único que teve a hombridade de confessar foi o Bragantino", afirmou o presidente do Santo André, Sidney Riquetto. Enquanto alguns clubes evitavam comentar sobre treinos, outros usaram videoconferências para passar atividades aos jogadores, que continuavam em casa. Varandas, jardins e salas de estar viraram academias.

Embora entre as equipes existisse desconfiança sobre quem havia descumprido a quarentena, todas tiveram a mesma opinião quando em junho houve uma decepção com o governador João Doria (PSDB). Em meados daquele mês, todos os dirigentes e jogadores aguardavam que haveria a liberação imediata para o retorno aos treinos. Mas não houve. Doria só permitiu a volta em 1.º de julho.

Os clubes reclamaram, pois tinham pressa em ter calendário para voltar a receber as cotas de direitos de televisão. O pagamento foi interrompido. Ao todo, as equipes receberam pela competição cerca de R$ 187 milhões pela transmissão. A Federação Paulista de Futebol (FPF) criticou a escolha do governador na ocasião. "O anúncio, com o distante reinício das atividades, causou estranheza", informou em nota oficial.

O calendário voltou dia 22 de julho. Só poderia fazer jogo em cidade na fase amarela do plano estadual de retomada das atividades. Em cada partida, somente 200 pessoas e uma grande preocupação com a higiene das instalações. "Sabíamos, desde o início, que teríamos dificuldades, mas caminhamos com segurança. Poderíamos ter retomado o campeonato antes? Talvez sim, talvez não", afirmou o presidente da FPF, Reinaldo Carneiro Bastos ao Estadão.

O futebol voltou, mas não estava livre do impacto da pandemia. A paralisação de quatro meses deixou times sem dinheiro e jogadores sem contrato. Em equipes do interior, os acordos são assinados para durarem os três meses previstos do Estadual. Por isso, elencos precisaram ser reformulados. A FPF socorreu clubes e arbitragem, como fez a CBF em nível nacional.

Um caso exemplar foi o do Mirassol. A equipe perdeu 18 atletas no período e se reconstruiu na base da bravura. A diretoria manteve o elenco confinado em um centro de treinamento e, para garantir a diversão de todos, construiu uma quadra de futevôlei e contratou um chef de cozinha especializado, entre outras comidas, em churrasco.

O time foi para as quartas de final contra o São Paulo e só conseguiu escalar o atacante Zé Roberto na véspera. Como ele havia defendido anteriormente um time dos Emirados Árabes Unidos, a documentação necessária para inscrevê-lo no Paulistão demorou a ficar pronta.

Até que um dia antes da partida no Morumbi ele foi liberado para pegar um avião em São José do Rio Preto e desembarcar na capital. Marcou dois gols e garantiu a vitória por 3 a 2.

"Depois de tudo o que o nosso time passou, a classificação foi um presente para todos os jogadores que continuaram no Mirassol após a pandemia. Todos nós estamos felizes e contentes, por tudo o que passamos e superamos", afirmou o técnico do Mirassol, Ricardo Catalá. Durante a fase final, o time se concentrou em um hotel em Sorocaba, para facilitar a logística de deslocamento. Tudo foi diferente neste Paulistão 2020.

O Santo André até perdeu o estádio durante a pandemia e viu o local deixar de ter um gramado para se transformar em um hospital de campanha para atender vítimas do novo coronavírus. Gesto nobre. A saída foi se refugir em outra cidade, Vargem. A doença atingiu alguns elencos. O Corinthians teve mais de 20 casos confirmados.

O clube alvinegro e o rival na decisão, o Palmeiras, tiveram uma polêmica antes da final por questões médicas. Em vez de provocações e brigas sobre arbitragem, o Paulistão da pandemia do novo coronavírus enfrentou como última história de bastidor o isolamento social. Após o presidente do Corinthians, Andrés Sanchez, avisar que os jogadores não realizariam testes para a covid antes do primeiro jogo da final, o Palmeiras se revoltou. Em resposta, o Corinthians disse que não seria necessário o exame porque o clube, ao contrário do adversário, manteve o elenco confinado.

A desavença terminou com a própria intermediação da FPF. O Palmeiras testou antes do jogo da quarta-feira e os dois times foram examinados antes do encontro no Allianz. Depois disso, o jogo voltou a ser o assunto. No entanto, é bem provável que deste Paulistão em diante, nunca mais veremos o futebol da mesma maneira.

Estadão
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