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Coronavírus

Brasil inicia diálogo com China para produção de nova vacina contra covid-19

Encontro de ministros do governo Bolsonaro com o embaixador da China também foi marcado por recados e cobranças dos dois lados, ainda que o tom tenha sido diplomático

11 mai 2021 - 12h15
(atualizado às 14h40)
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BRASÍLIA - O Brasil iniciou negociações com a China para a produção de uma nova vacina contra a covid-19. Na última sexta-feira, 7, durante encontro virtual, por videoconferência, de ministros do governo Jair Bolsonaro com o embaixador do país asiático, Yang Wanming, houve avanços nas tratativas para a alternativa de mais um imunizante para o País, segundo fontes que participaram das discussões.

A próxima aposta no combate à pandemia é a CanSino Biologics, que já foi aprovada na própria China, no Paquistão, no Chile, na Hungria e no México. Há um mês, a fabricante afirmou que, apesar das semelhanças com imunizantes da AstraZeneca/Oxford e da Johnson & Johnson, o rastreamento do seu produto não identificou nenhum caso de coágulo sanguíneo nas pessoas que o receberam.

A CanSinoBIO também é conhecida como Convidecia e usa o adenovírus tipo 5 como vetor para fornecer "instruções" para as células humanas produzirem uma parte do SARS-CoV-2. É ele que está "programado" para fazer o sistema imunológico reconhecer e atacar em caso de contaminação por coronavírus. "Estamos estudando isso com os chineses, que têm uma grande expertise e são parceiros importantes do Brasil na agenda econômica, e também na agenda da Saúde", confirmou o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ao Estadão/Broadcast.

Diretamente com a China, o Brasil tem parceria atualmente com a Coronavac, numa negociação liderada pelo governador do Estado de São Paulo, João Doria, alvo de muitas críticas disparadas pelo presidente Jair Bolsonaro. No Brasil, a Coronavac, da farmacêutica Sinovac, é produzida em parceria com o Instituto Butantan. Seu diretor, Dimas Covas, e a presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Nísia Trindade Lima, também estiveram presentes no encontro de sexta-feira.

De acordo com dados atualizados pelo Butantan até o último dia 7, em janeiro, foram entregues ao Programa Nacional de Imunização (PNI) 8,7 milhões de doses da vacina; em fevereiro, 4,8 milhões; em março, foram 22,7 milhões; em abril, 5,8 milhões. Em maio, até o momento, foram 1 milhão de doses enviadas. Ontem foi anunciado que mais dois milhões de doses da vacina Coronavac estavam disponíveis para o PNI. No total, já são 45,1 milhões de unidades.

Recados

O encontro dos ministros com o embaixador da China também foi marcado por recados e cobranças dos dois lados, ainda que o tom tenha sido diplomático.

Se de um lado, o embaixador saiu do encontro com a garantia de que o Brasil continuará a exportar seus produtos para a China - em especial commodities, como a soja - os ministros também tiveram a promessa de que o País seguirá recebendo o Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA), ainda que Yang Wanming não tenha se comprometido com prazos.

A conversa com Yang Wanming foi uma solicitação do ministro das Relações Exteriores, Carlos Alberto França, que tomou posse no início do mês passado. Desde então, o chanceler brasileiro tem pregado a "diplomacia da vacina", além de prometer um estreitamento das relações não apenas com qualquer país aliado em todo o mundo, sem discriminações, como também internamente, com os demais poderes. Além de Queiroga, França também convidou para a reunião o ministro da Economia, Paulo Guedes. Técnicos das três pastas estavam presentes, assim como o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, e a presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Nísia Trindade Lima.

Ao final do encontro, os representantes brasileiros avaliaram que o esforço valeu a pena em meio a um mal-estar generalizado entre as partes. Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro havia feito mais uma insinuação de que o país asiático teria criado o vírus em laboratório como parte de uma "guerra bacteriológica".

Recentemente, sem saber que estava sendo gravado num evento, Guedes afirmou que o vírus foi causado por um "chinês" e que o país não consegue desenvolver vacinas com a mesma qualidade do que as dos americanos. Pequim reagiu dizendo que se opõe com firmeza a "qualquer tentativa de politizar e estigmatizar" a pandemia. "O vírus é o inimigo comum da humanidade", afirmou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Wang Wenbin.

Diplomacia

Conforme relatos de participantes do encontro de sexta-feira, Guedes aproveitou o momento para expor sua versão do que realmente teria ocorrido. Disse que nunca quis criticar a China e que estava enaltecendo a virtude da economia de mercado, já que os Estados Unidos - maior potência econômica mundial e onde estudou - conseguiram produzir uma vacina eficiente contra a covid-19 mesmo se tratando de um vírus que surgiu em outra região do planeta. Ele chegou a comentar com o embaixador que foi vacinado com a Coronavac - um imunizante preparado com IFA do país asiático vendido para o Brasil, mas cujo calendário de entregas está atrasado.

O governo chinês foi questionado pelas autoridades brasileiras sobre o atraso na entrega do IFA. Yang Wanming apontou questões internas de dificuldades de produção e aumento da demanda doméstica do insumo como motivos.

O embaixador também aproveitou o encontro para passar seu recado: "Por falar nisso, essas críticas ao meu país também não são boas porque estamos juntos". A reação dos brasileiros foi a de apresentar o "ruído" como fruto do trabalho da imprensa, que teria tirado as afirmações de contexto, e minimizar qualquer desgaste. Os ministros reforçaram que há uma amizade entre os dois povos e que todos são irmãos.

Sobre ser recorrente o fato de se apontar os chineses como os "criadores" do coronavírus, Yang Wanming sugeriu que os brasileiros também não se sentiriam confortáveis se fossem vistos como culpados pelo desenvolvimento da dengue e do chikungunya, enfatizando que o país asiático nunca fez uma acusação dessa natureza contra o País.

Reaproximação

Os participantes consultados pelo Estadão/Broadcast saíram do encontro com a avaliação de que houve uma reaproximação entre as duas partes. A própria presença de Guedes no encontro foi avaliada como importante por mais dois outros motivos: seria um respaldo financeiro para o Ministério da Saúde, com a indicação de que o governo vai "investir muito" no setor, e também para enfatizar o interesse de manter relações comerciais com país asiático.

A China é o maior parceiro comercial do Brasil desde 2009, quando desbancou o posto ocupado até então pelos Estados Unidos. Um dos participantes da conversa considerou o encontro "algo muito diplomático". A reunião ainda trouxe a expectativa de um aprofundamento nas relações comerciais dos dois países.

Estadão
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