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Combate ao discurso de ódio passa por mais educação, dizem pesquisadores

Universidade de São Paulo foi palco de evento sobre a ascensão do discurso de ódio e como combatê-lo

5 nov 2019 - 18h04
(atualizado em 6/11/2019 às 11h46)
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Em uma sociedade cada vez mais marcada pela polarização, em especial quando o assunto é política, a principal ferramenta para o combate ao discurso do ódio é a informação qualificada e a educação, concluíram os pesquisadores que se reuniram nos últimos dois dias na Universidade de São Paulo (USP) para debater soluções para combater o discurso de ódio.

No encontro, os palestrantes enfatizaram que até atitudes que parecem despretensiosas, como uma piada ou o compartilhamento de um meme no celular podem carregar preconceito e potencializar atitudes hostis.

Segundo João Pedro Favaretto Salvador, da FGV Direito, mais informação e sentimento de empatia nos interlocutores podem reduzir a efetividade do discurso. Ele descarta a possibilidade de limitar a liberdade de expressão. "Em vez de tentar limitar necessariamente o que é dito, é melhor fazer com que a audiência desse discurso seja inoculada contra ele, com empatia, com políticas que levem um grupo a entender outro grupo", disse.

Segundo Fabrício Vasconcelos Gomes, também da FGV Direito, Facebook e Twitter são responsáveis por barrar a divulgação de conteúdos sensíveis.

Para Maria Luiza Tucci Carneiro, coordenadora do Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação (LEER), da Universidade de São Paulo (USP), "quando uma democracia é frágil, o discurso de ódio surge nessas fissuras". "A melhor forma de combatermos isso é com a educação, formando pessoas capazes de interferir nessa realidade."

Estudiosa do neonazismo há quase 20 anos, a pesquisadora Adriana Dias, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), destacou que, com diferentes matizes e em distintas regiões do planeta, esse grupo tem ganhado força. "Há milhares de páginas e milhões de pessoas", disse ela, que mapeou conteúdos online em inglês, espanhol e português sobre o tema. "Precisamos fazer um esforço para levar isso a sério e compreender. E compreender não quer dizer justificar", ressaltou.

'Nazismo'

Na palestra "Nazismo reciclado", o jornalista e doutor em história social Marcos Guterman identificou a retomada de um método discursivo similar ao que embasou a ascensão e a manutenção do nazismo na Alemanha. Para o pesquisador, o sentimento "tribal" fortalecido pelas redes sociais tem alimentado esse processo na política, que tem sido cada vez mais negada.

Em sua apresentação, trouxe trechos de documentos históricos como o livro Minha Luta, de Adolf Hitler, escrito em 1925, no qual há explicações sobre o papel da propaganda. "A ideia da propaganda não é esclarecer, é não abrir espaço ao contraditório", explicou Guterman. De acordo com o pesquisador, muitas pessoas se julgam bem informadas lendo apenas títulos de redes sociais. "Perde-se a noção da realidade compartilhada, só a realidade do grupo é valida."

"O antissemitismo e o anticomunismo são armas retóricas de grande alcance porque reduzem o inimigo. O discurso anticomunista tem esse propósito - muita gente nem sabe o que é comunismo, mas isso não é relevante. O que importa é dizer que aquele que não pensa como eu é comunista."

O advogado Lucas Bulgarelli, coordenador do núcleo de pesquisa em gênero e sexualidade da secção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), apresentou uma pesquisa sobre violência nas eleições 2018. De 400 pessoas ouvidas em São Paulo, Rio e Salvador, metade respondeu que tinha sofrido algum tipo de violência, enquanto outros 78% afirmaram que conheciam alguém que passou por isso.

'Face violenta'

A agressão e o preconceito contra negros também foram questões levantadas no debate. "Hoje vemos a eclosão de uma face violenta da sociedade, vendida como amigável, mas essencialmente segregacionista, em especial a partir de critérios raciais. A questão racial é aspecto importante da violência constitutiva do nosso tecido social", destacou a historiadora Marina de Mello e Souza, livre-docente em História da África e especializada em cultura afro-brasileira. "Contra o ódio ao diferente, oferecemos o empenho na sua compreensão. Contra a violência das armas, os livros".

Estadão
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