PUBLICIDADE

Covid: alta de infecções em vacinados na Índia alerta mundo para risco de variantes

A Índia vacinou totalmente apenas 2,5% de sua população, mas os casos de descoberta de vacinas parecem estar aumentando.

13 mai 2021 - 10h52
Compartilhar
Exibir comentários
Pallava Bagla (à direita) foi infectado e hospitalizado semanas depois de ter sido totalmente vacinado
Pallava Bagla (à direita) foi infectado e hospitalizado semanas depois de ter sido totalmente vacinado
Foto: PALLAVA BAGLA / BBC News Brasil

Três semanas depois de ter sido totalmente vacinado contra o coronavírus, um jornalista de ciências de Nova Déli desenvolveu febre alta, dor de garganta e uma sensação geral de desconforto.

Em 22 de abril, Pallava Bagla testou positivo para o coronavírus. Quatro dias depois, um exame de imagem do tórax mostrou seus pulmões claros ficando brancos, um sinal de infecção.

Como a febre persistiu, ele foi internado no hospital — seis dias após seus primeiros sintomas.

No All India Institute of Medical Sciences, os médicos submeteram Bagla, de 58 anos, a exames de sangue e administraram esteroides. Como ele tinha uma doença subjacente (diabetes) o nível de açúcar no sangue disparou. Felizmente, seus níveis de oxigênio nunca caíram para patamares perigosos.

Antes de deixar o hospital, após oito dias, os médicos mostraram-lhe uma tomografia dos pulmões de um paciente diabético, não vacinado, do sexo masculino com covid-19 de sua idade, e compararam com a sua tomografia.

"A diferença era clara. Os médicos me disseram que, se eu não tivesse tomado a vacina, provavelmente teria que ser colocado no respirador em cuidados intensivos. A vacinação completa e na hora certa salvou minha vida", disse Bagla.

Embora a Índia tenha vacinado totalmente 2,5% de seus 1,3 bilhão de habitantes, os casos de pessoas que contraíram a infecção duas semanas após serem totalmente vacinadas parecem estar aumentando.

Apenas 2,5% da população da Índia foi totalmente vacinada
Apenas 2,5% da população da Índia foi totalmente vacinada
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Os profissionais de saúde — médicos, enfermeiras, funcionários de hospitais e clínicas — foram os mais afetados por essas infecções até agora. O paciente Bagla parecia ser uma exceção à regra. Por isso os cientistas tiraram amostras de seu nariz e garganta para decifrar o código genético do vírus que o infectou.

O objetivo é encontrar respostas para uma questão que intriga os cientistas: nossas vacinas existentes — duas no caso da Índia — estão nos protegendo o suficiente de variantes mais novas e frequentemente mais transmissíveis do coronavírus?

As vacinas contra o coronavírus são indiscutivelmente eficazes. Embora não previnam a infecção, elas protegem as pessoas contra doenças graves e morte mesmo pelas variantes mais perigosas do vírus.

Portanto, as infecções em pessoas vacinadas não são totalmente inesperadas.

Dos 95 milhões de pessoas totalmente vacinadas nos EUA até 26 de abril, 9.045 tiveram infecções por coronavírus, de acordo com os Centros para Controle e Prevenção de Doenças (CDC).

Segundo os dados 835 pessoas (9%) foram hospitalizadas e 132 (1%) morreram. Quase um terço dos pacientes hospitalizados e 15% das mortes foram relatados como "assintomáticos ou não-relacionados à covid-19".

Com dados insuficientes, as evidências que surgem na Índia ainda são inconclusivas.

Há relatos de um número crescente de profissionais de saúde contaminados após terem sido totalmente vacinados, e até mesmo de algumas mortes. Mas não se sabe se foi a infecção que causou diretamente as mortes.

As taxas de vacinação diminuíram devido à escassez de doses
As taxas de vacinação diminuíram devido à escassez de doses
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Números oficiais afirmam que de duas a quatro pessoas em cada 10 mil vacinadas na Índia tiveram uma infecção após serem imunizadas. Mas os dados parecem incompletos: durante três meses, muitos que faziam testes não estavam sendo questionados sobre se haviam sido vacinados.

Os dados dos hospitais são confusos.

Vincent Rajkumar, professor da Clínica Mayo nos EUA, disse que conversou com dois grandes hospitais estatais em Tamil Nadu, no sul da Índia, e descobriu que uma "pequena fração" de seus funcionários vacinados contraíram a infecção. "Os poucos que tinham contraído se recuperaram rapidamente", disse-me ele.

Por outro lado, 60% dos médicos na unidade de terapia intensiva do Hospital Lok Nayak Jai Prakash Narayan (LNJP), o maior hospital covid-19 de Delhi, foram infectados após serem totalmente vacinados, mas nenhum exigiu hospitalização, de acordo com Farah Husain, especialista em cuidados intensivos. "Alguns familiares seus ficaram doentes e precisaram de hospitalização", disse ela.

Um estudo em outro hospital de Nova Déli, o Fortis C-DOC, descobriu que 15 dos 113 profissionais de saúde vacinados contraíram a infecção duas semanas após a segunda dose. Quatorze dos casos foram leves e apenas um necessitou de hospitalização.

"Estamos observando muitas infecções repentinas entre os profissionais de saúde. Mas a maioria delas são leves. As vacinas estão bloqueando infecções graves", disse Anoop Misra, endocrinologista e coautor do estudo.

Índia está se recuperando de uma segunda onda mortal de infecções
Índia está se recuperando de uma segunda onda mortal de infecções
Foto: EPA / BBC News Brasil

Testes feitos em seis profissionais de saúde totalmente vacinados infectados posteriormente no Estado de Kerala foram recentemente sequenciados para um estudo.

Dois dos pacientes foram infectados por variantes que continham mutações que contornavam a imunidade do corpo, mas nenhum dos casos desenvolveu doença grave, de acordo com Vinod Scaria, geneticista e um dos autores do estudo.

Cientistas dizem que a Índia precisa de muito mais dados para verificar a prevalência dessas infecções na população em geral e para descobrir mais sobre como as vacinas estão funcionando.

"A pergunta que as pessoas agora fazem com frequência é se é verdade que um grande número de pessoas está se infectando novamente após as vacinas", disse o virologista Shahid Jameel.

"Esses relatos anedóticos causam muita angústia nas mentes das pessoas que querem ser vacinadas".

A maior preocupação é que as taxas diárias de vacinação na Índia estão caindo e a imunidade de rebanho parece estar longe. A imunidade de rebanho ocorre quando uma grande parte da comunidade se torna imune a uma doença por meio da vacinação ou da disseminação em massa da doença. A relutância contra vacina pode piorar as coisas.

Os especialistas temem que a segunda onda mortal e descontrolada da Índia torne mais fácil a mutação do vírus, com os mais contagiosos provavelmente escapando da imunidade oferecida pelas vacinas.

O sequenciamento para rastrear mutações virais continuará sendo a chave para se preparar para futuras ondas de infecção.

Muitos países confiaram bastante na produção da vacina Covidshield, como é conhecida a AstraZeneca na Índia
Muitos países confiaram bastante na produção da vacina Covidshield, como é conhecida a AstraZeneca na Índia
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O resultado final, dizem os cientistas, é que as vacinas — com vários graus de eficácia — protegem contra doenças graves e hospitalização.

Mas, uma vez que as pessoas totalmente vacinadas ainda podem ser infectadas e infectar outras pessoas, os cuidados não devem ser reduzidos — usar máscaras, evitar reuniões sociais com muita gente e locais de trabalho mal ventilados e com ar condicionado — por muito tempo.

O uso de máscaras duplas, por exemplo, deve ser tornado obrigatório, como fez o Estado indiano de Kerala. As mensagens de saúde pública, que têm sido bastante confusas até agora, têm de ser mais precisas: pessoas totalmente vacinadas, por exemplo, podem se reunir livremente em ambientes fechados, em casas e locais de trabalho?

"As vacinas funcionam. Mas não permitem que você seja imprudente e baixe a guarda. Você deve ser muito cauteloso", diz Bagla. Ele, de todas as pessoas, sabe bem do que está falando.

BBC News Brasil BBC News Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização escrita da BBC News Brasil.
Compartilhar
TAGS
Publicidade
Publicidade