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Corvos utilizam a memória para fabricar e adaptar ferramentas, dizem cientistas

Estudo feito por grupo internacional revela que aves lembram do desenho de artefatos utilizados por outros corvos e são capazes de aprimorá-los; segundo autores, aves fazem transmissão cultural por um processo de combinação de modelos mentais

28 jun 2018 - 11h03
(atualizado às 11h27)
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Os corvos da Nova Caledônia (Corvus moneduloides) já são bem conhecidos por sua capacidade de utilizar ferramentas para buscar comida. Agora, um novo estudo internacional mostra que os essas aves também empregam a memória para recriar ferramentas e adaptá-las a tarefas específicas.

De acordo com os cientistas, ao se lembrar de um desenho específico de ferramenta já observado, os corvos são capazes de reproduzi-lo para fazer suas próprias ferramentas, levando esses desenhos a uma evolução - o que indicaria uma potencial capacidade de transmissão cultural. "Os corvos da Nova Caledônia têm a capacidade cognitiva para combinar modelos mentais", disseram os cientistas.

O uso de ferramentas é considerado um comportamento raro entre animais, que ocorre em menos de 1% dos gêneros. Entre as aves, além dos corvos, só os tentilhões dos Galápagos e uma espécie de abutre são capazes da façanha. Em 2016, um estudo mostrou que os corvos do Havaí também usam ferramentas. Já a capacidade de recriar e modificar itens a partir da memória é uma característica raramente associada a qualquer animal exceto os humanos.

No ano passado, uma pesquisa revelou também que os corvos também conseguem fazer planos e abrir mão de uma recompensa imediata para obter outra mais vantajosa mais tarde - outra característica só observada antes em humanos e macacos.

De acordo com os autores do novo estudo, publicado nesta quinta-feira, 28, na revista Scientific Reports, os resultados indicam que os corvos da Nova Caledônia podem ser capazes de aprimorar suas próprias ferramentas ao longo do tempo, utilizando a memória para recriar e modificar os "designs" dos artefatos feitos por outros corvos.

Para realizar o estudo, os cientistas deram a 8 corvos cartões de diferentes tamanhos e os treinaram a inserir os cartões em um distribuidor de comida para receber recompensas. O prêmio, porém, só era liberado quando as aves utilizavam um cartão de um tamanho específico.

Depois que as aves aprenderam a reconhecer o tamanho certo dos cartões, os pesquisadores deram a eles cartões grandes, sendo que nenhum deles tinha o tamanho correto para receber a recompensa. As aves não receberam nenhum modelo físico do tamanho de cartão que permitia receber o prêmio.

Os corvos, porém, usaram a memória e rasgaram os cartões até deixá-los do tamanho certo para receber suas recompensas. Segundo os autores, isso indica que esses animais são capazes de formar imagens mentais dos desenhos de suas ferramentas.

Segundo os autores do estudo, os corvos da Nova Caledônia são conhecidos pela capacidade de produzir ferramentas como varetas simples, varetas em forma de ganchos e ferramentas farpadas a partir de folhas de plantas. No entanto, até agora não estava claro se as aves aprendem a fazer o desenho de suas ferramentas com outros corvos, nem se esses desenhos são aprimorados com o tempo.

Embora os corvos da Nova Caledônia, em contexto natural, não pareçam observar de perto, nem imitar o processo de fabricação, desenhos específicos de ferramentas feitas por corvos que vivem em diferentes áreas persistem por várias décadas e são aprimorados com o tempo. Segundo os cientistas, isso sugere que a capacidade de fazer ferramentas, de alguma forma, espalha-se pelas populações de corvos.

"A evolução cultural cumulativa ocorre quando tradições sociais acumulam aprimoramentos ao longo do tempo. No caso dos humanos, acredita-se que essa evolução cultural depende de um conjunto único de capacidades cognitivas, incluindo o ensino, a linguagem e a imitação. Os corvos da Nova Caledônia mostram alguns traços de cultura cumulativa, mas isso é controverso, porque essas aves não parecem imitar as outras", escreveram os pesquisadores.

Uma das hipóteses para explicar a transmissão e evolução dos desenhos de ferramentas dos corvos da Nova Caledônia, segundo os cientistas, era a de que essas aves fariam a transmissão cultural por um processo de combinação de modelos mentais.

"Isto é, os indivíduos poderiam usar ou observar ferramentas dos outros corvos e reproduzi-las da sua própria forma - um processo análogo ao que as aves usam para aprender a cantar. Assim, ao se lembrar de um desenho específico de ferramenta, os corvos são capazes de reproduzi-lo para fazer suas próprias ferramentas", diz o estudo.

O experimento, segundo os cientistas, reforça essa hipótese. "Obtivemos uma primeira evidência dessa hipótese ao demonstrar que os corvos da Nova Caledônia têm a capacidade cognitiva para a combinação de modelos mentais", disseram os cientistas.

Estadão
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