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Após 100 anos, cientistas tentam provar teoria de Einstein que embasa leis da Física

25 nov 2015 - 18h08
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Na zona rural da Itália, perto da cidade de Pisa, um grande experimento está quase sendo colocado em prática.

Se for bem-sucedido, uma das célebres previsões de Albert Einstein será observada diretamente pela primeira vez.

Se falhar, leis da Física poderão ter de ser reconsideradas.

O aparelho responsável pelo experimento se chama Advanced Virgo ("Virgo avançado", em tradução livre), e buscará a prova de um dos fenômenos astrofísicos mais enigmáticos.

"Talvez tenhamos a primeira oportunidade de detectar ondas gravitacionais na Terra", explica Franco Frasconi, da Universidade de Pisa e membro da equipe internacional do Projeto Virgo.

"Seria uma demonstração clara de que o que (Einstein) disse há 100 anos está absolutamente correto."

Em 25 de novembro de 1915, Albert Einstein apresentou à Academia Prussiana de Ciências a versão final de suas equações de campo, que descrevem como a matéria produz gravidade e a influência da gravidade sobre a matéria.

As equações sustentavam sua Teoria da Relatividade Geral – pilar da física moderna que transformou nosso entendimento do espaço, do tempo e da gravidade.

A partir daí, um leque de conhecimento se abriu – da expansão do Universo ao movimento dos planetas, passando pela existência de buracos negros.

Mas Einstein também propôs a presença de ondas gravitacionais, basicamente feixes de energia que distorcem o tecido do espaço-tempo, o conjunto de quatro dimensões formado por tempo e espaço tridimensional.

Pense nesse fenômeno mais ou menos como as ondas que se formam quando jogamos uma pedra em um lago.

Qualquer objeto com massa deveria gerar essas ondas quando está em movimento. Até nós mesmos. Quanto maior a massa, mais intenso será o movimento, e maiores serão as ondas.

Einstein previu que o Universo estava inundado por essas ondas.

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Feixes no tecido do espaço-tempo

  • As ondas são uma consequência inevitável da Teoria da Relatividade Geral
  • Sua existência foi prevista pela ciência, mas nunca foi detectada diretamente
  • São feixes no tecido do espaço-tempo, produzidos por eventos bruscos
  • Aceleração de massas produz ondas que se propagam na velocidade da luz
  • Fontes detectáveis dessas ondas deveriam incluir buracos negros em fusão e estrelas em explosão
  • O aparelho Virgo rebate raios laser em enormes túneis; as ondas deveriam interferir na luz
  • A detecção das ondas abre um novo campo de investigações do Universo

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Enquanto astrônomos possuem provas indiretas da existência das ondas, ainda não foi possível ter uma amostra dessas curiosidades cósmicas.

O físico Toby Wiseman, do Imperial College de Londres, afirma não se surpreender pelo fato de o fenômeno ainda não ter sido observado diretamente.

"A gravidade é a mais fraca da forças, e até fontes astrofísicas dramáticas emitem apenas ondas gravitacionais fracas."

Aposta italiana

Agora pesquisadores na Itália esperam encontrar essas ondas. Mas não será fácil.

A primeira versão do projeto Virgo foi posta em prática em 2007 – e não encontrou nada. O mesmo ocorreu com um experimento semelhante nos Estados Unidos, o Ligo (sigla em inglês para Observatório de Ondas Gravitacionais com Interferômetro a Laser).

As duas máquinas – chamadas interferômetros – agora passaram por caras melhorias, e as equipes esperam avanços em sensibilidade que podem ser a chave para o sucesso.

"A tecnologia necessária para detecção de ondas gravitacionais só se tornou disponível hoje. Nos últimos dez anos, desenvolvemos uma tecnologia muito sofisticada para construir esse tipo de interferômetro", diz Frasconi.

Os cientistas pretendem detectar as mínimas distorções criadas quando ondas gravitacionais passam pela Terra. Eles esperam observar as ondas que emanam de eventos cósmicos violentos, como estrelas explodindo e buracos negros em colisão.

O detector Virgo é formado por dois túneis idênticos de 3 km, numa gigantesca formação em L. Um feixe de laser é gerado e dividido em dois – uma metade é disparada em um túnel, e a outra entra pela segunda passagem.

Espelhos ao final dos dois túneis rebatem os feixes para lá e para cá muitas vezes, antes que se recombinem.

Experimento possui braços de 3 km de extensão para projeção de lasers
Experimento possui braços de 3 km de extensão para projeção de lasers
Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil

Isso pode parecer complexo, mas se baseia em uma propriedade conhecida dos lasers, que são feixes intensos de luz – e a luz é uma onda.

Imagine se duas ondas no oceano se chocarem, uma no alto, e outra por baixo: as ondas se anulariam.

O mesmo ocorre dentro do equipamento. E se as ondas percorrerem exatamente a mesma distância dentro dos dois túneis, elas podem se cancelar, produzindo nenhum sinal.

No entanto, quando uma onda gravitacional passa pelo túnel, espera-se que ela distorça o seu entorno de maneira muito sutil, alterando o comprimento dessas passagens em uma fração de átomo.

E o modo como as ondas se movem pelo espaço e pelo tempo significa que um túnel seria esticado e outro, espremido, o que resultaria em um laser viajando uma distância um pouco maior, enquanto o outro teria uma jornada mais curta.

Como resultado disso, os feixes se recombinariam de uma forma diferente: as ondas de luz iriam interferir entre si, em vez de se cancelar – e os cientistas detectariam um sinal.

Houve grandes esforços para isolar esses experimentos de interferências comuns da Terra, como ruídos de tráfego e terremotos.

"É uma questão de construir uma máquina para evitar barulho. A máquina está ancorada no solo, e o solo costuma vibrar. O maior desafio do Virgo foi isolar os espelhos. Gastamos muito tempo para desenvolver um pêndulo que isolasse os espelhos dos ruídos sísmicos", diz Frasconi.

Mas um sinal captado na Itália não será suficiente.

Se uma onda gravitacional for identificada lá, o aparelho Ligo, nos EUA, que possui o mesmo modelo do Virgo, porém com detectores de 4 km, também deveria ver o sinal. E outro aparelho menor na Alemanha.

O Ligo já está funcionando nos EUA, e pesquisadores esperam ligar o Virgo no final deste ano.

As equipes trabalham em conjunto e estão tão confiantes que já projetam 1º de janeiro de 2017 como o dia de um avanço histórico.

A previsão pode ser um pouco ousada, mas Frasconi, que trabalha nessa área há 20 anos, se diz confiante sobre o fim dessa busca.

"Neste momento é extremamente importante detectar ondas gravitacionais pela primeira vez na Terra. Se isso não ocorrer, não teremos as informações certas, o conhecimento correto do resto do Universo."

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Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil
  • Um laser é produzido dentro da máquina e sua luz é dividida em dois feixes
  • Os feixes se rebatem em espelhos
  • Eventualmente, as fontes de luz se recombinam e são enviadas a um detector
  • Ondas gravitacionais passando pelo aparelho deveriam perturbar o aparelho
  • A teoria prevê que as ondas deverão esticar e espremer seu espaço de maneira muito sutil
  • Isso se demonstraria nos comprimentos dos braços de luz
  • O detector de luz identificaria esse sinal no laser recombinado

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E se não funcionar?

Caso as ondas não apareçam, será um indicativo de que os experimentos precisarão ser redesenhados. E, em ultima análise, talvez os físicos tenham que repensar o funcionamento do Universo.

Mas uma observação direta irá abrir uma nova janela para o cosmos – uma que não teria sido possível sem Einstein.

Wiseman, do Imperial College de Londres, diz que observar ondas gravitacionais seria "uma confirmação fantástica do nosso entendimento sobre a relatividade geral".

"Temos boas razões para acreditar que elas existam, mas não podemos ter certeza de que entendemos a relatividade geral até identificarmos diretamente esses feixes no espaço e no tempo. Observá-las abriria o caminho para novos modos de testar a relatividade geral, mas também nos daria uma ferramenta completamente nova para observar alguns dos objetos mais fascinantes do Universo."

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