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Busca da PF contra líder do governo gera embate entre Senado e STF

Luís Barroso, do STF, autoriza ação da Polícia Federal no gabinete do líder do governo, Fernando Bezerra, acusado de receber propina; Alcolumbre contesta operação

19 set 2019 - 21h50
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BRASÍLIA - A operação da Polícia Federal, autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, que vasculhou nesta quinta-feira, 19, gabinetes do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), abriu uma nova crise entre os Poderes. Após a ação, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), reagiu e disse que questionará a ofensiva na Corte.

Bezerra e seu filho, o deputado Fernando Coelho Filho (DEM-PE) - também alvo da operação -, são suspeitos de receberem R$ 5,538 milhões em propinas, segundo a PF.

Alcolumbre, porém, contestou a realização de busca e apreensão nos gabinetes da liderança do governo e do parlamentar - na época dos fatos investigados, Bezerra não tinha mandato de senador. A Procuradoria-Geral da República havia se manifestado contrária a essa medida, solicitada pela PF.

O episódio desgastou as já conturbadas relações entre STF e Senado. Dentro da Casa, parlamentares pressionam Alcolumbre para autorizar a criação de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar ministros do tribunal - a CPI da Lava Toga. Outro foco de tensão são os pedidos de impeachment protocolados no Senado contra integrantes da Corte.

A ação da Polícia Federal que teve como alvo Fernando Bezerra Coelho pegou de surpresa senadores, que manifestaram preocupação com o futuro da articulação política do Planalto na Casa e com uma eventual saída de Bezerra do cargo.

Após colocar o cargo à disposição do presidente Jair Bolsonaro, Fernando Bezerra foi até à residência de Alcolumbre para tentar esclarecer os fatos da investigação. Os senadores Tasso Jereissati (PSDB-CE) e José Serra (PSDB-SP) também participaram da conversa.

Alcolumbre se disse surpreso com a investigação e com a ação da PF no Senado. Ele ainda criticou o fato de a busca ter sido determinada individualmente por Barroso.

Bolsonaro não se manifestou sobre o assunto, nem em redes sociais nem na live que costuma fazer às quintas-feiras.

Apesar das críticas dos senadores, há precedentes na Corte. Ministros do STF já autorizaram em decisões monocráticas operações de busca e apreensão nas dependências do Congresso.

Em 2017, por exemplo, o relator da Operação Lava Jato, ministro Edson Fachin, autorizou a atuação de policiais federais nos gabinetes de Lúcio Vieira Lima (MDB-BA) e de Rocha Loures (MDB-PR), que na época eram deputados federais.

"A drástica interferência foi adotada em momento político em que o Congresso Nacional discute a aprovação de importantes reformas e projetos para o desenvolvimento do país. Mostra-se, desse modo, desarrazoada e desnecessária, em especial pela ausência de contemporaneidade, pois os fatos investigados ocorreram entre 2012 e 2014", criticou o presidente do Senado em nota.

Mais cedo, em declaração a jornalistas, Alcolumbre afirmou considerar a ação de ontem uma "diminuição do Senado Federal". "Eu não vou deixar que isso aconteça."

Alcolumbre e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foram avisados da operação pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, e colocaram a Polícia Legislativa à disposição da PF, medida considerada de praxe.

Os policiais passaram a manhã nos gabinetes de Bezerra, no Senado, e no de Fernando Filho, na Câmara. No encontro com o senador, o presidente da Casa manifestou solidariedade ao líder do governo.

Ofensiva contra Bezerra é 'puramente técnica e republicana', diz Barroso

Em nota divulgada após as críticas de Alcolumbre, Barroso disse que a decisão "foi puramente técnica e republicana" e que a investigação de fatos criminosos pela PF e a supervisão de inquéritos policiais pelo STF "não constituem quebra ao princípio da separação de poderes, mas puro cumprimento da Constituição".

"A providência de busca e apreensão é padrão em casos de investigação por corrupção e lavagem de dinheiro. Fora de padrão seria determiná-la em relação aos investigados secundários e evitá-la em relação aos principais", escreveu Barroso.

A ação autorizada pelo ministro foi deflagrada com base em diversos elementos, incluindo três colaborações premiadas de investigados pela Operação Turbulência - entre eles, o empresário João Lyra, dono da aeronave envolvida no acidente aéreo em que o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB) foi vitimado em 2014.

A PF apresentou registros de transações bancárias para demonstrar a transferência de recursos aos investigados, bem como outros elementos de prova que indicam o recebimento dos valores, entre 2012 e 2014, pagos por empreiteiras, em razão das funções públicas exercidas pelos parlamentares.

Também foi juntada uma gravação de conversa entre um delator um operador que discutiam a forma de pagamento de um empréstimo. Barroso determinou a realização de buscas em 52 endereços, incluindo empresários, intermediários, operadores, 'laranjas' e outros citados na investigação.

Advogado de líder do governo aponta retaliação e cita Moro

O advogado André Callegari, que defende Bezerra, classificou a operação como uma retaliação pela atuação do parlamentar contra abusos de órgãos de investigação. "Primeiro, teve uma declaração dele (Bezerra) sobre o Moro ser esquecido", disse Callegari, ao citar frase do senador ao Estado, de que, uma vez fora do governo, o ex-juiz da Lava Jato poderia ser esquecido em 60 dias.

Callegari aponta "uma retaliação no contexto político de tudo que está acontecendo". "O senador tem defendido a não abertura da CPI da Lava Toga, tem sido incisivo em alguns pontos relativos a investigações sem prova robusta. Ele tem criticado a atuação de auditores da Receita em relação a fatos aos quais eles não têm atribuição", disse o advogado.

Estadão
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