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Política

RS: governo sustenta calote de quase meio bilhão para saúde

Pressionado pelos credores, governador José Ivo Sartori não dá prazo para a quitação e chegou a cogitar ignorar a dívida, sob o argumento de que foi deixada pela administração anterior

29 jan 2015 - 18h55
(atualizado em 30/1/2015 às 10h19)
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Com débitos de R$ 498 milhões com prefeituras, hospitais e fornecedores da área da Saúde, o governador gaúcho, José Ivo Sartori (PMDB), quer protelar ao máximo os pagamentos. O governo chegou a considerar a hipótese de ignorar as dívidas, argumentando que elas são de 2014, portanto, deixadas pelo antecessor, e que Tarso Genro (PT) não fez empenho de quase a totalidade dos valores. Porém, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) alertou que isso não desobriga o Estado de quitar o que deve.

“Se não houve empenho, isso não afasta o direito dos municípios de receberem valores que tiverem sido comprovadamente acertados”, disse o diretor de Controle e Fiscalização do TCE, Leo Arno Richter, em reunião com prefeitos. O TCE orienta as prefeituras a encaminharem documentações que atestem o comprometimento do Estado, tais como convênios, atas ou planos de trabalho. 

O governo reagiu politicamente, ventilando a informação de que poderá pedir à Assembleia Legislativa autorização de suplementação especial ao orçamento para pagar as contas. Mas, na prática, a situação continua na mesma. Apesar da pressão dos credores, o governo não dá prazo para a quitação dos atrasados. "Imagino que chegará o tempo em que, de forma parcelada, possamos pactuar o pagamento e o resgate desse passivo. Hoje não temos como", desconversa o secretário estadual da Fazenda, Giovani Feltes.

Do total devido, R$ 210,5 milhões são das despesas de dezembro. A justificativa do Executivo sobre o não pagamento de dezembro também é frágil. O governo sustenta que a conta do último mês do ano é uma pendência da gestão Tarso. O problema é que, como ocorre com outros serviços, despesas efetuadas em um mês em geral são pagas no seguinte e, por vezes, até depois, independentemente de trocas de governo. Prefeituras, hospitais filantrópicos e Santas Casas garantem que não têm como arcar com o calote. Se ele for mantido, os serviços podem ser interrompidos, começando por urgências e emergências.

Até agora, somente os hospitais receberam parte dos valores do último mês de 2014 (R$ 80 milhões, na semana passada). As prefeituras, para quem o Estado deve um total de R$ 163,9 milhões, estão com todo o montante em aberto. O secretário estadual da Saúde, João Gabbardo, argumenta que, comparados aos incentivos recebidos pelo setor nos últimos dois anos, os repasses devidos são muito pequenos, e que, com alguns ajustes, os gestores teriam condições de absorver os valores.

Gabbardo cita que as despesas correntes da Saúde chegaram a R$ 1,7 bilhão em 2014, já descontados os gastos com pessoal, praticamente o dobro de 2012, quando foram de R$ 933 milhões. O secretário se compromete a efetuar os pagamentos em dia daqui para a frente e avisou a prefeituras e gestores que vai reavaliar parte significativa dos contratos de 2015. Segundo os dados da Saúde, o governo tem contratado com o setor para este ano um montante de R$ 1,5 bilhão. Mas a previsão orçamentária é de pouco menos de R$ 1 bilhão. O presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes, Religiosos e Filantrópicos do RS, Julio de Matos, usa o mesmo argumento da progressão dos valores para rebater. “Houve um grande avanço no quesito recursos para a Saúde. O problema é justamente regredir deste processo.”

Na quarta-feira, Gabbardo reuniu-se com representantes da Federação para acalmar o setor. Ficou acertado um novo encontro para 9 de fevereiro, no qual deverá ser apresentado um cronograma de pagamentos sobre 2015. Mas não houve avanços sobre os valores de 2014. “Vamos fazer novas análises orçamentárias, mas não há como absorvermos a dívida. O Estado precisa assumir sua responsabilidade”, adianta Matos.

Entenda a crise

Sob a justificativa das dificuldades financeiras do Estado, o governo Sartori tem mantido em aberto o pagamento de uma dívida de quase R$ 500 milhões na área da Saúde. Os valores envolvem repasses para programas, convênios e a quitação de débitos com fornecedores, prefeituras, hospitais filantrópicos e Santas Casas. O atual governo e o anterior divergem a respeito do tamanho do rombo.

Gestores da saúde, contudo, não estão interessados na disputa política e ficam inseguros com as idas e vindas do governo a respeito dos pagamentos. Primeiro, Sartori baixou um decreto de corte de despesas (o 52.230), que, entre outras medidas, vedou por 180 dias o pagamento de despesas anteriores, causando alvoroço no setor. Logo depois, o governador assegurou que as chamadas áreas essenciais, como saúde, educação e segurança, não seriam afetadas. Mas os pagamentos não vieram. Depois, começou a discussão sobre os débitos de dezembro.

Os hospitais receberam uma parte, mas outubro e novembro continuaram em aberto. As prefeituras tiveram a garantia de que também teriam os valores de dezembro. Mas, para os municípios, o pagamento foi adiado três vezes e depois suspenso.

As dívidas com hospitais

No RS, onde sete milhões de pessoas dependem exclusivamente do SUS, as Santas Casas e hospitais filantrópicos respondem por 70% do atendimento. Conforme a federação que representa as instituições, são 245 estabelecimentos em 220 municípios. A dívida com os hospitais em relação a 2014 era de R$ 230,1 milhões. O governo pagou R$ 80 milhões de dezembro e o restante segue em aberto. Quanto a 2015, do total de R$ 1,5 bilhão contratados, pelo menos R$ 1 bilhão são com as Santas Casas e filantrópicos: R$ 300 milhões a título de cofinanciamento e mais R$ 60 milhões ao mês para programas. O governo estuda também estes contratos. “O secretário quer analisar uma série de contratos. Concordamos. Mas não acreditamos que seja possível uma redução significativa no segmento hospitalar filantrópico”, diz o presidente da Federação das Santas Casas, Julio de Matos. O governo pediu prazo até 9 de fevereiro para apresentar proposta sobre 2015.

As dívidas com prefeitura

O Estado deve R$ 163,9 milhões para os municípios. As prefeituras acrescentam à conta o saldo decorrente de valores não repassados a administrações inscritas no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados (Cadin), equivalente a R$ 45 milhões, o que eleva os valores para R$ 208,9 milhões. E a Secretaria da Fazenda questiona os prefeitos sobre por que só agora estão cobrando publicamente os repasses atrasados.

A Federação das Associações de Municípios do RS (Famurs) entregou ao titular da Fazenda, Giovani Feltes, uma proposta de negociação: pagamento imediato das despesas de dezembro (R$ 45,7 milhões); parcelamento em seis vezes, a partir de fevereiro, do saldo restante; reconhecimento oficial dos débitos, empenhando os valores devidos; e pagamento das contas de 2015 em dia. Feltes disse que os repasses de 2015 não terão atraso e que mais cedo ou mais tarde (pode ser mais tarde), o governo encaminhará o pagamento da dívida do ano passado.

As dívidas com fornecedores

Despesas com fornecedores variados, que incluem serviços como manutenção e entrega de medicamentos, somam R$ 103,8 milhões, sendo R$ 49,8 milhões referentes a dezembro. O governo não dá qualquer previsão de pagamento.

Fonte: Especial para Terra
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