Pai de ministro é indenizado por perseguição na ditadura
22 mai2012 - 16h02
(atualizado às 16h25)
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Diogo Alcântara
Direto de Brasília
A Comissão de Anistia decidiu por unanimidade, nesta terça-feira, indenizar e oferecer um pedido formal de desculpas do Estado brasileiro a Anivaldo Padilha, pai do ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Anivaldo é evangélico e foi delatado por membros da igreja que frequentava. Ele foi preso e torturado e, em seguida, exilou-se.
Segundo proposta da relatora Carolina de Campos Melo, a indenização será o pagamento de R$ 2.484, referente ao salário de um redator de jornal, cargo que Padilha ocupava quando foi preso em 1970. Além disso, ele receberá o pagamento de quase R$ 230 mil retroativo a 2005, quando entrou com o requerimento. Anivaldo Padilha é membro da igreja Metodista e era contratado pela instituição na publicação de uma revista.
Enquanto esteve preso, durante alguns meses em 1970, Padilha foi torturado. Entre o período em que foi solto e o início do exílio, em 1971, ele viveu em um período de clandestinidade com sua esposa. Foi quando ela ficou grávida de Alexandre Padilha, hoje ministro da Saúde.
"Foi uma dor o fato de ter sido privado de ter convivido com meu filho, Alexandre Padilha, durante a infância, importante período", disse Anivaldo em discurso emocionado durante a sessão de julgamento. Ele retornou ao Brasil apenas em 1979, quando Alexandre Padilha tinha oito anos.
"Minha saída do Brasil foi talvez muito mais dolorosa do que as torturas que eu sofri. No período da clandestinidade, minha companheira ficou grávida. Chegou um momento em que o cerco foi se fechando, havia uma possibilidade em que eu não só seria preso, mas talvez morto", relatou, em outro momento.
Anivaldo Padilha entrega nomes de torturadores à Comissão da Verdade
Anivaldo Padilha decidiu enviar os nomes de torturadores dos extintos Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e da Operação Bandeirantes (Oban) à Comissão da Verdade. Ele defende a reinterpretação da Lei de Anistia e deseja que seus algozes sejam submetidos a julgamento.
"Nós temos no Brasil uma tradição de impunidade (...). Se os crimes cometidos pelo Estado Novo tivessem sido investigados e os torturadores e assassinos, punidos, talvez o golpe de 64 não tivesse ocorrido", acredita Anivaldo.
Recém-instalada pela presidente Dilma Rousseff, a Comissão da Verdade terá dois anos para investigar crimes contra direitos humanos cometidos entre 1946 e 1988.
"Não é uma questão de punir pensando no passado, mas é punir pensando no futuro, porque os torturadores continuam nas prisões e delegacias de todo o País, pois sabem que podem ficar impunes", argumentou.
Padilha não se lembra do nome de todos os torturadores. Ele citou alguns pela forma como eram conhecidos: Capitão Albernaz (que teria falecido), Capitão Coutinho, Capitão Guimarães, Capitão Homero e delegado Baeta. "Isso é algo que, mesmo passados 40 anos, tenho certeza de que os reconheceria", garante.
A Comissão da Verdade foi criada pela Presidência para esclarecer violações de direitos humanos durante a ditadura militar. Os sete integrantes foram convidados pessoalmente pela presidente Dilma Rousseff. Com a ajuda de 14 auxiliares, eles terão a missão de ouvir depoimentos em todo o País, requisitar e analisar documentos que ajudem a esclarecer os fatos da repressão militar. O prazo para o trabalho de investigação é de dois anos. Conheça cada um dos membros da comissão:
Foto: Terra
Gilson Dipp - É ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) desde 1998 e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desde 2011. Também preside a comissão designada pelo Senado para elaborar um novo Código Penal. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, foi corregedor-nacional de Justiça de 2008 a 2010 e presidente da comissão designada pelo Senado para elaborar um novo Código Penal
Foto: Elza Fiúza / Agência Brasil
João Paulo Cavalcanti Filho - Graduado em Direito, atua como advogado, escritor e consultor. Foi presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), autarquia vinculada ao Ministério da Justiça Brasileiro. Também atuou como ministro interino da Justiça no governo José Sarney e secretário-geral do Ministério da Justiça
Foto: José Cruz / Agência Brasil
Rosa Maria Cardoso da Cunha - Doutora em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj), é advogada criminalista, professora e escritora. Amiga de Dilma, foi advogada da presidente durante a ditadura militar. Também foi membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (de 1999 a 2002) e subsecretária de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (de 1991 a 1994)
Foto: Rogerio Arcuri/Arquivo Pessoal / Especial para Terra
Paulo Sérgio Pinheiro - Professor, escritor e consultor, é relator da Infância da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Doutor em Ciência Política pela Université de Paris I, foi secretário especial de Direitos Humanos e relator do Programa Nacional de Direitos Humanos. Atuou como relator da ONU para a Situação dos Direitos Humanos em Burundi (1995-1998) e em Myanmar (2000-2008), e foi um dos representantes da sociedade civil na preparação do projeto da Comissão da Vrdade
Foto: Reuters
Cláudio Fonteles - Foi procurador-geral da República de 2003 a 2005, no governo Lula. Na década de 60, atuou em movimento político estudantil e foi membro grupo Ação Popular (AP), que comandou a União Nacional dos Estudantes (UNE). Mestre em Direito pela Universidade de Brasília, também coordenou, em 1991, a Câmara Criminal e a antiga Secretaria de Defesa dos Direitos Individuais e Interesses Difusos (Secodid). Atualmente, é membro do Conselho de Defesa dos Direitos da PessoaHumana
Foto: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil
Maria Rita Kehl - Doutora em psicanálise pela PUC-SP, atua como psicanalista, ensaísta, crítica literária, poetisa e cronista. Foi editora do Jornal Movimento, um dos mais importantes nomes do jornalismo alternativo durante o regime militar no Brasil
Foto: CPFL Cultura / Divulgação
José Carlos Dias - Advogado criminalista, foi ministro da Justiça entre 1999 e 2000, no governo Fernando Henrique Cardoso. Graduado pela Faculdade de Direito em São Paulo, também foi secretário da Justiça do Estado de São Paulo (de 1983 a 1986) e presidiu a Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, da qual é, atualmente, conselheiro. É autor de dois livros de poesia: Miragens do meu deserto (Editora Talarico, 1953) e Vozes perdidas (Editora Saraiva, 957)