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Morte de Marielle é 'desafio para intervenção federal' e 'uma agressão a todos nós', diz Fernando Gabeira

Preso e torturado na ditadura militar, ex-deputado federal defende a intervenção no Rio e critica quem vê o Exército como 'fantasma que marchou dos anos de chumbo até aqui sem mudar'.

17 mar 2018 - 06h55
(atualizado às 09h24)
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Ex-deputado federal Fernando Gabeira diz que apoia a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro | Foto: Divulgação
Ex-deputado federal Fernando Gabeira diz que apoia a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro | Foto: Divulgação
Foto: BBC News Brasil

A morte da vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada na noite de quarta-feira no Rio, deve ser repudiada por "todas as correntes políticas democráticas" do país e representa uma agressão "para todos nós", considera o jornalista e ex-deputado federal Fernando Gabeira, de 77 anos.

Em entrevista à BBC Brasil, Gabeira diz que a morte da vereadora impõe um novo desafio à intervenção federal conduzida por militares na área de segurança pública do Rio.

Em meio à especulação sobre o que teria levado ao assassinato, ele considera que não se pode descartar a hipótese de a morte da vereadora ter sido uma retaliação às primeiras medidas tomadas pelo gabinete de intervenção, que trocou os comandos das polícias Militar e Civil do Rio.

Apesar de ter "vivido na pele o que foi a ditadura militar", ele tem defendido a intervenção no Rio, tecendo críticas a quem vê o Exército de hoje como um "fantasma que marchou dos anos de chumbo até aqui sem mudar".

Para Gabeira, os críticos da intervenção ignoram a urgência de se conter a escalada de violência no Rio e desconsideram as mudanças nas Forças Armadas desde a redemocratização.

Gabeira foi preso e torturado pela ditadura militar após participar do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, e passou quase dez anos no exílio.

A BBC Brasil conversou com Gabeira duas vezes ao longo da semana, antes e depois da morte de Marielle.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

BBC Brasil - O que representa a morte da vereadora Marielle Franco?

Fernando Gabeira - Em primeiro lugar, qualquer morte política no Brasil é repudiada por todas as correntes políticas democráticas. Em segundo lugar, sua morte é muito simbólica, porque era uma mulher, trabalhava em áreas mais pobres, atingidas pela violência policial. E trabalhava especificamente com a juventude negra, que é mais sacrificada nos índices de violência do Brasil.

Sua morte é um grande desafio e uma grande agressão a todos nós. Independente de posições politicas.

Ela vinha denunciando casos de violência em Acari, área com tradição de violência policial. Ali já houve uma chacina em 1990, e perto dali, em Vigário Geral, outra chacina praticada por policiais militares. Isso pode ser uma pista para o seu assassinato.

Apesar de dizer que ainda é cedo para avaliar circunstâncias da morte de Marielle Franco, Gabeira diz que tudo indica que ela decorreu de uma 'tentativa de calar uma voz que denunciava o desrespeito aos direitos humanos'
Apesar de dizer que ainda é cedo para avaliar circunstâncias da morte de Marielle Franco, Gabeira diz que tudo indica que ela decorreu de uma 'tentativa de calar uma voz que denunciava o desrespeito aos direitos humanos'
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Tudo indica que sua morte partiu de grupos mais profissionalizados e foi uma tentativa de calar uma voz que denunciava o desrespeito aos direitos humanos.

Mas é muito cedo para avaliar. A experiência parecida que tivemos foi o assassinato da juíza Patricia Acioli (em 2011, em Niterói). Foi praticado por um grupo de policiais militares. Mas ainda não podemos afirmar nada, vamos esperar.

BBC Brasil - É um golpe para a defesa dos direitos humanos no Brasil?

Fernando Gabeira - Olha, se foi essa a tentativa, vai fortalecer muito o movimento de defesa dos direitos humanos, e as denúncias de violência contra a juventude negra. Se foi feito com intenção de enfraquecer ou intimidar o movimento, acaba resultando no extremo oposto, que é o fortalecimento e a mobilização do movimento em todos os pontos do país.

Há muita especulação por enquanto (sobre as causas de sua morte). As duas vias que eu imagino são uma retaliação por sua prática de defesa dos direitos humanos ou uma tentativa de retaliação às modificações que começaram a ser feitas na Polícia Militar. Inclusive nessa semana, um pouco antes de sua morte, dissolveram uma milícia, prendendo os milicianos.

É muito possível que exista um descontentamento com a própria intervenção do Exército. Ou as duas coisa juntas. Mas isso são ilações que faço a partir da minha experiência com o problema.

BBC Brasil - E sua posição crítica à intervenção federal? Ela foi nomeada relatora de uma comissão para monitorar as ações da intervenção.

Fernando Gabeira - Acho muito difícil ligar a morte dela à intervenção federal. Muitas comissões estão sendo criadas para monitorar a intervenção, não seria isso que motivaria uma represália.

Mas a morte dela é, sim, mais um desafio para a intervenção militar. Para o gabinete de intervenção resolver esse crime e tentar fazer o que eu sempre defendo, que está em jogo, que é a reformulação da Polícia do Rio.

Não acredito que tenha sido a intervenção militar que a matou. Mas sua morte poderia ser, potencialmente, uma reação à intervenção federal por parte dos setores da polícia que estão sendo atingidos. Mas isso são crenças minhas.

BBC Brasil - A vigília após a sua morte levou cerca de 50 mil pessoas ao Centro do Rio na quarta, e na Cinelândia havia quem comparasse sua morte à da morte do estudante Edson Luís, que precipitou a Passeata dos Cem Mil contra a ditadura militar, em 1968. O senhor vê semelhanças na comoção que estamos vendo agora?

Fernando Gabeira - Eu acho muito possível, acho que a morte do Edson Luís provocou o mesmo tipo de sentimento. Acabou conduzindo a um conjunto de manifestações contra o governo militar. É possível que isso aconteça. Mas nesse caso ainda não se pode caracterizar uma ligação do governo com o crime.

Temer assina intervenção ao lado do deputado federal Rodrigo Maia e Luiz Fernando Pezão, governador do Rio / Foto: Beto Barata/PR
Temer assina intervenção ao lado do deputado federal Rodrigo Maia e Luiz Fernando Pezão, governador do Rio / Foto: Beto Barata/PR
Foto: BBC News Brasil

BBC Brasil - A intervenção federal no Rio foi convocada às pressas, sob críticas de ser uma manobra política do presidente Michel Temer. O senhor tem defendido a medida. O que motiva a sua visão?

Fernando Gabeira - O Rio é um Estado arruinado. Pela corrupção e pela incompetência. Ao mesmo tempo, é o único Estado no Brasil onde existe ocupação armada do território em grande escala. Nas condições em que o Estado está, ele não pode neutralizar e fazer regredir essa ocupação armada. Ele precisa de uma ajuda federal para conter esse avanço.

Eu vejo a intervenção federal com os olhos do Brasil de hoje. Não acredito que vá haver nenhum tipo de desrespeito aos direitos humanos. Acho que o Exército não aceitaria entrar numa aventura dessas para desrespeitar os direitos humanos e perder a credibilidade que tem.

BBC Brasil - Mas o próprio general Villas-Bôas gerou alarme sobre isso ao dizer que não poderia haver risco de uma nova Comissão da Verdade ao fim da intervenção.

Fernando Gabeira - Eu acho que foi uma frase inadequada. Não há essa possibilidade, simplesmente porque hoje, ao contrário dos anos de chumbo, nós temos total transparência. A imprensa é livre, ela pode noticiar o que quiser. Hoje não haveria nada escondido. Tudo vai ter que ser transparente.

BBC Brasil - Mas a primeira coletiva de imprensa com o interventor não passou uma imagem de transparência, parecendo indicar, pelo contrário, uma cultura militar avessa à comunicação.

Fernando Gabeira - A primeira entrevista sim, mas na segunda não, ele (o general Braga Netto) se colocou com transparência. O que acontece é que os militares tiveram um grande período no poder e existe uma grande desconfiança a respeito deles. E um desconhecimento de como eles se transformaram nesse período. Eu compreendo as preocupações das pessoas. Mas acho que estão trabalhando com o fantasma no passado.

BBC Brasil - Esse fantasma do passado não é presente para o senhor, tendo vivido na pele o que foi a ditadura?

Fernando Gabeira - Não. Tendo vivido na pele o que foi a ditadura e tendo convivido com o Exército hoje. Eu estive no Haiti duas vezes. Assisti a todo o processo de ocupação militar do Haiti. E vi que o Exército brasileiro se comportou muito bem, e teve nas principais favelas um trabalho de pacificação e até de fraternidade com os moradores.

Também convivi com eles na Amazônia, acompanhando seu trabalho em vários postos de fronteira, como na Colômbia, na Venezuela. E documentei o trabalho deles na distribuição de água do nordeste, onde a seca foi muito forte nos últimos anos. O conhecimento do trabalho deles me faz vê-los mais como eles são hoje do que como foram no passado.

Segundo Gabeira, a intervenção federal no Rio é 'aprovada pela maioria da população'
Segundo Gabeira, a intervenção federal no Rio é 'aprovada pela maioria da população'
Foto: AFP / BBC News Brasil

BBC Brasil - Mas a população das favelas obviamente está assustada porque não sabe como essa intervenção vai impactar suas vidas.

Fernando Gabeira - Defendo uma intervenção que queira conquistar a cabeça e o coração das comunidades. Mostrar a elas que a presença do Estado é uma garantia mais estável do que a presença dos grupos armados que os dominam.

Nós todos nos indignamos quando o Exército comete uma arbitrariedade no morro. Mas os traficantes que dominam o morro cometem arbitrariedades a toda hora. Isso as pessoas não sabem, não veem, ou não querem ver. Não conhecem a realidade das favelas, onde os traficantes matam quando querem. Estupram quando querem. As milícias também. E obrigam as pessoas a comprar o gás delas, a usar o transporte alternativo, a pagar a segurança. Essa ocupação armada, informal, é muito mais perigosa do que a ocupação do Estado.

BBC Brasil - Mas a ofensiva do governo federal em tomar para si o tema da segurança pública neste momento, em ano eleitoral, e sem um planejamento concreto, foi visto por muitos como oportunismo político.

Fernando Gabeira - Pode até ser. Mas o Exército sabe, e todos sabem, que metade do governo já está preso, e a outra metade está arrumando a mala para ir para a cadeia.

As chances do Temer ser candidato a alguma coisa são pateticamente ridículas. Não há possibilidade de ele ser candidato a nada. O Temer, quando era candidato a vice, era um empecilho à chapa da Dilma. O povo achava que ele tinha influências satânicas. Ele era o pior obstáculo para a Dilma e ganhou os votos da esquerda junto com a Dilma.

Hoje ele não tem mais nada. Ele tem 1% dos votos. Do ponto de vista político, ele não tem a menor possibilidade de transferir. Pelo contrário, acho que os candidatos vão descartar seu apoio por saberem que tem esse lado negativo.

É uma jogada do Temer? Sim, ele chegou à questão da segurança pública com atraso e de uma forma oportunista. Qual é a reação que você tem? Vai dizer que assim não vale? Ou vai dizer, "vamos sentar, vamos fazer" -e distanciar o Temer dessa história? A segurança pública é uma urgência, é preciso fazer essa distinção.

'Procuro não ter um viés ideológico que me dê a condição de interpretar tudo e responder a tudo', diz Gabeira | Foto: Divulgação
'Procuro não ter um viés ideológico que me dê a condição de interpretar tudo e responder a tudo', diz Gabeira | Foto: Divulgação
Foto: BBC News Brasil

BBC Brasil - A intervenção federal coincide com um aumento do conservadorismo na política e com a projeção de um candidato linha dura, o Jair Bolsonaro, que reagiu como se estivessem querendo usurpar o discurso dele.

Fernando Gabeira - Acho que não se pode culpar as forças conservadoras por avançarem. Quem permitiu esse avanço foi a sucessão de erros da esquerda. A esquerda, errando constantemente em vários campos, permitiu essa reorganização.

Agora, acho importante não associar o Exército ao Bolsonaro. O Exército não é o Bolsonaro, pelo menos o Exército que eu conheço. Não há uma identidade ideológica entre o Exército e ele.

A ascensão da direita pode se manifestar na campanha eleitoral. Há aí um perigo grande, que seria a vitória da extrema-direita, no caso do Jair Bolsonaro. Mas acho que uma visão de centro-direita tende a ser majoritária.

BBC Brasil - Em que posição ideológica o senhor se define hoje, diante de tantas posições diferentes que teve no passado?

Fernando Gabeira - Eu me coloco em uma posição em que não dá para definir que sou isso ou sou aquilo. Em cada caso específico, eu posso discutir. Eu procuro não ter um viés ideológico que me dê a condição de interpretar tudo e responder a tudo.

Um homem clássico de esquerda, diante das suas perguntas, sempre vai conduzir para a visão de que é perigoso o Exército chegar numa favela, porque vai haver mortes, problemas. Esse raciocínio não leva em conta que as mortes já existem. As favelas já estão ocupadas, as pessoas estão sofrendo. De que lado a pessoa está? Do lado das pessoas que estão sofrendo ou do lado das pessoas que estão oprimindo?

Eu me coloco do ponto de vista das pessoas que moram nas favelas. Elas merecem ter o direito de ir e vir. Elas merecem a liberdade completa. Entende? Ao negar isso por uma questão ideológica, corremos um risco muito sério, de romantizar o banditismo. Eu não vejo esses bandidos como portadores de nenhuma luta de libertação, nem a capacidade de representar ninguém em termos de denúncia das questões sociais.

A intervenção federal através dos militares do Rio é aprovada pela maioria da população. Existem pessoas que não apoiam. Mas não significa que apoiar a intervenção militar seja uma posição de direita. Pode ser uma posição pura e simplesmente sensata. Mais ainda - pode ser uma posição mais humanista do que a dos chamados humanistas de esquerda.

BBC Brasil - Mas tendo iniciado sua trajetória política na esquerda, ser visto hoje como uma voz de centro-direita lhe incomoda?

Fernando Gabeira - Não me incomoda. A única posição que me incomoda é quando a minha voz não está dizendo o que eu quero dizer. Agora, se as pessoas me veem como uma referência de centro-direita, é porque elas estão sem referência. Não há referência hoje no Brasil. Os partidos são um vazio completo. Eles não discutem, não acompanham a realidade, não avançam. Vivem em um planeta próprio.

A esquerda tem uma participação maior, mas vive uma dificuldade muito grande. Porque passou por um momento em que arruinou o Brasil e assaltou grande parte das empresas estatais brasileiras. E não faz autocrítica. Afirma que isso não é verdade, que tudo é uma perseguição. Apesar dos milhões devolvidos, apesar de tantas confissões e relatos, ela diz que não houve nada.

BBC Brasil - Na sua trajetória, o senhor foi do PV para o PT, depois voltou ao PV, mais tarde obteve apoio do PSDB e do DEM para suas candidaturas no Rio. O senhor considera que esse percurso se manteve coerente?

Fernando Gabeira - A passagem do PV para o PT se deu num contexto em que, ao voltar da Europa, eu tinha uma visão de que era necessário constituir uma frente verde e vermelha, à semelhança do que via na Alemanha. Dentro do PV, sempre defendi uma aliança com o PT, mas o PV não queria apoiar o Lula naquele momento.

Então a minha passagem para o PT foi conjuntural, porque eu achava fundamental apoiar o Lula. Era a chance histórica de ele chegar ao governo.

Mas fui o primeiro a sair do PT, ainda nos primórdios do governo, e fiz a autocrítica da minha passagem pelo PT no discurso de saída na Câmara dos Deputados. Comecei a criticar o governo e fazer uma série de críticas à esquerda.

É uma continuidade das críticas que eu venho fazendo desde a luta armada. Quando eu deixei a luta armada, eu escrevi um livro, O Que É Isso Companheiro, que tinha uma visão crítica da luta armada. Vejo esse processo de critica à esquerda como um processo continuado. Não vejo como um salto.

Quanto a estar no centro-direita, pode ser que eu esteja em alguns momentos, mas não significa nenhuma afinidade com organizações de centro direita. Não tenho relações com nenhum partido político. A minha posição é individual.

Claro que críticas, autocríticas você sempre faz ao longo do tempo. Mas eu não tenho arrependimento. Acho que a evolução do processo foi perfeitamente coerente com a evolução da minha consciência. E o nível de informação e de consciência é que determina as suas posições, acho eu.

'Eu me coloco do ponto de vista das pessoas que moram nas favelas. Elas merecem ter o direito de ir e vir', diz Gabeira sobre intervenção federal no Rio
'Eu me coloco do ponto de vista das pessoas que moram nas favelas. Elas merecem ter o direito de ir e vir', diz Gabeira sobre intervenção federal no Rio
Foto: AFP / BBC News Brasil

BBC Brasil - O senhor quase derrotou o Eduardo Paes na disputa pela prefeitura em 2008 e concorreu contra o Sérgio Cabral em 2010. Hoje desistiu da vida pública?

Fernando Gabeira - Não, considero que eu tenho uma vida pública. Não sou funcionário público, não dependo do governo. Mas trabalho procurando temas de interesse nacional, escrevo artigos me posicionando claramente sobre a política nacional.

Mas a ideia de ser candidato para mim é... diferente. Na maioria dos casos, posso ser candidato (a cargo) proporcional e vencer. Mas se eu for candidato (a cargo) majoritário, eu perco. O que não me importa, já fiz várias candidaturas majoritárias sabendo que ia perder. É um pouco como a vida, né, você faz o melhor possível sabendo que no final vai perder.

BBC Brasil - Como o senhor enxerga esse ano eleitoral nesse momento tão crítico para o país politicamente?

Fernando Gabeira - Eu acho que esse ano vai colocar para nós o projeto de reconstrução do país, que foi mal iniciado pelo Temer e precisa ser realizado com legitimidade. É preciso recuperar a economia, é preciso fazer uma reforma política.

A única vantagem os eleitos vão ter em relação aos que estão aí é que terão a oportunidade de explicar à população o que eles vão fazer, e, recebendo a maioria dos votos, terão legitimidade para realizar. Se tiverem competência ou não, aí vai ser um outro problema. Agora, terão legitimidade para realizar.

Mas sinceramente eu não creio em grandes amanhãs. A mediocridade da política brasileira não vai ser redimida de um momento para o outro. Nós continuaremos sendo dirigidas por gente medíocre, meio incapaz. Compete à sociedade de alguma forma tentar corrigir isso. Pressionando. A possibilidade de governar com a sociedade aumentou muito com os meios disponíveis hoje.

BBC Brasil - O senhor vê um caminho nesse ano eleitoral para a esquerda voltar por cima?

Fernando Gabeira - Não vejo. Não vejo porque está muito recente. Eu acho que esses momentos pendulares em que uma força entra em declínio e outra em ascendência precisam de algum tempo para que o pêndulo volte a funcionar.

BBC Brasil - O Rio está fazendo 10 anos de governo do PMDB. Qual é o legado que fica desse período?

Fernando Gabeira - O legado é incompetência, ruína, corrupção. E um coração cor de rosa dentro da cadeia deles (referência aos quartos decorados como motéis na prisão que abriga presos da Lava Jato no Rio, em Benfica).

Mas seria interessante as pessoas não se prenderem pura e simplesmente à análise do governo ruinoso do PMDB, constituído por bandidos, mas também examinarem como a sociedade ficou tão entusiasmada, se deixou seduzir, e apoiou tão alegremente os bandidos.

O que há no Rio de Janeiro que permitiu esse processo? Eu costumo dizer que o (Sérgio) Cabral não chegou por acaso, nem aqui, nem na Bahia. O Cabral teve o apoio dos setores dominantes, dos empresários, da imprensa, dos artistas e intelectuais, seduzidos na época com a exuberância financeira e a possibilidade de financiar seus próprios projetos.

Eu vejo o momento atual como um momento de grande desesperança. As eleições são o único instrumento disponível para algum tipo de mudança. Mas temo que não despertem tanto interesse quanto poderiam.

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