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O primeiro ato do ano eleitoral brasileiro

22 jan 2018 - 17h31
(atualizado às 17h34)
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Trio de juízes analisa recurso que deve indicar destino de Lula, de sua campanha - e da política nacional. Mesmo com sentença desfavorável, ex-presidente ainda pode ganhar tempo para manter candidatura.Os olhos do mundo político brasileiro se voltam às 8h30 desta quarta-feira (24/01) um tribunal em Porto Alegre. Pouco mais de seis meses após a sua condenação pelo juiz Sérgio Moro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá seu recurso julgado por um turma de três magistrados. Longe de ser um mero julgamento criminal, o procedimento se tornou uma das datas-chave do calendário eleitoral deste ano.

Lula em comício em Brasília: ex-presidente insiste me tática de enfrentamento com a Lava Jato
Lula em comício em Brasília: ex-presidente insiste me tática de enfrentamento com a Lava Jato
Foto: DW / Deutsche Welle

A decisão dos juízes deve indicar qual será a estratégia jurídica e política do petista de agora em diante. Favorito nas pesquisas eleitorais, o ex-presidente se vê ameaçado de ter sua candidatura barrada caso seja enquadrado na Lei da Ficha Limpa e ainda corre risco de ser preso dependendo do desfecho do julgamento.

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Já para a Lava Jato, o resultado deve indicar se a operação ainda mantém fôlego, após quase quatro anos de atuação contra o mundo político. Em julho passado, a primeira condenação de Lula já havia garantido um feito inédito para os responsáveis: pela primeira vez na história brasileira um ex-presidente da República recebeu um sentença desfavorável em julgamento criminal.

Não foi uma condenação trivial de um político caído em desgraça ou de algum ex-diretor da Petrobras, mas a de um líder que ainda conta com uma base de apoio ampla e uma militância fiel, além de aparecer com mais de 30% das intenções de voto na próxima eleição presidencial.

A importância do processo foi sentida pelos próprios juízes do caso. Pela primeira vez na história do Tribunal Regional Federal da 4º Região, um julgamento criminal será transmitido ao vivo pelo canal do tribunal no Youtube.

Militantes do PT pretendem organizar protestos e já começaram a se deslocar para a capital gaúcha. Declarações de vários petistas levantaram o temor de que possa ocorrer episódios de violência dependendo do desfecho do julgamento. A presidente do partido, Gleisi Hoffmann, chegou a afirmar na semana passada que "para prender o Lula, vai ter que matar gente", mas depois minimizou a fala.

Apesar do barulho, no entanto, a militância petista passou os últimos anos na defensiva e em episódios anteriores como a primeira condenação de Lula e o impeachment de Dilma Rousseff sua atuação passou longe da retórica incendiária.

Possíveis desfechos

Apesar de as circunstâncias apontarem para um "Dia D" na política nacional e para o próprio Lula, qualquer que seja o resultado desta quarta-feira, o debate sobre o futuro do ex-presidente e do seu papel nas próximas eleições não deve ser encerrado no mesmo dia.

Caso nenhum juiz faça um pedido de vista - o que pode levar a um adiamento -, há efetivamente três desfechos possíveis que podem ser conhecidos nesta quarta-feira: absolvição, a condenação por unanimidade ou a condenação por dois votos a um.

Mesmo os cenários de condenação não respondem de maneira definitiva se Lula pode ser efetivamente preso num futuro próximo e se a sua candidatura à Presidência poderá ser mantida. Dessa forma, a indefinição sobre o cenário nas eleições de 2018 deve se manter.

De efeito prático imediato, os três juízes do caso vão analisar se a sentença de nove anos e seis meses de prisão decidida pelo juiz Sérgio Moro, que em julho do ano passado considerou Lula culpado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, deve ser mantida. Para o Ministério Público, Lula recebeu um apartamento tríplex no Guarujá (SP) como propina de uma empreiteira em troca de contratos com a Petrobras.

Caso seja absolvido por três votos a zero ou dois votos a um, Lula não enfrentará nenhum empecilho imediato para concorrer à Presidência. O Ministério Público Federal poderia apresentar um recurso para o Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal, mas o novo julgamento provavelmente não seria analisado antes do pleito. Em quase quatro anos de Lava Jato, nem o STJ nem o STF encerraram qualquer julgamento no âmbito da operação. Absolvido, Lula provavelmente receberia um impulso em sua campanha eleitoral, apesar de outros processos que correm contra ele.

Caso seja condenado, a situação de Lula se complica, mas ainda não ao ponto de ser possível decretar que ele estará fora do páreo. O pior cenário para Lula seria uma condenação por 3 a 0. Neste caso, as opções para recorrer da nova condenação seriam menores, e as chances de prisão aumentariam. Isso porque só restaria à defesa mover embargos de declaração - um pedido de esclarecimento da sentença - que costuma ter trâmite rápido e sem possibilidade de revisão da sentença.

Lula acabaria tendo que tentar a sorte em um novo recurso no STJ ou no STF, que provavelmente não seria julgado em 2018. As chances de sua candidatura ser mantida passariam a depender da aceitação de um pedido de efeito suspensivo da sentença até novo julgamento e de a Justiça Eleitoral decidir sobre o caso. Sua liberdade também dependeria de pedidos de habeas corpus em instâncias superiores.

Num cenário de derrota por 2 a 1, as opções de Lula seriam maiores, e a sua campanha ganharia tempo. Neste caso, a falta de unanimidade entre os juízes abre a possibilidade de a defesa entrar com embargos infringentes no próprio TRF-4, onde outro recurso seria julgado por uma nova turma de três juízes, o que poderia arrastar o processo por mais alguns meses, dando tempo para que Lula se mantenha como Ficha Limpa até a eleição, em outubro.

Além disso, a palavra final sobre a candidatura ainda caberia ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). E, mesmo assim, não é incomum que candidatos que têm o registro indeferido pelo tribunal após ser enquadrados na Ficha Limpa consigam concorrer amparados em liminares e outras decisões judiciais. No pleito de 2016, mais de cem candidatos a prefeito com "ficha suja" conseguiram fazer campanha e foram eleitos.

Estratégia de defesa

Desde o início do caso, ainda em 2016, a defesa de Lula acusou o Ministério Público e a Justiça Federal de promoverem perseguição política. Nas últimas semanas, os advogados de Lula destacaram a celeridade do processo - pela média do tribunal em outros casos, esperava-se que o julgamento ocorresse a partir de agosto - e criticaram promotores do caso que fizeram sucessivas declarações públicas contra o petista.

Para o PT, o processo contra Lula ajudou a unir a militância em torno de uma causa comum, mas também se tornou uma dor de cabeça, já que aparentemente o partido não tem um plano B caso a candidatura do ex-presidente seja barrada. O partido também continua a insistir na sua tática de enfrentamento com a Lava Jato, apesar da popularidade que a operação desfruta entre os brasileiros.

Ao contrário de outros condenados, o ex-presidente não concentrou sua defesa e contrariedade com a decisão apenas nos tribunais. Em outras etapas do processo, Lula aproveitou depoimentos e outros procedimentos para montar palanque eleitoral.

Caso seja condenado na quarta-feira, Lula não deve desistir da narrativa da perseguição política, mas uma nova sentença deve marcar mais um abalo na imagem de estadista que o ex-presidente tentou cultivar após deixar a Presidência.

Em vez de colher os louros de um antigo governo bem-sucedido no aspecto econômico e social, o ex-operário vai continuar a se defender de suspeitas de corrupção e ligação com empreiteiras paralelamente à sua campanha para voltar ao Planalto.

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