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'Queimada, seca e desmate estão conectados', diz gerente de Ciência do WWF-Brasil

Pesquisadora Mariana Napolitano explica a conexão entre eventos climáticos e ações humanas que tem destruído os biomas brasileiros e alerta: 'Não adianta esperar queimar e ir lá combater'

22 set 2021 - 17h02
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Com um incêndio florestal que já dura dez dias, o Cerrado no Parque Nacional dos Veadeiros é mais um bioma brasileiro a sofrer pela combinação de eventos climáticos adversos e extremos com a ação do homem. Em entrevista ao Estadão, a gerente de Ciência do WWF-Brasil, Mariana Napolitano, explica como esses fatores estão aliados à onda de queimadas no Brasil e alerta: "Não adianta esperar queimar e ir lá combater. Tem de planejar e prevenir."

Dados do Inpe apontam crescimento de 12% das queimadas no Cerrado, com mais de 41,6 mil focos de incêndio em 2021. O que está acontecendo?

Estamos no segundo ano de eventos extremos e tem sido um período de bastante seca no País. Em 2020, houve as queimadas no Pantanal. Hoje, é o Cerrado que está queimando mais. Só em agosto foram mais de 15 mil focos de incêndio detectados, o maior índice da série histórica desde 2014. Existe uma forte conexão entre desmatamento, seca, desequilíbrio e queimadas. No caso do Cerrado, existe sim o fogo natural que começa, por exemplo, após um raio. Mas isso acontece no período de chuva, em outubro. Em período de seca, esses focos de incêndio são antrópicos, produzidos pelo homem. É o que estamos vendo na Chapada dos Veadeiros.

Como é essa conexão entre desmate, seca e queimada?

Todos estão conectados. Não há uma fronteira clara: Amazônia, Cerrado e Pantanal dependem um do outro. A Amazônia tem os rios voadores, massas úmidas que se deslocam por grandes distâncias, e contribui com a umidade de outras regiões. Uma vez que o bioma já perdeu 17% da sua cobertura, tem outra parcela grande degradada e o desmatamento se mantém alto por três anos seguidos, isso vai afetar o volume de chuva no Cerrado e no Pantanal.

Quais os possíveis impactos do cenário atual?

O Cerrado tem 30% da biodiversidade brasileira e 5% dos animais e plantas de todo o planeta. Os animais não conseguem escapar de incêndios de alta intensidade, principalmente anfíbios, répteis e pequenos mamíferos, sem falar nos invertebrados. Com desmatamento e queimadas, a gente pode estar perdendo espécies que não existem em outros lugares. Vale dizer que o Cerrado é conhecido como "a caixa d'água do Brasil", porque abriga a nascente de oito das 12 bacias hidrográficas. Todo esse sistema está frágil.

É possível projetar o comportamento dos próximos meses? Como evitar estragos maiores?

Geralmente, agosto e setembro são os meses com mais focos de incêndio. Em outubro, a chuva começa a dar uma pausa. Mas com as mudanças climáticas e os atuais níveis de desmatamento, a gente corre o risco de passar a conviver mais com eventos extremos, como as queimad[ ]as. E não é só aqui. Na Califórnia, em Portugal, isso está virando algo comum. Cada vez mais, o Brasil vai precisar olhar essa questão de forma mais séria. Não adianta esperar queimar e ir lá combater. Tem de planejar e prevenir.

Estadão
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