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Primas de 4 e 7 anos são mortas na porta de casa em tiroteio no RJ

Meninas foram atingidas na cabeça e no abdômen; 22 crianças foram atingidas por bala perdida na região metropolitana do Rio em 2020

5 dez 2020 - 13h39
(atualizado às 20h55)
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RIO - Duas meninas, de 4 e 7 anos, foram mortas durante um tiroteio em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, na noite da última sexta-feira. As crianças eram primas e estavam brincando juntas na porta de casa quando foram baleadas - uma na cabeça e a outra no abdômen. Emily Victória Silva dos Santos e Rebeca Beatriz Rodrigues dos Santos, moradoras da comunidade do Barro Vermelho, em Jardim Gramacho, chegaram a ser levadas para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Sarapuí, mas não resistiram aos ferimentos.

Vizinhos relataram que um carro da Polícia Militar foi visto disparando vários tiros. A PM confirmou que uma equipe do 15º Batalhão (Duque de Caxias) estava fazendo um patrulhamento na comunidade do Sapinho e teria ouvido disparos de arma de fogo. A corporação alega, no entanto, que os agentes não atiraram de volta.

Já a Polícia Civil informou que a Delegacia de Homicídios da Baixada instaurou inquérito para apurar as mortes e está investigando o caso. Os cinco militares que estavam na região já foram ouvidos e tiveram cinco fuzis e cinco pistolas apreendidos para que a análise balística seja feita.

"Estamos enterrando mais uma vítima da violência na nossa comunidade. Duas crianças. Minha filha e minha sobrinha. Estão aí os governadores que só querem ganhar dinheiro nas costas dos outros. Tô enterrando a minha filha, que não viveu nada", disse, no sepultamento, o ajudante de pedreiro Alexsandro dos Santos, pai de Emily e tio de Rebeca. As duas crianças foram sepultadas, uma ao lado da outra, na tarde de ontem, também em Caxias. Alexsandro fechou o túmulo com as próprias mãos.

Memorial para crianças mortas por bala perdida no Rio, na Lagoa; somente neste ano, houve oito mortes assim na região metropolitana do Rio, de acordo com levantamento da plataforma Fogo Cruzado
Memorial para crianças mortas por bala perdida no Rio, na Lagoa; somente neste ano, houve oito mortes assim na região metropolitana do Rio, de acordo com levantamento da plataforma Fogo Cruzado
Foto: Rio da Paz / Divulgação / Estadão

A avó de Rebecca e tia de Emily chegou a se deparar com o cenário desastroso das mortes logo depois dele acontecer. Em entrevista à imprensa, Lídia da Silva Moreira Santos disse que havia acabado de descer do ônibus quando ouviu barulhos de tiro. "Quando entro na minha rua, me deparo com a Emily com metade do rosto estourado com um tiro de fuzil. Fui afagar minha irmã. Quando fui, chega minha nora e fala que mataram a filha dela", contou. Ela alega ainda que a polícia não prestou socorro às crianças.

Emily faria 5 anos no dia 23 de dezembro e teria sua primeira festa de aniversário da vida. O tema da comemoração seria voltado para a princesa Moana, da Disney. Ela foi sepultada com a roupa que usaria na festinha.

Presidente da ONG Rio de Paz, que monitora esse tipo de caso, Antonio Carlos Costa acha chocante como a alta incidência de crianças mortas não basta para fazer as coisas mudarem no Rio. "Sempre que essas mortes ocorrem pensamos que tudo vai mudar, uma vez que a face mais hedionda da criminalidade no Rio é a morte por bala perdida desses meninos e meninas", apontou.

"Contudo, nada muda. As famílias permanecem desamparadas, a autoria dos homicídios não é elucidada, os assassinos não são punidos e nenhuma transformação ocorre na política de Segurança Pública. Vale lembrar que quem morre são crianças pobres. Nisso reside a razão da indiferença por parte das autoridades públicas."

De acordo com a plataforma Fogo Cruzado, 22 crianças - com menos de 12 anos - foram baleadas na região metropolitana do Rio desde o início deste ano. Oito delas morreram.

Casos em que policiais são suspeitos de terem envolvimento costumam ter investigações marcadas pela falta de conclusões. Em 2016, por exemplo, a CPI dos Autos de Resistência na Assembleia Legislativa do Rio mostrou que 98% das mortes que agentes registraram como auto de resistência foram arquivadas.

"Isso mostra uma falha do sistema. Não é só a polícia que é violenta, mas todo o sistema favorece essa violência", afirmou o então deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), relator da comissão, quando o relatório foi aprovado.

Estadão
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