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PF investiga grupo articulado para barrar apuração do caso Marielle

Pedido foi feito por Raquel Dodge após dois detentos denunciarem ação conjunta de agentes públicos, milicianos e contraventores

1 nov 2018 - 17h11
(atualizado às 23h41)
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BRASÍLIA E RIO - O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, anunciou nesta quinta-feira, 1º, que a Polícia Federal (PF) vai investigar a existência de um grupo criminoso articulado para atrapalhar e impedir as investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista, Anderson Gomes, em março. O ministro solicitou a instauração de inquérito policial para apurar o envolvimento de agentes públicos, milicianos e contraventores que estariam atuando em conjunto.

O pedido de atuação da PF foi feito nesta quinta pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, com base em depoimentos de duas pessoas que estariam ligadas ao crime. "As denúncias são extremamente graves, precisam ser investigadas", afirmou Jungmann. O ministro, no entanto, não quis dar informações sobre quem seriam essas pessoas e qual o grau de confiabilidade dos testemunhos. Ele disse apenas que os depoimentos foram dados há um mês a procuradores federais.

Reportagem do jornal O Globo desta quinta mostra que um dos depoimentos foi dado pelo ex-policial militar Orlando de Oliveira Araújo, o Orlando de Curicica. Ele está preso na Penitenciária Federal de Mossoró (RN). Em entrevista concedida por escrito ao jornal, Curicica negou ter participado do duplo assassinato, mas afirmou que a Polícia Civil do Rio não tem interesse em elucidar o caso e que haveria pagamento de dinheiro a agentes públicos.

Ele acusou até o chefe do órgão, o delegado Rivaldo Barbosa, de ter montado uma intrincada rede de proteção aos chefes da contravenção envolvidos em assassinatos. De acordo com O Globo, a informação consta do depoimento de Curicica dado à PGR. Segundo apurou o Broadcast/Estadão, o segundo depoimento também foi tomado pelo Ministério Público em um presídio do Rio Grande do Norte.

Não há previsão de federalização da investigação da morte de Marielle e Anderson. O caso continuará com a Polícia Civil, com a ajuda do Ministério Público Estadual do Rio. Por considerar graves as informações dos depoimentos, Raquel Dodge pediu que a PF garanta segurança aos depoentes e a seus familiares.

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Ajuda

Em agosto, Jungmann chegou a oferecer publicamente ajuda da Polícia Federal, mas autoridades do Rio a cargo da investigação recusaram. O ministro esclareceu que o novo inquérito pode, eventualmente, vir a ajudar a elucidar os assassinatos, mas destacou que as duas investigações têm objetivos diferentes.

"O que se está fazendo é criar um outro eixo que investigará aqueles ou aquelas que estejam dentro da máquina pública - portanto, agentes públicos-, ligados ao crime organizado ou a interesses políticos e que estão tentando impedir que seja elucidado esse crime. Então, em certo sentido, não deixa de ser uma investigação da investigação que está sendo feita", disse.

Questionado se os depoimentos foram acompanhados de provas materiais, o ministro afirmou que não poderia dar detalhes porque o caso está sob sigilo. "São depoimentos em vídeo devidamente gravados por procuradores da República com fatos, nomes e valores que têm de ser devidamente investigados. Pode ser que não seja isso, mas também evidentemente pode ser que tenha fundamento."

Próximo do fim

O chefe da Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa, afirmou por meio de nota oficial que a investigação do caso Marielle está muito próxima do fim. Disse ainda que "repudia a tentativa de um miliciano altamente perigoso, que responde a 12 homicídios, de colocar em risco uma investigação que está sendo conduzida com dedicação e seriedade". "Ao acusado (Curicica) foram dadas amplas oportunidades pela Polícia Civil para que pudesse colaborar com as investigações de duplo homicídio dentro do estrito cumprimento da lei."

Curicica estava preso no Complexo Penitenciário de Gericinó, no Rio, mas, depois da morte da vereadora, foi transferido para a penitenciária federal. Na ocasião, por meio de seu advogado, ele contou que estava sendo pressionado pela polícia para confessar participação no crime e, como havia se negado a assumir a culpa, teria sido transferido.

"Não causaram surpresa as ilações feitas pelo preso, tendo em vista que, historicamente, chefes de organização criminosa, notadamente milícias, se utilizam desse artifício para desmoralizar e desacreditar instituições idôneas e seus membros", continua a nota oficial. "Nenhum esforço está sendo poupado, cabendo ressaltar que todas as técnicas e os recursos disponíveis têm sido empregados no trabalho de investigação. Dentro desse propósito, o chefe de Polícia Civil garante: o caso está muito próximo de sua elucidação."

Desconforto

Causou desconforto entre os militares que participam da intervenção no Rio de Janeiro a decisão de a Polícia Federal entrar no caso da morte da vereadora Marielle Franco, mesmo que de forma lateral. A PF vai apurar a existência de um grupo criminoso articulado para atrapalhar e impedir as investigações. Com a decisão tomada pela Procuradoria Geral da República, a Polícia Civil do Rio continua fazendo seu trabalho e a PF inicia uma outra investigação, sem que os dois grupos tenham qualquer conexão ou se comuniquem.

Os militares lamentam que a decisão tomada pela PGR tenha levado em conta denúncias feitas por um dos principais suspeitos do crime, o ex-policial militar Orlando de Oliveira Araújo, o Orlando de Curicica. Ele nega participação no crime e espera benefícios com suas informações. Segundo um militar consultado pelo Estado em caráter reservado, desde o princípio houve tentativas de federalizar a investigação, nunca levadas adiante. /COLABOROU TÂNIA MONTEIRO

Pontos-chave

O crime

A vereadora do Rio Marielle Franco (PSOL) foi morta a tiros em 14 de março, quando ia de um evento para casa. O motorista do veículo também foi assassinado.

A investigação

Entre as principais linhas de investigação está uma ação de milicianos. O principal suspeito é Orlando de Oliveira Araújo, o Orlando de Curicica.

Nova apuração

Curicica teria dito a procuradores federais que um grupo que reúne criminosos e agentes públicos atrapalha a investigação do caso. A PF vai apurar.

Estadão
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