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Governo quer tratar garimpeiro e pecuarista como 'comunidades tradicionais', igual a indígenas

Caso a medida seja aprovada, garimpeiros e pecuaristas passarão a ter acesso a iniciativas federais voltadas a essas comunidades, como programas de proteção e apoio às populações tradicionais

8 dez 2021 - 19h26
(atualizado em 9/12/2021 às 10h32)
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BRASÍLIA - Uma proposta encabeçada pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandado por Damares Alves, prevê que garimpeiros e pecuaristas passem a ser tratados, pelo governo, como "Povos e Comunidades Tradicionais", tratamento que hoje é dado a povos indígenas e quilombolas, por exemplo.

A proposta, apresentada pela Secretaria Executiva do Conselho Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT), que é presidida pelo ministério, havia sido incluída na pauta de reunião desta quarta-feira, 8. O pleito tem origem em demandas apresentadas por pecuaristas do Rio Grande do Sul. Além do governo, o colegiado é formado por representantes de outros órgãos do poder público, como Ministério Público e Defensoria, além de entidades não governamentais.

Caso a medida venha a ser aprovada, garimpeiros e pecuaristas passarão a ter acesso a iniciativas federais voltadas a essas comunidades, como programas de proteção e apoio às populações tradicionais. Além de indígenas e quilombolas, há outras comunidades já incluídas nessa categoria de povos tradicionais, como as quebradeiras de coco e os seringueiros, por exemplo.

A Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT) foi criada em 2007, por meio de um decreto editado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A iniciativa tem como principal objetivo "promover o desenvolvimento sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, com ênfase no reconhecimento, fortalecimento e garantia dos seus direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais, com respeito e valorização à sua identidade, suas formas de organização e suas instituições".

A proposta de incluir garimpeiros e pecuaristas no rol de "comunidades tradicionais" foi criticada por entidades ligadas ao meio ambiente. O Movimento Amplo de Resistência ao Desmonta das Políticas Socioambientais (Maré Socioambiental) divulgou nota de "indignação e revolta" com a proposta. Alega que se trata de "insulto ao histórico de lutas de povos e comunidades tradicionais", que tem a criação do próprio conselho como uma de suas conquistas. Também apontam que há conflitos socioambientais ligados à pecuária e ao garimpo.

Após a reunião de ontem, a votação da proposta acabou, por fim, sendo substituída por outra ideia. Foi decidido pelo conselho que será criado um grupo de trabalho para definir os critérios e protocolos que devem ser usados na identificação de novos povos tradicionais, de maneira geral. O prazo de trabalho desse grupo será de, no mínimo, um ano para estabelecer essas normas.

Questionado sobre a proposta e por qual razão entende que garimpeiros e pecuaristas devem ter o mesmo tratamento dado a povos indígenas e quilombolas, o ministério de Damares Alves disse que "os colegiados que consultivos/deliberativos, embora ligados ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, atuam de forma independente".

Após a publicação da notícia, a Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, ligada ao ministério da Damares, declarou que recebeu a proposta de "segmentos específicos solicitando a análise acerca do reconhecimento de garimpeiros e pecuaristas como povos e comunidades tradicionais".

"A demanda foi incluída na pauta do CONPCT pelo seu presidente, em consonância com o pleno do conselho, não tendo esta secretaria dominância sobre o procedimento", declarou. "É importante salientar, neste ponto, que a SNPIR está elaborando Nota Técnica que irá balizar o trabalho dos conselheiros, uma vez que os mesmos não deliberam de forma definitiva sobre a possibilidade de reconhecimento de Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs). Ao conselho cabe apenas a apreciação da pauta e emissão de parecer em caráter de sugestão e entendimento do pleno acerca do pedido, encaminhando-o às instâncias competentes na tomada da decisão."

Por meio de nota, a secretaria declarou que "antecipa o seu entendimento de que há temeridade no reconhecimento de garimpeiros e pecuaristas como PCT's, o que, julgamos, poderia se tornar um campo fértil para violação de direitos humanos".

Na reunião desta quarta-feira, o conselho não obteve acordo para a criação da câmara técnica que iria avaliar a demanda. "Este item da pauta será analisado em nova oportunidade", afirmou a secretaria. "Cabe acrescentar que o CONPCT é presidido pela sociedade civil e enfrenta grandes desafios para garantir a políticas públicas e direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais. Antes de qualquer deliberação do colegiado é necessária a oitiva de seus legítimos representantes. Levando-se em conta o arcabouço deste amplo processo, é preciso também ouvir pesquisadores e antropólogos, o que requer tempo e os devidos registros das reuniões do conselho."

Estadão
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