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Ataque do 'novo cangaço' a banco deixa feridos e leva terror à mineira Itajubá

Cinco pessoas ficaram feridas na ação entre a noite de quarta-feira, 22, e o início da madrugada desta quinta-feira, 23 - um estudante que passava pelo local e quatro policiais; um dos criminosos foi preso

23 jun 2022 - 08h37
(atualizado às 15h30)
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SOROCABA E SÃO PAULO - Em mais uma ação conhecida como "novo cangaço", uma quadrilha armada com fuzis de grande impacto invadiu a região central de Itajubá, no interior de Minas Gerais, entre a noite de quarta-feira, 22, e o início da madrugada desta quinta-feira, 23, incendiou carros, atacou o Batalhão da Polícia Militar e usou explosivos para assaltar uma agência da Caixa Econômica Federal. Ao menos cinco pessoas ficaram feridas - quatro policiais e um estudante -, mas não houve vítimas fatais. Um suspeito de atuar como batedor da quadrilha foi preso. Outras três pessoas foram detidas para averiguação.

Criminosos armados durante assalto a uma agência bancária em Itajubá, na região sul de Minas Gerais
Criminosos armados durante assalto a uma agência bancária em Itajubá, na região sul de Minas Gerais
Foto: Reprodução/ Twitter / Estadão

"Temos confirmados quatro militares feridos. Três estão bem, com menor gravidade. O outro militar recebeu um tiro de fuzil no braço, passou por cirurgia, não corre risco de vida, porém numa situação de maior gravidade. Temos também a confirmação de um civil, um estudante, que passava pelo local no momento do roubo e teve um disparo que atingiu seu veículo e o atingiu também na perna, mas sem maior gravidade", afirmou a porta-voz da Polícia Militar em Minas, Layla Brunnela.

O ataque é o décimo nos últimos cinco anos em que as quadrilhas, chamadas de "novos cangaceiros", seguem um mesmo padrão: chegam em carros possantes, em grande número, armados com bombas, fuzis e metralhadoras, armamento desproporcional quando comparado ao das forças de segurança locais. De acordo com o secretário de Segurança Pública da cidade, Massoud Nassar, ao menos 20 bandidos cercaram a região do centro onde ficam as agências bancárias. Já a PM fala em 12 assaltantes.

Uma parte dos criminosos se dirigiu à frente do 56º Batalhão da Polícia Militar, pôs fogo em dois carros e disparou contra o prédio. Os policiais reagiram. "Eles usavam fuzis .50, armamento de guerra. Nós temos quatro policiais feridos, um deles com disparo de fuzil atingindo o braço. O outro foi atingido na perna", disse o tenente-coronel da PM, Flávio Santiago. Os dois estavam em estado grave. O policial ferido no braço passou por cirurgia e permanecia internado no fim da manhã. Já o estudante, morador da cidade, foi ferido quando os criminosos tomaram o carro dele para usar no ataque.

Outra parte da quadrilha atacou a agência. Os bandidos usaram bombas para explodir os caixas e deixaram explosivos intactos no local para dificultar a ação da polícia. Foi preciso mobilizar o grupamento especializado em explosivos da PM para resgatar os artefatos. Uma parte da quadrilha fugiu pela BR-459 no sentido de Pouso Alegre, enquanto outro grupo fugiu em direção a São Lourenço - as cidades são vizinhas a Itajubá.

Um grupo fortemente armado assaltou uma agência da Caixa Econômica Federal em Itajubá, na região sul de Minas Gerais
Um grupo fortemente armado assaltou uma agência da Caixa Econômica Federal em Itajubá, na região sul de Minas Gerais
Foto: Reprodução/ Twitter / Estadão

Segundo a major Layla Brunnela, alguns veículos foram abandonados pelos criminosos, inclusive próximo à divisa com São Paulo, e tinham marcas de sangue, indicando que os suspeitos também foram atingidos. "Continuamos em cerco em toda a região, com o apoio da polícia de São Paulo."

A cidade de 97 mil habitantes viveu horas de terror. Em redes sociais, moradores relataram tiros, rajadas e o barulho de explosões. Também publicaram vídeos mostrando o intenso tiroteio e o forte armamento utilizado pelos criminosos.

A ação dos bandidos começou no fim da noite de quarta-feira e seguiu até a madrugada desta quinta, quando os criminosos fugiram. A movimentação e o cerco aos bandidos continuava no fim da manhã, com o uso de helicópteros. "Nosso sistema de monitoramento com câmeras registrou a movimentação dos suspeitos e permitiu que a PM montasse um cerco rapidamente", disse o secretário Nassar.

O prefeito de Itajubá, Christian Gonçalves (DEM), usou as redes sociais para pedir calma à população. Ele disse que o morador ferido está sob cuidados médicos em hospital e passa bem. "Não tivemos vítimas fatais. Nossos serviços estão funcionando normalmente, mas ainda há cerco da polícia, por isso pedimos que as pessoas evitem circular de forma desnecessária. Também pedimos que a população compartilhe apenas informações de fontes oficiais e não compartilhe fake news", disse.

A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) afirmou em nota que o trabalho integrado realizado no Estado contra ataques a bancos, de cunho operacional e inteligência, vem conseguindo resultados expressivos na redução das estatísticas desse tipo de ação. "A ocorrência de Itajubá é a primeira do ano do Estado", informou.

Segundo a pasta, na comparação de 2021, quando aconteceram 5 ataques a bancos, com 2016, período de pico desse tipo de registro (252), a redução alcança mais de 98%. Já na comparação do ano passado com 2020, houve queda nos registros de 64,2%, com diminuição das ações de 14 para 5.

Parecia filme, diz morador de Itajubá

Por volta das 23h de quarta-feira, o advogado Daniel Matuoka, de 31 anos, morador de Itajubá, acreditou que o barulho que tinha escutado tinha sido provocado por fogos de artifício, em razão de jogo entre Atlético Mineiro e o Flamengo. Com a intensidade aumentando, ele foi até a janela e viu homens armados na rua. "Eu vi primeiro um homem armado apontando a arma para o prédio em frente ao que eu moro. Ele gritou para que as pessoas não aparecessem na janela e deu tiros para o alto", relatou Matuoka.

Em seguida, o advogado foi até o quarto da mãe e pediu para que ela engatinhasse até o corredor, local mais seguro naquele momento. "Chamei minha mãe e peguei minha cachorrinha. Ficamos sentados no corredor, por uns 40 minutos, pois era o local mais longe da janela", disse o advogado, que mora na Rua Tiago Carneiro Santiago, a menos de 50 metros da agência da Caixa, no centro, invadida por criminosos.

Ele conta que, em alguns momentos, os tiros paravam e depois recomeçavam. "Minha mãe ficou muito assustada. Ela me seguiu, mas só depois entendeu o que estava acontecendo. Minha cachorrinha não gosta de fogos de artifício, ficou bem nervosa também. Foi um momento bem tenso que eu não esperava viver. Parecia cena de filme. Foram muitos tiros. Estavam bem armados os bandidos", lembrou Matuoka.

Preocupado com a namorada que mora em frente ao seu prédio, ele pediu que ela ficasse longe da janela. "Pedi para ficar em local seguro e somente sair quando os tiros parassem", disse ele.

Pela manhã, o jovem foi até a agência da Caixa. Observou que os caixas eletrônicos foram explodidos, assim como ainda havia muita fumaça dentro do prédio.

Nas ruas próximas, segundo ele, tinham muitas cápsulas das armas. "Deu para perceber que os caixas eletrônicos foram explodidos. Também destruíram algo dentro do prédio porque ainda tinha muita fumaça. O policiamento estava presente e vias ainda interditadas. No chão, também tinham muitas cápsulas grandes das armas, o que mostra que os bandidos estavam bem armados", afirmou o morador.

Tiroteio em Itajubá, na região sul de Minas Gerais, assusta população 
Tiroteio em Itajubá, na região sul de Minas Gerais, assusta população
Foto: Reprodução/ Twitter / Estadão

Novo cangaço

A expressão "novo cangaço" faz referência aos bandos de cangaceiros que acompanhavam Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, bandoleiro que no início do século 20 aterrorizou fazendeiros e cidades em sete estados do Nordeste.

No livro Os Homens que Mataram o Facínora, lançado no ano passado, o jornalista Moacir Assunção compara as ações policiais como o cerco em Itajubá às forças volantes enviadas pelos governos da época contra o bando de Lampião, morto há mais de 80 anos.

"Somente tropas especiais das polícias estaduais, muito bem armadas e adestradas, como a Rota paulista e o Bope carioca, se arriscam a enfrentar esse tipo de banditismo", escreveu.

Segundo o pesquisador, o fenômeno atual assusta principalmente os moradores do interior. "No novo cangaço, bandos de criminosos muito bem armados e encapuzados, com fuzis, metralhadoras, pistolas e explosivos invadem cidades pequenas, em geral com parco policiamento, para explodir caixas eletrônicos, agências bancárias e postos dos Correios. Com táticas semelhantes às de seus antepassados, os novos cangaceiros chegam em carros potentes, quase sempre blindados, aos pequenos municípios, tomam bancos, explodem os caixas e levam o dinheiro, muitas vezes carregando amarrados sobre os carros (para impedir a reação da polícia) os reféns, assustados e intimidados, que são libertados fora da área urbana."

Décimo ataque

A ação violenta dos criminosos em Itajubá é a décima em cinco anos com táticas que remetem ao "novo cangaço". Os ataques anteriores aconteceram em cinco estados. O de Itajubá é o quarto em cidades mineiras.

  • 10/07/2017 - Santa Margarida (MG) - Cerca de 30 homens armados atacaram com explosivos duas agências bancárias. Na ação, fizeram reféns e mataram a tiros um policial militar e um vigilante.
  • 07/12/2018 - Milagres (CE) - Uma quadrilha incendiou caminhões e fez reféns na tentativa de assaltar duas agências bancárias. Houve forte reação da Polícia Militar. Seis reféns e oito integrantes do bando foram mortos durante o intenso tiroteio.
  • 04/04/2019 - Guararema (SP) - Ao menos 25 bandidos fortemente armados tentaram assaltar duas agências bancárias na região central da cidade. A quadrilha estava sendo monitorada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público. Os criminosos foram cercados e encurralados durante a fuga. Onze suspeitos foram mortos. Nenhum policial se feriu.
  • 14/08/2020 - Brumadinho (MG) - Criminosos armados bloquearam a principal avenida da cidade e explodiram uma agência da Caixa Econômica Federal. Eles eram monitorados e foram cercados pela Polícia Militar. Na fuga, os bandidos tomaram uma família como refém. Três suspeitos foram mortos pela polícia.
  • 08/04/2021 - Jacuí (MG) - Ao menos dez suspeitos atacaram um quartel da Polícia Militar e usaram dinamites para explodir os caixas eletrônicos de uma agência do Banco do Brasil. Após o ataque, eles circularam pela cidade disparando rajadas de metralhadora. Na troca de tiros com a PM, um suspeito morreu.
  • 30/08/2021 - Araçatuba (SP) - Uma quadrilha com ao menos 30 integrantes minou com explosivos acionados por sensores a região central de Araçatuba, incendiou veículos, atacou o Batalhão da Polícia Militar e fez reféns, antes de explodir duas agências bancárias. Os reféns foram amarrados sobre o teto dos carros. Houve confrontos e três pessoas morreram - dois moradores e um suspeito.
  • 31/10/2021 - Varginha (MG) - Uma operação conjunta da Polícia Militar e Polícia Rodoviária Federal cercou e atacou duas chácaras em que se escondiam os integrantes de uma quadrilha que planejava ataques a bancos. Na operação, 25 suspeitos foram mortos. Foram apreendidos fuzis, metralhadoras, granadas, outros explosivos e coletes à prova de bala, além de dez veículos furtados.
  • 18/04/2022 - Guarapuava (PR) - Ao menos 30 criminosos armados atacaram o Batalhão da PM e tentaram assaltar uma empresa de transporte de valores. O grupo fez reféns e houve intensos tiroteios. O bando tinha fuzil .50 e submetralhadoras. Até um blindado foi mobilizado para proteger o quartel do Exército. Cinco pessoas ficaram feridas.
  • 29/04/2022 - Divinópolis (TO) - Ao menos dez homens armados com fuzis atiraram contra a base da Polícia Militar, tomaram seis pessoas como reféns e assaltaram um banco e uma lotérica. Os bandidos atiraram em transformadores para deixar a cidade sem energia e explodiram o cofre central do Banco do Brasil. Durante a fuga, em várias caminhonetes, eles fizeram disparos contra prédios e residências.
Estadão
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