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Cidades

Bispo que renunciou é investigado por extorsão e por acobertar abusos sexuais

Papa aceitou pedido de renúncia do bispo da diocese de Limeira, d. Vilson Dias de Oliveira. Ele é investigado em inquéritos da Polícia Civil

17 mai 2019 - 22h28
(atualizado em 18/5/2019 às 11h28)
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SOROCABA - O bispo da Diocese de Limeira, dom Vilson Dias de Oliveira, que teve o pedido de renúncia aceito pelo papa Francisco, nesta sexta-feira, 17, é investigado em inquéritos da Polícia Civil por suposta prática de extorsões contra padres e de enriquecimento ilícito. Ele também é alvo de investigação da polícia e da Igreja por suposto acobertamento de abusos sexuais que teriam sido cometidos por um padre. A defesa do bispo afirma que ele é acusado injustamente. Dom Vilson foi procurado, mas não falou com a reportagem.

Até esta sexta-feira, 17, quando entregou a arquidiocese de Limeira ao administrador apostólico nomeado pelo papa, o bispo não tinha se tornado réu em nenhum dos casos, mas um dos inquéritos já foi enviado para o Ministério Público.

A apuração da delegacia seccional da Polícia Civil em Limeira, com mais de 300 páginas de depoimentos e documentos, envolve denúncias de extorsão e suposto enriquecimento ilícito. Conforme o MP-SP, a promotoria de Justiça de Limeira recebeu a conclusão do inquérito policial no último dia 12. O caso retornou para a delegacia no dia 24 de abril para cumprimento de novas diligências. As investigações estão sob sigilo.

O bispo seria dono de dez imóveis em Itanhaém, no litoral paulista, supostamente adquiridos com dinheiro da Igreja. Em depoimento dado em abril, um padre de Artur Nogueira contou que o bispo pediu R$ 4 mil para construir um poço artesiano em sua casa na praia. A alegação teria sido para se livrar os frequentes cortes no abastecimento de água devido ao afluxo de turistas à cidade praiana. O padre teria feito o repasse, em 2015, com dinheiro da paróquia.

Em outro caso, em 2012, d. Vilson teria pedido R$ 50 mil ao pároco de uma igreja de Americana, alegando dificuldades financeiras. O conselho paroquial não autorizou a doação devido ao uso particular do dinheiro. O padre disse à polícia que, em razão da negativa, o bispo cumpriu a ameaça de exigir R$ 150 mil da paróquia para obras na diocese de Limeira.

Em sua defesa, d. Vilson entregou documentos confirmando a compra de dois imóveis em Itanhaém, nos últimos quatro anos, em valores de cerca de R$ 1 milhão.Ele disse no inquérito que o dinheiro era proveniente do patrimônio de sua família e de recursos recebidos pelas atividades religiosas, além do salário mensal de R$ 12 mil que recebia da diocese.

Também confirmou ter recebido os R$ 4 mil em doação porque estava em dificuldades financeiras, mas não houve extorsão. Sobre os R$ 50 mil, ele alegou que o padre que fez denúncia queria indicar um sucessor para a paróquia e, como não foi atendido, agiu por vingança.

Omissão

Também pesam contra o bispo acusações de ter acobertado os casos de supostos abusos sexuais praticados pelo padre Pedro Leandro Ricardo, que atuava em paróquia de Americana, na mesma região. Quatro ex-coroinhas relataram à polícia que, entre 2002 e 2003, quando eram menores de idade, foram assediados sexualmente pelo padre. O religioso oferecia presentes em troca do silêncio das vítimas. Outras denúncias contra o padre constam de um dossiê enviado à Procuradoria Geral do Estado (PGE), que acionou as promotorias do interior para a apuração.

Conforme a assessoria do MP, o inquérito, iniciado em Americana e repassado à Polícia Civil de Piracicaba, ainda não foi relatado à promotoria. Um terceiro inquérito da Polícia Civil de Araras apura somente os supostos abusos atribuídos ao padre, mas há menção a uma possível omissão do bispo.As denúncias contra o padre vinham acontecendo há mais de cinco anos, mas em diversas ocasiões, d. Vilson fez a defesa pública dele.

Padre Pedro só foi afastado em janeiro deste ano, depois que a denúncia chegou ao Ministério Público. Em fevereiro, na cruzada do papa Francisco contra o acobertamento de abusos praticados pelo clero, o Vaticano enviou a Limeira o bispo dom João Inácio Müller para colher depoimentos e apurar as denúncias.

O resultado da investigação foi enviado ao Vaticano e pode ter acelerado o pedido de renúncia do bispo de Limeira. O processo corre sob sigilo pontifício. Durante a Assembleia Geral da CNBB, no início deste mês, em Aparecida, o Núncio Apostólico do Brasil, dom Giovanni teria conversado reservadamente com dom Vilson sobre a crise na diocese de Limeira.

O advogado do bispo no inquérito de Limeira, Virgílio Botelho Marques Ribeiro, disse que, até o momento, ele é apenas investigado, não havendo qualquer elemento que comprove a prática de crime. "A situação patrimonial dele é transparente, pois está tudo declarado no imposto de renda. Tudo ainda está no campo da apuração e é prematuro falar alguma coisa." O advogado do padre, Paulo Sarmento, disse que os fatos ainda são apurados, não havendo sequer denúncia. "O padre afirma que é inocente e esperamos comprovar isso no momento oportuno", disse.

Substituto

O arcebispo de Aparecida, d. Orlando Brantes, assumiu nesta sexta-feira a diocese de Limeira como administrador apostólico, em substituição a d. Vilson, até a nomeação de um novo bispo pelo papa. Em entrevista, ele disse que ficará nessa missão por tempo indeterminado, "administrando a diocese e dando continuidade à vida pastoral, buscando soluções na organização da Igreja". Dom Orlando destacou a importância "da unidade para a caminhada evangelizadora" da Igreja de Limeira.

Ele explicou que, como bispo emérito, devido à renúncia, d. Vilson não perde a ordem e pode celebrar missas, bem como aplicar o sacramento da crisma, caso seja convidado por alguma diocese. Segundo ele, o bispo anunciou que irá morar, temporariamente, em sua cidade natal, Guaíra (PR), até definir sua nova residência. A nomeação do bispo de Limeira não tem prazo estabelecido. D. Vilson foi procurado pela reportagem, mas sua assessoria informou que ele já havia se manifestado publicamente através de carta e não voltaria a falar sobre os motivos de sua renúncia.

Estadão
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