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Barroso intima Segovia a explicar declarações à Reuters sobre inquérito que investiga Temer

10 fev 2018 - 16h37
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O ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso intimou neste sábado o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, a prestar esclarecimentos sobre declarações, em entrevista à Reuters, de que o chamado inquérito dos Portos, que investiga o presidente Michel Temer, não encontrou indícios de corrupção e tende a ser arquivado.

"Tendo em vista que tal conduta, se confirmada, é manifestamente imprópria e pode, em tese, caracterizar infração administrativa e até mesmo penal, determino a intimação do Senhor Diretor da Polícia Federal, Delegado Fernando Segovia, para que confirme as declarações que foram publicadas, preste os esclarecimentos que lhe pareçam próprios e se abstenha de novas manifestações a respeito", escreveu Barroso, que é relator do caso no STF, na intimação.

Barroso ainda determina que se dê ciência ao Ministério Público Federal, órgão de controle externo da Polícia Federal, para que "tome as providências que entender cabíveis".

    Barroso cita no texto, com base na entrevista concedida à Reuters e repercutida por outros meios de comunicação, que Segovia falou sobre inquérito "ainda não concluído", tendo ainda ameaçado com sanções o delegado responsável "que deve ter autonomia para desenvolver o seu trabalho com isenção e livre de pressões".

Diz ainda o ministro que o inquérito "tem diversas diligências pendentes, razão pela qual não devem ser objeto de comentários públicos", e que Segovia não recebeu parecer da Procuradoria-Geral da República, responsável pela instauração do inquérito, ou qualquer pronunciamento do próprio Barroso.

    Em entrevista exclusiva à Reuters, na sexta-feira, Segovia afirmou que o decreto investigado "em tese não ajudou a empresa" e que "se houve corrupção ou ato de corrupção não se tem notícia do benefício, o benefício não existiu" e que "até agora não apareceu absolutamente nada que desse base de ter uma corrupção".

    "Então assim os indícios são muito frágeis, na realidade, de que haja ou que houve algum tipo de influência realmente porque em tese o decreto não foi feito para beneficiar aquela empresa", disse Segovia à Reuters.

    Questionado se a tendência então poderia ser por um eventual pedido de arquivamento, Segovia afirmou que "no final a gente pode até concluir que não houve crime", porque as testemunhas teriam "reiteradamente confirmado que não houve nenhum tipo de corrupção, não há indícios de realmente de qualquer tipo de recurso ou dinheiro envolvidos" e que "há muitas conversas e poucas afirmações que levem realmente de que haja um crime".

"O que a gente vê é que o próprio decreto em tese não ajudou a empresa. Em tese se houve corrupção ou ato de corrupção não se tem notícia do benefício. O benefício não existiu. Não se fala e não se tem notícia ainda de dinheiro de corrupção, qual foi a ordem monetária, se é que houve, até agora não apareceu absolutamente nada que desse base de ter uma corrupção", disse Segovia.

Em mensagem encaminhada a servidores neste sábado, Segovia afirmou que "em momento algum" disse à imprensa que o inquérito será arquivado. Disse que, inclusive, o inquérito é conduzido pelo delegado Cleyber Malta Lopes e sua equipe com "toda autonomia e isenção, sem interferência da Direção Geral".

"Acompanho e acompanharei com o cuidado e a atenção exigida todos aqueles casos que possam ter grande repercussão social, é meu dever, é o que caracteriza o cargo de direção máxima desta instituição, é o que farei", disse ele, na mensagem.

O diretor-geral disse que foi com esse espírito que reforçou a equipe à disposição da operação Lava Jato, dobrou o número de policiais à disposição do grupo de inquéritos especiais, entre outras providências.

Na conclusão, o diretor-geral disse que reafirma a sua confiança nas equipes que cumprem com independência as mais diversas missões.

"É meu compromisso na gestão da PF resguardar os princípios republicanos. Asseguro a todos os colegas e à sociedade que estou vigilante com a qualidade das investigações que a Polícia Federal realiza, sempre em respeito ao legado de atuações imparciais que caracterizam a PF ao longo de sua história", finalizou.

A Procuradoria Geral da República informou, por intermédio da assessoria de imprensa, que se intimada a manifestar-se, falará nos autos.

ENTIDADES

A entrevista de Segovia provocou forte reação dos delegados e agentes da Polícia Federal. Em nota, a Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal afirmou que, independentemente da posição que ocupe na instituição, nenhum dirigente deve se manifestar sobre investigações em andamento.

    "Seja para fazer observações sobre os elementos colhidos ou para antever conclusões, que são de atribuição exclusiva da autoridade policial que preside o inquérito policial, quando do relatório final, conforme estabelece o artigo 10, § 1º do Código de Processo Penal, sob pena de violar prerrogativas dos delegados e fragilizar os resultados, quaisquer que sejam eles, dos trabalhos investigativos", disse.

    A associação defendeu a autonomia do delegado de fazer perguntas, "independentemente de quem seja ele ou do cargo que ocupe". "É natural que interrogados se melindrem com alguns questionamentos da autoridade policial, porém cogitar qualquer tipo de punição seria forma de intimidação e mitigação da autonomia investigativa prevista no ordenamento jurídico", afirmou.

    Para a entidade, uma representação que verse sobre o desconforto de Temer em relação a perguntas deve ser "liminarmente arquivada, por falta de justa causa, uma vez que no inquérito policial não vigem relações hierárquicas de qualquer natureza". O presidente reclamou do teor das perguntas, chamando-as de impertinentes.

    "A ADPF espera que o diretor-geral garanta, nas palavras e nos atos, os instrumentos necessários para que os delegados exerçam suas atribuições de forma técnica e republicana, sem temor por reações do poder político e econômico", acrescentou a nota.

     A Federação Nacional dos Policiais Federais, que representa os agentes da PF, também criticou em nota a fala do diretor geral, assim como os peritos criminais.

    "Ao adentrar às questões internas de uma investigação criminal, conduzida por uma equipe multidisciplinar de investigação, composta por agentes federais, delegados, escrivães, papiloscopistas e peritos, o dirigente tanto extrapolou em suas funções, que são precipuamente administrativas, quanto avançou no sentido de garantir o entendimento futuro do Ministério Público Federal, a quem cabe legalmente o pedido de arquivamento de investigações criminais, e do Poder Judiciário, a quem cabe a decisão final pelo arquivamento ou não", diz a nota da Fenapef assinada por seu presidente, Luis Antônio Boudens.

    Na entrevista, Segovia afirmou que se houver um pedido formal da Presidência da República, a corporação pode abrir uma investigação interna para apurar a conduta do delegado Cleyber Malta Lopes nos questionamentos apresentados a Temer.

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